UMA HISTÓRIA DE SANGUE

Lêda Torre

Quando era criança, era comum a maioria das famílias simples, dormirem em rede seus filhos, normalmente quem dormia em cama, eram somente os adultos. Pois bem, como dormia em rede, certo dia, um dente meu foi arrancado lá no Hospital onde minha mãe trabalhava na época. Eu devia ter mais ou menos uns dez anos de idade. Só que ao dormir, meu dente disparou a sangrar de forma hemorrágica, ao ponto de sujar todo meu chambre (um camisolão de chitinha) também o meu lençol, e uns vestidos velhinhos da minha mãe, que eu gostava de colocar debaixo da cabeça, pois faziam parte do meu dormir; e ao amanhecer, até no chão ladrilhado, debaixo de minha rede havia sangue, muito sangue...e fiquei apavorada com tudo aquilo, e para amenizar, era normal fazer-se bochechos com água e sal, pra estancar o sangue, e nada...de estancar, sangrava muito até dizer chega!! e como na minha pequena cidade naquele tempo, eram escassos os meios de tratamento de saúde, o único jeito era esperar na infinita misericórdia de Deus. Creio até, que sou produto dessa tão grande benesse do nosso Pai eterno.

A recomendação de minha mãe, era repouso e mais repouso, eu ficava proibida de brincar, de correr, de pular, ou de fazer qualquer esforço que exigisse muito de mim. Agora, imaginem uma criança, bem quietinha. E por essa razão, eu cresci com pavor de ir ao dentista, esse profissional era um bicho-papão pra mim. Imaginava que o dentista era o maior provocador de minha história de sangue.

Passaram-se os anos, e a menina, eu, no caso, chegara aos treze a menarca, e pasmem! Dez dias de sangramento....que horror, como vivia a minha cabecinha, com esses impasses na vida! Foi passando anos, após anos, e toda vez que vinham as regras mensais, eram muitos dias, e quando ia ao dentista, aquela velha hemorragia, e embora aparentasse ser uma jovem saudável, ao longo dos anos, esse trecho era incógnito para mim e para a família, e sobretudo preocupante, pois até ali, a medicina não sabia ainda a causa, desse problema sanguíneo.

Casei com vinte e três anos. Fiquei logo grávida da primeira filha, e aos três meses e meio de gestação, tive espontaneamente um aborto, lá na cidade de Recife onde morava. Voltei após uns dias de resguardo, para Colinas, e após três meses de recuperada, viajei para Imperatriz – Ma, onde meu esposo trabalhava e ali iríamos morar, por ser o trabalho dele naquele lugar.

Com um mês depois que cheguei a Imperatriz, em 1981, engravidei de novo de minha filha Samantha, hoje com vinte e oito anos, e aos sete meses de gestante, voltei para Colinas para ficar até ganhar bebê, pois minha mãe então enfermeira, casa de mãe acima de tudo e o carinho idem, tudo correu bem no pré-natal, parto normal, mas a história de sangue se repetiu; e foi aí que quase morri após o parto, mas depois de tomar algumas transfusões, deu certo, recuperei graças a Deus, e apesar de buscar constantemente pela resposta desse problema, tentei viver minha vida normalmente, mas ainda sem respostas para minhas indagações...

Porém, o tempo continuava a transcorrer, só que, dois anos depois engravidei de meu terceiro filho, o Harryson Pablo, que igualmente ao que fiz como no tempo da filha Samantha Veruska, vim a Colinas, pelos mesmos motivos, tive meu filho, em 1984, porém, o quadro fora pior, quase, quase...mas graças aos cuidados do tão bondoso Pai, estou registrando minha história.

História que se repetiu mais uma vez em 1987, e dessa vez, os médicos de minha cidade despacharam-me para minha mãe, que depois de ter derramado todo o meu sangue, o meu estado, desmaiando de instantes em instantes, sem cor de gente, pressão zero, gelada como morta, fui encaminhada numa ambulância à capital São Luis. Foi depois de ter passado três dias em coma, no Hospital Materno Infantil, que recuperada, tive alta, mas com sete dias depois e com vinte e dois dias respectivamente, voltei ainda essas duas vezes para o mesmo com a dita hemorragia. Mas, mais uma vez estou aqui a agradecer a Deus, pelo seu cuidado para comigo, livrando-me da morte de novo.

Problema esse que foi contornado, quando minha mãe, resolveu que eu só voltaria pra casa, quando fosse laqueada, e assim foi, pois depois desse milagre não era bom arriscar mais nada nesse sentido. Entretanto, isso aconteceu quando tinha meus vinte e nove anos, e mesmo passando os anos, continuei a buscar a causa dessa anomalia, conseguindo enfim, descobrir nuns exames de rotina, através da pesquisa de uma grande hematologista do Maranhão, em São Luis mesmo, no ano de 1997, a Dra. Ada Viana (in memorian), que essa deficiência, era hereditária, por parte de meu pai, em algum fator sanguíneo. Continuei a freqüentar hematologistas, que sem suporte em São Luis, não decifraram com precisão o tal fator específico, só se fosse fora de São Luis.

Tive que redobrar os cuidados com cortes, pancadas, e só tomar alguns medicamentos só com receitas médicas, porque muita coisa afetaria tal problema, ainda mais. Passei a viver uma rotina meio restrita em muitas coisas, mas sempre na esperança de um dia finalmente, alguém em algum lugar, descobrir o cerne disso.

Enfim, graças a Deus, esse ano de 2010, numa viagem encaminhada pela minha atual hamatologista, fui a São Paulo, para uma especialista só em fatores sanguíneos e graças a Deus após exames nunca feitos antes, foi descoberta a deficiência no fator cinco, o que provoca sérios problemas, e devo continuar vigilante e sempre refazer todos os exames de controle, e tomar as precauções recomendáveis, por esses especialistas. A vida tem dessas coisas, e essa é a minha história de sangue, que apesar de todos esses momentos como no ano passado fiz uma cirurgia delicada, quase fui a óbito, e desse triste episódio, foi que me encaminharam a São Paulo, e graças a Deus,mais uma vez estou contando minhas histórias., de vitórias sobretudo.

______São Luis-Ma, 2009________________________

Lêda Torre
Enviado por Lêda Torre em 26/07/2010
Reeditado em 03/06/2015
Código do texto: T2401353
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