TEXTO COMPLETO - SEGUNDA PARTE - Diário Poético-Sentimental de Uma Greve: Curiosidades, Emoções e Poesia na Greve do Judiciário Trabalhista Mineiro

XXVIII

Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo. E examinai, sobretudo, o que parece habitual. Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural, nada deve parecer impossível de mudar

(Bertolt Brecht)

O dia primeiro de junho de 2010 – dia de muita expectativa entre os servidores públicos do Judiciário Federal e do Ministério Público da União - ficou conhecido com diferentes nomes entre nós. Batizamo-lo, por exemplo, como o dia do “apagão”, o dia da “vuvuzela”, o dia do “barulho” ou, simplesmente, o Dia Nacional de Luta.

Em torno de 600 servidores se concentraram na Capital mineira em frente ao prédio da Justiça Federal. Encontravam-se munidos de apitos, cornetas, vuvuzelas, alegria, muita saúde e disposição.

As vuvuzelas são as conhecidas cornetas com cerca de um metro de comprimento usadas pelos torcedores nos jogos de futebol da África do Sul. A origem do nome é controversa, mas o importante no caso é de fato o barulho e o incômodo que elas e suas compatriotas (os apitos, as cornetas e os assovios) são e foram capazes de fazer nesse dia por todo o Brasil em prol da aprovação do nosso plano de cargos e em repúdio à tentativa de congelamento do salário dos servidores públicos brasileiros por mais dez anos.

Receberam aplausos, apitaços e cornetaços os colegas oficiais de justiça, as caravanas de servidores vindos do interior (Contagem, Congonhas e Sete Lagoas) e, em especial, os servidores e as servidoras aposentadas que se encontram igualmente engajados na aprovação do nosso plano de cargos. A colega Gilda Bandeira mandou o seu recado para todos nós, servidores da ativa:

- A luta dos aposentados de hoje garante os direitos de amanhã dos ativos. Vocês (os ativos de hoje) são os aposentados de amanhã!

Fernando Neves saudou a importante e sempre constante presença dos aposentados na greve, conclamando pela presença de mais e mais colegas. Afirmou ainda que:

- O nosso ato está bonito e a nossa greve é um sucesso, está ordeira e legal.

O ato de hoje contou com a presença artística dos nossos músicos e de um grupo de teatro. Três integrantes da Companhia de Teatro Dino Marangoni encenaram para os servidores uma peça curta e cômica cujo enredo era o seguinte: durante o expediente de um dia normal de trabalho, dois servidores vão discutindo acerca da importância da greve e de suas possíveis presenças no movimento.

Em seguida, entra em cena um terceiro integrante da Companhia. Esse último faz uso de longas pernas de pau e representa um deputado que se dispõe a ajudar na aprovação do plano de cargos e salário dos servidores.

Logo o deputado telefona para um senador e informa que os servidores estavam de fato “em greve” e que era melhor aprovar rapidamente o tal projeto.

- Os servidores estão mesmo em greve - repete ele por três vezes no celular invisível que leva em suas mãos – é melhor aprovar logo o plano!

Os manifestantes aplaudiram bastante a apresentação. Foi mesmo um sucesso. O foi elaborado com muita criatividade e inteligência. Parabéns aos integrantes da Companhia de Teatro Dino Marangoni, nota dez na apresentação e na defesa dos nossos interesses.

Outro ponto importante neste ato do dia 01/06 foi a análise da Portaria Conjunta nº 01, publicada pelo TRT da 3ª. Região no dia 27 de maio de 2010. Essa portaria versa sobre os serviços a serem mantidos na greve e trouxe dúvidas e o receio entre os manifestantes a respeito de um possível desconto de salários dos dias em greve.

Contrabalançando a referida portaria, tomei conhecimento de um importante documento vindo da Bahia: uma Declaração Conjunta publicada em Salvador no dia 25 de maio pelos Presidentes do TRT, do TRE e do TRF daquele estado.

DECLARAÇÃO CONJUNTA NO. 01/2010

Na qualidade de dirigentes máximos que integram os órgãos do Poder Judiciário Federal do Estado da Bahia, declaramos o nosso apoio ao Projeto de Lei referente ao Plano de Carreira dos Servidores do Poder Judiciário da União, em tramitação no Congresso Nacional, sob o no. 6613/1999, uma vez que sua proposição, além de decorrer de estudos empreendidos por comissão composta por representantes do Supremo Tribunal Federal, do Conselho Nacional de Justiça, dos Tribunais Superiores, do Conselho de Justiça Federal, do Conselho Superior da Justiça do Trabalho e do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, tem como objetivo aprimorar as políticas e as diretrizes estabelecidas para gestão de pessoas, bem assim solucionar os principais problemas relacionados à questão remuneratória dos integrantes das carreiras judiciárias, cuja estrutura se apresenta defasada em relação a outras carreiras de Estado, revelando-se, assim, em justo anseio da categoria.

