Flor de lis

Como era boa minha época de gandaia. Logo que fui pra Faculdade de segunda à segunda tinha algo pra fazer. Não pensem que com isso eu me descuidei dos estudos, pois sempre fui muito dedicada nesse quesito. Mas tenho que admitir, também, que sempre fui baladeira. Topava quase todo tipo de programa, desde boates, barzinhos, reuniões pra jogar “tranca.

Às vezes a galera se reunia, um olhava pra cara do outro, outro olhava pra cara de um e alguém soltava: vamos pra Campinas? Opa . Demorou! Vamos pra Monte Verde? Já era!

Essa ida à Campinas havia sido programada. Meus amigos de curso prometeram nos levar (eu e uma colega) pra uma boate que segundo eles era MUITO BOA. Pelo nome eu já estava imaginando que seria uma pocilga, mas vai saber né. Se eles estão falando, o trem deve ser bom mesmo.

E lá vamos nós ... nos botamos nos panos e nas tamancas, caprichamos no “make up”e dá-lhe perfume importado pra arrematar. Boate boa, tem que caprichar né?! (Vai vendo...). Saímos de Bragança e marcamos o encontro com os amigos no apartamento de um deles. Toma umas daqui, toma umas de lá, conversa vai, conversa vem e decidimos partir em direção a boate. Fui seguindo com meu carro, pois não fazia idéia de onde ficava “point”.

Quebra daqui, quebra de lá ... de repente eu avisto um viaduto (precisa ver que lugar estranho) e um casa embaixo dele. Olhei pra colega e comentei: Não é possível que seja aqui! Boate boa embaixo de viaduto? Vixi ... lembrei do Carioba, uma casa noturna aqui em Americana que quando homem ta precisando dar uma desafogada na “gueba” ele se dirige até lá porque a mulherada trepa em cima que nem em pé de fruta.

Descemos do carro. Eu com aquela cara de bosta, como quem diz: Aqui que vocês nos trouxeram? E ela toda paquita morrendo de medo do lugar. Um amigo dos meninos começou a se estressar, a nos chamar de fresca. Opa, opa, opa! Fresca não!! Vamos entrar aí nessa bodega que eu quero ver.

Quando passamos pela porta eu me deparo com inúmeros sofás na cor vermelha de material tipo vinil ...sabe aquela coisa vermelha brilhante sugestiva de casa de quenga? Pois é ... já imaginei o povo de corpo suado com a cara colada no sofá de plástico. Que cena deplorável. E agora ? Era mulher se requebrando ao som do pagodão, com aquelas roupas de gosto questionável e cheiro de desinfetante de motel. Tentamos nos ambientar e decidimos ir ao banheiro pra ver o esquema antes de beber alguma coisa.

No caminho do banheiro uns troncudões nos deram uma enlaçada e um deles solta: Senta aqui morena! Pêra aí, como assim senta aqui ?! Que mané senta aqui ! E o corpulento prossegue: quer sentar não vagabunda?! Ah não ...fala sério! Vagabunda agora é quem não senta? Saí cega em direção dos meninos, pois ali nós não ficaríamos mais. No meio do caminho eu fui surpreendida por uma briga de garrafas. É isso aí, eu fiquei no meio dos dueladores, com garrafas quebradas na mão e só pensando: pronto, fodeu de novo! Vão sacar uma arma e vou morrer nessa pocilga. Manchete do jornal: “Estudante de Direito morta por garrafa de cerveja na “boate” Flor de Lis”.

Um dos meus amigos me viu perdida lá no meio e correu ao meu encontro, ele me puxou numa velocidade que minha alma deve ter ficado pra trás, branca de susto. Ahhh ...detalhe, enquanto rolava esse bafão , no fundo um som de “Parabéns pra você...” com um trouxa carregando um bolo com glacê duvidoso. Aquilo tudo parecia cena de filme mexicano com duas personagens totalmente desconexas do contexto.

Fui embora pensando na frase ouvida: “quer sentar não vagabunda?!” Isso é bom ...bom pra aprender que não devemos ir pela ótica de um homem na hora de ir pra uma boate, pois é claro que pra eles aquilo devia ser o paraíso. Na próxima encarnação se eu vier como homem, prometo ser mais gentil, mas se vacilar na área já era!