Modo de Vida.

Era uma vez “um eu todo retorcido”. Um eu extemporâneo. Um eu que estava certo em seu caminho, mas que seu caminho corria na direção contrária. Um sátiro, um sorridente dos dias de hoje.

Era uma vez o era uma vez. E que talvez, aguardo com avidez, não deixe seqüelas ao vindouro. Cada qual possui sua própria razão de ser, seu modus vivendi, seu proceder, sua compleição, que oscila entre o dito certo, o dito errado, o dito cujo e o assim assado.

É interessante a luta dos homens no decorrer da história. A pesar de a história como ciência, como a própria ciência em si, possuir seus descaminhos, seus encontros e desencontros, desenrolando-se, por fim, de acordo com os ditames dos poderosos de suas épocas, a pesar desses pesares, creditamos nela pelo simples fato de nos ter sido ensinada no jardim da infância.

Eis que, como vinha dizendo, é óbvio que tanto homens como mulheres, crianças, sejam índios, negros, brancos, amarelos, verdes ou azuis, lutaram e lutam bravamente por sua sobrevivência no dia-a-dia, ao passo que cada dia em especial era uma guerra pela sobrevivência. Quando a batalha perdia sua intensidade, os homens tendiam a buscar alguma satisfação para suas vidas, visto que um homem em campo de batalha não dispõe de pensamentos sobre momentos de lazer. Perderia a cabeça rapidamente. Porém, quando a batalha cessa, abrem-se espaços para outros afazeres, e assim vai, quanto mais tempo tiver o homem, mais se predisporá para a prática do que lhe convém, cada qual a seu modo.

O problema surgiu quando o homem se viu com “todo o tempo do mundo” a seu dispor, fato que Renato Russo aproveitou. A tendência é que quando não haverá problemas (ledo engano), não haverá o que resolver, e quando não há o que resolver, o jeito é relaxar, e quando se relaxa se está realmente fodido!

Foi a partir daí que o homem se viu banhado em “ócio improdutivo”, algo avassalador em sua existência. Seus músculos se afrouxaram, passou a comer sopa, viver à sombra e água fresca, perdeu os dentes e contraiu febre tifóide, adquirindo os hábitos de um “vagabundo original”. Aliás, Gorki é uma boa pedida.

O homem deixou de ser homem, se despersonalizou, virou um projeto de homem, algo inacabado e frágil, suscetível a todo tipo de intempérie, um “fracotinho de mão cheia”.

As máquinas os auxiliaram a isso. Primeiramente, eles quiseram isso. Construíram seu universo: automóveis, aeronaves, motocicletas, elevadores, escadas-rolantes e tele-transportes fizeram com que não exercitassem mais seus físicos para a obtenção da “fruta” que está no alto. No muito, quando crianças, praticam algum tipo de esforço, fato que está ficando raro. Vídeos-games e computadores roubam o tempo, e o espaço em cidades grandes está diminuindo. Raramente se vê em grandes centros “crianças selvagens” como quando há alguns anos. Eu próprio tive uma “infância selvagem”, e carrego os anticorpos daqueles dias vividos, alegres e sofridos, até hoje comigo.

Como é bom saltar muros, jogar futebol em campinhos de terra e na quadra da delegacia de polícia, subir em pés de jabuticaba, manga, laranja, ameixa, caju, tamarindo, joão-bolão, goiaba, seriguela, jaca, jambo, o pé-de-feijão-do-João, quebrar pedras, muros, arrancar placas e árvores imitando o He-Man, brincar de policia e bandido, adentrar em construções, fugir para o morro da “cabeça do boi”, escondido da mãe, furtando água dos tratoristas que por ali trabalhavam, uma sede danada nos dava, e nossa água sempre acabava, vindo embora à noitinha, com a barriga roncando de fome e com medo de a mãe desconfiar de algo, os pés sujos, talvez, mas não, a mãe de algum modo já sabia bem antes..., a mãe era esperta.

Vejo muitas crianças atualmente “pré-dispostas” a fazer algo ou alguma coisa de suas vidas, porém sem direção. Falta interesse. Falta originalidade.

O mundo, quando “original”, era fantasioso, lembrando-se da vida em alguns países europeus, quando por lá reinou o “império da originalidade”, em algum momento entre os anos 1000 e 1300 d. C. Uma época em que não existia um padrão a se seguir, o que levava todos a agirem com originalidade, Tudo era fantástico, místico, maravilhoso, adocicado e com um aroma peculiar. Havia duendes, gnomos, fadas, ogros e animais mágicos. O clima era impregnado de incenso e as plantas possuíam cores intensas, quase fluorescentes. Creio que se Aldous Huxley e Carlos Castañeda tivessem vivido naquela época não veriam necessidade de buscar alucinógenos para enxergar “coisas fantásticas”.

Ser original não é nada mal. Evite o jogo dos ratos. Faça você mesmo. Não se sinta culpado por errar. Não se desumanize pelo amor de Deus!

Cristiano Covas, num dia qualquer, 29.11.07,

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 19/07/2010
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