Hoje é o meu dia...
Eu nem me lembrava, mas hoje é o meu dia.
 
Tão logo abri meu –mail foram chegando os cumprimentos. Coisas da Nena, que espalhou por aí.
 
Não, não. Hoje não é meu aniversário. Nem ganhei na Sena e fiquei milionária de repente. Nenhuma grande Editora veio convidar-me para fazer parte do seu elenco. Nada disso: Hoje é o dia do Panificador. O dia do Padeiro. Do fazedor de pães.
 
Meu avô, o Capitão Leibnitz era um artista e um boêmio. O meu pai era padeiro. Eu, uma herdeira.
 
Não me lembro da vida longe de uma padaria. As lembranças de minha infância estão arraigadas naquela casa de esquina onde vivemos, em Arantina. Uma casa grande, que dividíamos com uma Agência Postal e uma Padaria. Pai padeiro, mãe postalista e filha poeta. Um tríplice P. Parece marca de gado. Mas por que não? Meu pai também, com os dividendos do pão se tornou um pecuarista. E a filha, que nasceu poeta também foi ser Professora. Mas assim não mais seria um Tríplice P e sim um Quíntuplo P. O que só me desvia do assunto, mas não faz nenhuma diferença.

As lembranças da juventude continuam presas em uma Padaria. Também em uma casa de quase esquina. Em Lavras meu pai comprou a Padaria Rocha. Não mudou o nome, sentiu-o como sinal de segurança: uma rocha.  Um sobrado. Em baixo ele trabalhava e ganhava a vida. Em cima nós moramos.

Hoje, meu pai está morto e não vivemos mais naquela casa rica de risos e sonhos de dez filhos encarreirados. A herança foi para os dez, mas hoje se restringe a quatro, fruto de trocas e aquisições. No dinheiro, mando eu, Marilda e Zé trabalham e a Márcia espera pelos lucros que nunca chegam. Mas ela está lá: a nossa Fábrica de Pães. Um marco. Para a família. Para a cidade.

Agradeço aos cumprimentos. Eu mereço. Fabrico alimento para o corpo, o mais sagrado dos alimentos. E sinto orgulho por isso. Sempre gostei das profissões que cuidam de alimentar, seja o corpo, ou seja, a alma. Fabrico o pão e fabrico a palavra. Sou Padeira, Educadora e Escritora.
 
Mas por que hoje é dia do Panificador? Qual a razão da escolha desta data? Não sei se é fato ou boato. Não sei se é lenda, mas é mais provável. Os personagens são reais. A história, pode ser que sim, pode ser que não.

E então vou contar-lhe essa história interessante. Ela se casou aos 17 anos com o Rei Dinis de Portugal. Recebeu dotes em profusão, castelos e vilas. Uma dessas vilas eu conheci: Óbidos em Portugal. O rei safadinho, também muito jovem, gostava de namorar. E como era rei ninguém se recusava. Isabel sabia e nem se importava. Tinha mais coisas para fazer. Conta-se até que as preferidas de D. Diniz eram as da região de Odivelas. Que só recebeu esse nome depois que correu o boato de que D.Isabel havia dito ao seu travesso consorte – Ide Vê-las Senhor, dando a sua benção. E a benção da Rainha acabou se transformando em Odivelas. Bom, mas isso não vem ao caso. O caso é que em um tempo de muita fome a Rainha Isabel vendeu o que podia vender para comprar trigo e não deixar o povo passar fome. Dinis ficou bravo e passou a vigiá-la, a seguir seus passos. Um dia vendo-a sair carregando alguma coisa em seu avental ele a interpelou perguntando: - O que carregas aí? Ela respondeu: rosas. Pois então o rei malvado puxou-lhe o avental onde ela carregava alguns pães e oh, surpresa: Caíram rosas de seu regaço e se espalharam pelo chão.

Verdade? Mentira? Sei lá. Sei que é uma bonita história, também atribuída à outra Isabel, a sua tia avó, rainha da Hungria. As duas, rainhas em vida se tornaram santas na morte. E o dia em que se comemora o dia da Santa Rainha de Portugal é o dia 8 d julho. Por isso também essa data foi escolhida para ser o Dia do Panificador. Ou do Padeiro. O meu dia, portanto.