Uma corrida de taxi

Uma corrida de taxi Jocenir Barbat Mutti

Out/09

Estávamos num taxi, que legalmente trafegava na linha dos ônibus. O tagarela paraguaio de avançada idade que nos conduzia, repentinamente nos sacudiu com uma música gauchesca e se declarou tomador de chimarrão. Não, foi minha resposta a sua pergunta. Afirmei que eram poucos gaúchos pilchados que ouviam músicas regionais com uma cuia na mão.

O homem tinha uma voz de baixa intensidade, mas persistente, que me desconcentrava da tentativa que eu fazia de entender os motivos que levavam os jovens pichadores a fazer da Sto. Amaro aquilo que a janela do Siena me permitia visualizar. No dia anterior a televisão já tinha mostrado o estrago feito numa estátua do Nilton Santos no estádio do Engenhão e também a tentativa em vão da sua limpeza.

Quando eu recomeçava a ensaiar uma justificativa para aquela agressão, sua voz aumentava contando a história de seus filhos e netos. Pensei:

- Eu até curto esse tipo de prosa, mas ganharia mais minha atenção se ele se debruçasse sobre os porquês do seu país não esboçar uma reação de prosperidade.

Informei meu destino, quando adentrei ao taxi na saída da Pinacoteca, centro cultural na Estação da Luz, onde pude curtir os quadros e principalmente a Capela que o Henri Matisse, a contra gosto do clero, projetou em parceria com uma freira com quem ele viveu um amor platônico.

Como o taxímetro disparava, me questionei:

- Será que esse senhor guardou meu endereço e conhece essa Rua do Brooklin?

Aquele sussurro naquele momento, já tinha conseguido perturbar a generosa paciência da minha esposa. Mesmo assim dei ouvidos ao fato de que o negócio de venda de peças para automóveis que seu filho tinha, não prosperou, pois a frota de carros da capital paulista estava cada vez mais nova e os projetos automotivos mais resistentes ao desgaste. A janela do taxi confirmava em parte o seu discurso.

Para garantir a manutenção do contato, seus olhinhos pequenos, roliços e ávidos defrontavam-se com os meus pelo espelho retrovisor.

A inexistência de freios ABS no seu carro era comprovada pelo derrapar dos pneus frontais no asfalto molhado pela chuva dessa quinta, mesmo assim senti sua competência na direção pela calma e segurança que trocava de pistas quando os ônibus na sua frente paravam.

Mas quando o taxista com quarenta e cinco anos de profissão vacilou, e nos consultou sobre o melhor caminho, minha esposa afirmou categoricamente que o carro poderia parar ali mesmo, pois ela já vislumbrara uns edifícios altos em frente do prédio onde nosso filho menor, que estávamos visitando, aluga um apartamento. Como se não tivesse ouvido, ele fez uma volta e a nosso pedido passou pelo destino inicial e nos deixou em frente a uma padaria com um fast-food para podermos almoçar.

Quando descemos do taxi, sentimos a presença de um vento frio e forte que colocou em risco a estrutura do nosso pequeno guarda-chuva. Isso nos obrigou a percorrer alguns metros até o restaurante, muito bem abraçados.