Os filhos de Narciso

“Porque Narciso acha feio tudo que não é espelho”

Caetano Veloso

A História não tem lógica. Demorou para chegar à conclusão, mas cheguei. A geração pós-guerra resolveu jogar para o alto todo um conjunto de valores outrora julgados sagrados e aproveitar a vida com certa irresponsabilidade. O hippies, que misturaram duas gerações, levaram esse “curtir” ao extremo e possibilitaram um novo jogo de valores, onde o “ter” passou a ser de todos e de ninguém, o sexo, outrora tabu, virou regra, e as drogas abriram imensos portões nas catedrais da sensação. Ironicamente, passaram a consumir alimentos mais “saudáveis”, denunciando o consumismo.

O que seria da geração a sucedê-los? Que massa surgiria da mistura desse caldo, aparentemente tão explosivo? A esperança era de que as novas pessoas, síntese das experiências das gerações ascendentes, crescessem com os olhos abertos e a cabeça no lugar, rumo a uma nova ordem mundial, onde imperasse a solidariedade e a racionalidade, isto é, onde os valores sobrepujassem a hipocrisia. Conscientes dos males que a droga traz e da idiotice do consumismo, poderiam ser muito mais felizes consumindo menos e curtindo mais.

Nenhuma ilusão resiste à força da propaganda explícita ou covardemente escondida atrás de biombos que prometem a felicidade. Chegou uma geração – filhos tardios e netos da geração hippie e seus contemporâneos - que, graças à tecnologia, à facilidade de consumo e a essa propaganda, elegeu a aparência como seu deus e o consumo como sua peregrinação rumo à canonização.

Dinheiro ou crédito, tanto faz, mesmo que sejam dos pais – de preferência deles – determinam seu status e o que fazem com isso, seu grau de inserção no grupo. Produzem lixo como nunca alguém o fez e consomem desenfreadamente, sem qualquer preocupação com as consequências para o presente e o futuro. Agem como se o futuro fosse um ser etéreo e apenas para os outros, pois o deles passará ao largo de todas as mazelas.

São os Narcisos da Nova Ordem, que detestam qualquer coisa que não seja seu egoísmo que só será detectado quando as rachaduras do espelho distorcerem a imagem que têm em sua mente e mostrarem a verdadeira face de seu vazio.