EU É QUE SOU POBRE

No final da década de setenta, após residir por doze anos em Belo Horizonte, me mudei para Itaúna-MG onde fiquei por uns dois anos. Foi uma época muito produtiva. Conclui minha faculdade, defini minha profissão e segui na vida modesta mas com realizações das quais me orgulho, mesmo sendo coisas simples mas foram de grande importância na minha vida. Ali conheci muita gente que faz parte do meu convívio até hoje, inclusive a minha esposa que me deu duas filhas e uma destas já nos deu uma netinha.

Itaúna, como todas as cidades que conheço, tem muita gente importante e muitas que fazem parte do folclore. Entre estas conheci um senhor que vou denominar de “J” para não identificá-lo, mesmo porque já faleceu e ainda novo. A meninada acrescentou o apelido de “Pedrada” por questões óbvias. Ele era negro, alto, um pouco magro e parecendo ser portador de uma deficiência mental. Como leigo diria que possuía o Q. I. baixo. Tinha uma voz bastante grave e costumava falar muito lentamente.

A meninada adorava gritar: - Oi! Pedrada! – Era gritar e correr, pois as pedras caiam com abundância e de todos os tamanhos. E a criançada saia correndo, gritando e morrendo de rir.

Problema com os maiores só fiquei sabendo de um. Ele estava na Praça da Matriz, na porta de uma loja quando a proprietária saiu para suspender o toldo que protegia contra o sol. Ela com aquele cano comprido nas mãos, efetuou a operação sob os olhares do Senhor Pedrada. Quando ela retornava para o interior da loja ouviu a voz pausada dele: “Sabe que a senhora tá danada de boa prá. . . “ Todo mundo já imaginou o resto do “elogio” dele né?

A senhora jogou o cano na porta da loja pulou nos colarinhos dele, sacudiu dizendo: “To boa prá muito mais do que isso. Principalmente prá quebrar a cara de um sem vergonha...” E balançou ele prá cá e soltou. Ele saiu apressado dizendo. “Cruis credo! Trem brabo...!!!

De outra vez, na mesma praça eu aguardava um amigo no início da tarde, creio que por volta de 14:30 horas e o Pedrada se encontrava agachado na sombra de uma árvore observando o movimento. Um cidadão chegou de carro, estacionou, desceu e saiu correndo. Outro próximo o chamou pelo nome e ele ainda correndo disse: “Agora não posso, estou atrasado, ainda não tive tempo nem para almoçar, tem um moço me esperando... Amanhã eu procuro você”. Sumiu na correria por trás da igreja. O Pedrada que observava e ouvia disse baixinho para si mesmo: “É! Sei não! Num intendo esse povo não. Eu é que sô pobre. Esse aí ó, rico, ropa bunita, carro novo... E correno qui nem doido. Uma hora dessa e ele nem

armuçô. Eu hem? E eu é que sô pobre! Intendo não! Até agora eu

já bibi umas seis pinga, já armucei bastante, já cunversei cum muitos cunhicido, agora memo vou bebê mais umas, vô jantá... Num curri

nem u m tiquim... E eu é que sô pobre... Intendo não...”

Nunca me esqueci das suas palavras. Lembro-me de uma frase que li num livro: “TEM GENTE POBRE, MAS TÃO POBRE QUE SÓ TE DINHEIRO”!

Divinópolis, 25-08-2010.

JFerreira.

JFerreirinha
Enviado por JFerreirinha em 25/08/2010
Reeditado em 12/12/2011
Código do texto: T2458984
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