O ÚLTIMO POSTE

O ÚLTIMO POSTE

Maria Teoro Ângelo

As ruas da minha infância eram escuras e tristes. Ainda hoje me deprime a lembrança daquelas lâmpadas fracas dependuradas nos postes de cano preto debaixo dos quais a gente brincava naquelas noites que já vão tão longe.

De vez em quando íamos visitar parentes e amigos. Não havia televisão e as pessoas se visitavam muito. Saíamos a pé ao escurecer. As casas eram próximas, a cidade era pequena e só bastava andar um pouco e já se avistava o último poste.

O que me amedrontava era a escuridão além dessa derradeira lâmpada. Eu, agarrada às mãos de meus pais, me sentia segura no lado iluminado de cá.

Quando visitávamos vovó, ela contava a história do Bô Bô Bô, um menino horrendo, meio bicho que teria aparecido para ela e suas primas quando ainda eram crianças. Eu me arrepiava toda e pedia para fechar as janelas. Voltava para casa com medo e imaginava feliz que eu não morava nas bandas do lado escuro de lá.

Uma noite fomos de carro visitar uma tia que morava num sítio próximo. Eu, encolhidinha e protegida dentro do veículo, pude explorar o que havia além da cidade. Nos campos por onde passávamos as touceiras de capim assumiam formas estranhas. As silhuetas das árvores mal iluminadas pela luz da lua pareciam abrir os braços prontos para me agarrar.

O tempo passou. Perdi o medo da escuridão. Ela já não me incomoda mais. A cidade cresceu e o último poste ficou cada vez mais distante. Não me incomoda mais o que pode haver além dele. O que me aflige e me amedronta é a escuridão que, às vezes, se instala dentro de mim. Mas tal qual a menininha dentro do carro, eu me sinto protegida pela fé e pela vontade de vencer.

Então, faço acender uma centelha de esperança, procuro a última lâmpada que ainda me resta e a luz volta a brilhar dentro do meu coração.