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Quando pássaros agourentos sobrevoam gralhando nos céus, é sinal de que alguma coisa não está boa, ou que algo de muito ruim está por acontecer.

Ouvi agora a pouco uma revoada dessas aves corvídeas anunciando o mal. São assustadoras, como se rissem de nossas humanas trapalhadas. Corri para o interior do escritório e fiquei a meditar sobre qual a mazela que desta vez trariam as funestas aves.

Passado dez minutos desde suas gralhadas, nada me aconteceu, nem a ninguém da família ou amigo, ao menos que não o saiba.

Por obra do acaso nossa vida flui, muitas vezes de forma que não pretendêramos como, nem de longe imaginando os rumos que porventura vieram a tomar. A vida em si é uma sucessão de atos e fatos medidos por segundos, cujos fins não nos são possíveis programar. Por tudo, parece-nos uma engraçada e ilógica caminhada em direção a morte, a qual jamais venceremos e que mesmo assim jamais cansamos de continuar, como se algo extraordinário, ou sobrenatural, por fim, no limiar do último passo, nos salvasse de vez do aniquilamento.

Trata-se de uma sôfrega perspectiva, que nos direciona aos mais mirabolantes desvios de rota na ânsia da obtenção da “PAZ DERRADEIRA”.

Tememos a putrefação mais do que tudo no mundo, principalmente no que tange aos estados mórbidos em que fica um doente quando acometido por uma doença grave, que o debilita ou o deixa disforme, prostrado na cama, definhando dia-após-dia enquanto não chega o fim. Para esses, o fim é uma libertação. Portanto, o desprezo, a dor e a putrefação são situações que causam ao ser humano um sentimento infinitamente superior ao que imaginam ser a morte, uma vez que essa não pode ser sentida in extremis, tendo em vista que, “quando há morte, não há vida”, e vice-versa.

O temor que sentem pela morte em si é um temor quase que reverencial, um temor de algo que desconhecem em sua totalidade, ou seja, o natural temor que todos sentimos diante o desconhecido.

No meu caso, quando a morte chegar quero estar sereno e curioso feito uma criança que está a descobrir as coisas da vida, às apalpadelas, apreciando entusiasmado os mistérios que hão por vir...

Mesmo que nada venha, que a escuridão e a insensibilidade tomem conta de quem um dia foi um ser vivo entre outros, quero estar preparado para que assim seja, que não veja sofrimento no que a Natureza, em sua infinita sabedoria, nos impôs, e que sorria pelo fluxo que acabara de transpassar.

Os pássaros agourentos se foram há quase uma hora, sem que, no entanto, nada de ruim deixarem a este momento ínfimo...

And that is very good!..

Cristiano Covas, 21.12.05.

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Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 15/09/2010
Código do texto: T2499136