Tem dúvida?

Qualquer semelhança é mera coincidência.

Não sei se feliz ou infelizmente sou muito observadora para não dizer “chatinha”, sempre percebendo o comportamento e reações dos indivíduos diante dos acontecimentos que a vida lhes apresenta.

A maioria me ensina muito, das reações que percebo vou tirando lições, algumas me surpreendem verdadeiramente e as adoto de imediato por considerá-las válidas, as outras ignoro.

O julgamento de valor é muito pessoal, portanto concordo com quem discordar.

Outro dia conversando com uma pessoa amiga ouvi a seguinte frase:

“ Se eu morrer, você cuida dos meus filhos?”.

Olhei para seu rosto muito sério e comecei a rir.

Quase crio uma desavença danada, ela ficou enfurecida com a minha atitude, achou que eu estava zombando de um momento tão grave.

Afinal falar de morte já é difícil, ainda mais finalizando com um pedido de favor.

Foi difícil acalmar sua mal disfarçada decepção e fazer com que ouvisse meus argumentos.

É tão simples falar sobre a morte...

Encará-la é que não é fácil...

Usar o condicional neste caso não funciona.

SE eu morrer...

Como SE?

Você tem alguma dúvida que um dia vai morrer que vai chegar a hora em que terá de sair desta vida e deixar todos e tudo para trás?

No seu olhar um tanto estranho senti que havia entendido o motivo da minha risada, entendi também que nunca havia pensado seriamente nessa certeza indiscutível.

Claro que confirmei cuidar de seus filhos QUANDO ela morresse caso eu não fosse antes dela, bem entendido...

Resolvi então dar uma de boa Samaritana, e passei a lhe dar alguns conselhos, mesmo não tendo muita fé de que seriam certos, mas como ela parecia pior que eu em matéria de conselhos, e demonstrou querer ouvir, me arrisquei...

Comecei então a desfiar minhas idéias... Se certas ou erradas, não vem ao caso...

Particularmente penso que é uma verdadeira maldade deixar os problemas para os que ficam depois da partida definitiva de alguém.

Claro que este pensamento só é válido para morte “programada” pela idade ou doença, não para o tragicamente inesperado fim.

Já reparou como é difícil quando alguém falece e deixa alguma “coisa”, algum bem para ser dividido?

Ainda que sejam panelas velhas, cobertor furado, dinheiro, bens imóveis ou qualquer coisa considerada de valor venal ou sentimental pelos que ficaram?

No momento da divisão alguém sempre sai descontente...

Há casos até de morte entre os herdeiros, irmãos se engalfinham pelo que consideram injustiça, como se diz popularmente

“um querendo passar a perna no outro”, é o caos provocado simplesmente pela falta de previsão de quem não está mais perto para ver o tumulto que causou por sua irresponsabilidade.

Irresponsabilidade sim, porque provocar querelas num momento em que a dor da perda é mais sentida e estão todos fragilizados?

Isto quando existe mesmo dor... Em alguns casos são apenas lágrimas de alivio por se verem livres de um problema e ainda sair lucrando...

Felizmente não presenciei, mas soube de um episódio um tanto incomum. Não fazia nem vinte quatro horas que havia sepultado a mãe, o herdeiro e até mesmo quem não pertencia à família, entraram na casa e avidamente dispuseram a seu bel prazer o que lá se encontrava como se fossem os únicos a terem direito a posse.

O pior que não eram os únicos donos e herdeiros perante a lei...

Essa atitude me lembrou o caso do gato de rua sempre faminto que de repente se vê livre dentro de uma peixaria, voraz e deslumbrado avança em tudo que é possível alcançar.

Foi grande confusão, os demais herdeiros logicamente não gostaram, resultado, acabou com os laços de família que já não eram grande coisa em matéria de afeição e laço familiar, claro que depois desse episodio, desandou de vez. A desavença perdurou por anos.

Eu não soube o final da história, nem a moral dela, isto é, se existe alguma moral numa circunstância como essa!

Parece impossível, mas existem pessoas que simplesmente ao participarem dessa situação, perdem a noção do que estão vivendo e de valores morais, não consideram ninguém, filhos, tios, sobrinhos, netos, entre outros membros da família, laços de sangue e carinho deixados por quem partiu.

Recordações de histórias vividas em relação ao que restou são tratadas como lixo, sem nenhum valor sentimental pelo novo “senhor dos bens”.

Vale tudo na certeza de que o ausente não pode mais contestar seus desmandos.

Por isso acho que antes de deixar mágoas e cizânia ao partir, é primordial fazer testamento, ou alguma outra forma qualquer que garanta seu desejo de divisão. Distribuir em vida o mais importante também é uma boa solução, assim garante que ninguém torça para que você morra logo, e ainda tem a satisfação de ver quem você gosta usufruir o que foi dado.

Infelizmente tem pessoas que morrem se agarrando aos bens materiais até o último segundo e até mesmo depois.

Bem certo é o ditado espanhol:

“No creo em las brujas, pero que las hay, las hay...”

Não acredito em bruxas, mas que existem, existem.

Não creio, também não duvido, que alguns não se desprendem deles nem na eternidade...

Mesmo se cercando de todos os cuidados possíveis, não se tem garantia que não haja contestação e promova desavenças.

Imagine então se não esclarecer seus desejos.

Muitos acreditam que se fizerem testamento morrerão mais depressa!

Santa ignorância!

Gente assim morre de medo de morrer. Dá vontade de matar!

Espero que ela se previna.

Depois de algum tempo conversando com a pessoa a qual me refiro, até eu mesmo me surpreendi com o que tinha dito.

Parei para pensar no que havia “aconselhado” e meio assustada simplesmente saí bastante apressada e fui fazer meu testamento, especificando bem para quem deixaria meu verdadeiro tesouro!

Meus dois cachorros e o meu gato...

M.H.P.M.

Helena Terrível.