Sociedade Degenerativa

A educação que me deram não foi a que realmente queria.

A sociedade impele que o cidadão seja o melhor. Caso assim não seja, que seja ao menos bom. Caso o sujeito não dê mostras de que pode ser algum dia algo na vida, todos o olharão com ar de desprezo, inferiorizando-o, deixando-o logo de lado, num canto qualquer na esquina suja da vida.

Humilhado, com a alto-estima em baixa, sem dinheiro e faminto, o cidadão se transformará conseqüentemente numa ameaça real para a sociedade, devendo ser imediatamente submetido a processos e, por conseguinte, encaminhado a alguma instituição de reabilitação (cadeias, penitenciárias, sanatórios, etc). Ou seja, a sociedade gera o “monstro” em seu bojo e logo em seguida o abandona nas sarjetas da vida, se não condizente com o que esperava que fosse. Quando não o caso de aborto, abatido por policiais em favelas, viaturas ou carceragens.

É assim, sempre foi assim e sempre será assim. É a lei do mais forte, do mais apto. e os fracos que se fodam.

Se não for forte tem de ao menos saber fingir ser forte. Ao menos o dom representativo o sujeito tem de ter. Caso contrário estará na mesmo na lama, como a maioria num mundo de mais de quatro bilhões de habitantes, onde a minoria como o pão e a maioria as migalhas, num constante ciclo de desigualdade social.

Os pais impulsionam os filhos desde bem cedo a serem algo na vida, mesmo que à base do puxasaquismo, pois, como dizem, “quem não puxa saco, puxa carroça”. Preparam a criança nos moldes de um cidadão exemplar, pronto a dar o que tem de melhor ao “monstro sistêmico arretado”. Espreme-se o cidadão comum enquanto houver caldo, após é deixado ao léu, nas filas do INSS.

Tem de ser o que há de melhor, ou seja, a melhor peça do baralho, o melhor instrumento de trabalho, o mais capaz, o motor mais potente, a chave multiuso, etc, etc, etc. “Caso contrário, meus filhos, será como eu e mamãe sempre cansamos de dizer, serão como o moço que corta cana na roça ou como o Zé Ninguém que foi preso por furtar banana na feira! Se esforcem, se acoplem, se amoldem!”.

Como se pode verificar em qualquer educação padrão de classe média, as crianças são educadas para não terem a opção de escolha, mas sim para serem a peça que falta no jogo, como mais um componente que deve ser adequado na máquina social, um a mais na roda da sociedade.

Muitos seguem o que lhes impõem por estarem por demais condicionados aos padrões de educação que tiveram desde o nascimento. Outros se desgarram como ovelhas desenganadas e conduzem os dias de suas vidas de forma totalmente diferente. Esses são os libertinos, anarquistas, hippies, livres-pensadores, etc, que vagam sem comando pelo mundo afora. A esses não está garantido o reino dos céus. A esses o mundo é mais embaixo, no undergraund, no submundo, onde tudo é mais escuro e sombrio, onde a lei do mais forte não prevalece, onde os policiais estão sempre de olho, mesmo sabendo que ali não há risco, mas que têm de cumprirem suas funções por serem policiais exemplares de uma sociedade exemplar, e vice e versa.

Talvez chegue o dia em que cada criança em idade apropriada tenha o livre-arbítrio de escolher a rumo que deve dar à sua vida, a educação que quer ter, a faculdade que quer cursar, o conhecimento que quer adquirir, de acordo com sua aptidão, sua estrutura, sua ideologia, sua mentalidade e sua capacidade.

Talvez seja tudo isto uma vaga ilusão, uma utopia, mas não custa sonhar...

Cristiano Covas, 29.10.05

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 09/07/2010
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