Nesse primeiro dia de junho de 2010 aconteceram muitas manifestações por todo o Brasil. Em Brasília, por exemplo, tivemos a presença de cerca de quatro a cinco mil servidores diante do edifício do Ministério do Planejamento. Disseram que o barulho lá estava insuportável, mistura de apupos, apitaços, cornetaços e do descomunal som produzido pelas inumeráveis vuvuzelas presentes.

Nas ruas de Brasília os manifestantes gritavam as seguintes palavras de ordem:

- PCS já! Servidores na rua, Bernardo, a culpa é sua!

O movimento foi encerrado em Brasília com um abraço simbólico ao bloco onde se localiza o gabinete do Ministro do Planejamento.

Outras dezenas de manifestações ocorreram em pelo menos dezoito capitais de estados e em muitas cidades pelo interior do Brasil onde se localizam as varas do trabalho. Como exemplo de capitais, temos: Belo Horizonte, São Paulo, Curitiba, Rio de Janeiro, Manaus, São Luiz, Maceió, Cuiabá, Campo Grande, Teresina e Recife.

XXIX

A injustiça passeia pelas ruas com passos seguros.

Os dominadores se estabelecem por dez mil anos.

Só a força os garante.

Tudo ficará como está.

Nenhuma voz se levanta além da voz dos dominadores.

No mercado da exploração se diz em voz alta:

Agora acaba de começar:

E entre os oprimidos muitos dizem:

Não se realizará jamais o que queremos!

O que ainda vive não diga: jamais!

O seguro não é seguro. Como está não ficará.

Quando os dominadores falarem

falarão também os dominados.

Quem se atreve a dizer: jamais?

De quem depende a continuação desse domínio?

De quem depende a sua destruição?

Igualmente de nós.

Os caídos que se levantem!

Os que estão perdidos que lutem!

Quem reconhece a situação como pode calar-se?

Os vencidos de agora serão os vencedores de amanhã.

E o "hoje" nascerá do "jamais".

(Bertolt Brecht)

A situação do movimento grevista se encontra hoje, 07 de junho, bastante complicada. O Tribunal Superior do Trabalho, através de seu presidente, publicou portaria determinando o corte de ponto dos servidores em greve naquele órgão. A Presidenta em exercício do TRT do Rio de Janeiro estendeu a esse Estado o referido ato do TST, determinando igualmente o corte do ponto.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) deferiu parcialmente o pedido de liminar na petição 7933, da Advocacia Geral da União (AGU), determinando que pelo menos oitenta por cento dos servidores de toda a Justiça Eleitoral trabalhem normalmente. Discute-se se a referida decisão valeria apenas para o SindjusDF e a Fenajufe ou se para todos os sindicatos ligados à Federação, pois apenas aqueles dois sindicatos são parte direta no processo.

Por outro lado – ou ainda do mesmo lado – parte da cúpula do Judiciário (TSE e STF) vem se mantendo em completo silêncio nos últimos dias, prenunciando um misto de raios e trovoadas.

Já na Bahia, a Presidenta do TRT através do Ato no. 0175/2010 suspende a partir do dia 10 de maio, ad referendum do Órgão Especial, a contagem de todos os prazos judiciais, sem prejuízo dos atos realizados.

O mesmo aconteceu nos Estados de São Paulo e Goiás: prazo suspenso.

XXX

Nos livros antigos está escrito o que é a sabedoria:

Manter-se afastado dos problemas do mundo

e sem medo passar o tempo que se tem para

viver na terra;

Seguir seu caminho sem violência,

pagar o mal com o bem,

não satisfazer os desejos, mas esquecê-los.

Sabedoria é isso!

Mas eu não consigo agir assim.

É verdade, eu vivo em tempos sombrios!

(Bertolt Brecht)

A manifestação de ontem, 07 de junho, contou com a presença de pouco menos que 300 servidores. Essa queda já é um reflexo das muitas pressões que o movimento vem sofrendo nos últimos dias, inclusive com o deferimento parcial dado pelo STJ ao pedido feito pela AGU.

Nesse momento, entretanto, eu gostaria de fazer um breve comentário sobre outra coisa: as pessoas e personagens que por um motivo ou outro acabam se destacando no movimento grevista em meio à multidão.

Vou citar, por exemplo, um colega entrevisto outro dia na fila de assinatura da lista de presença da greve que muito se assemelhava ao escritor Paulo Coelho. Faltava-lhe apenas o cavanhaque para que se tornasse o seu sósia perfeito.

Outra pessoa que se destacou com a sua presença diária e “diferente” foi o colega Thiago. Este sempre se apresenta vestido a caráter com a sua bermuda de poliéster, camisa, meias, luvas, sapatilhas e capacete de ciclismo. Tudo isso acompanhado da sua simpática bicicleta.

O Thiago encosta a bike num canto qualquer, assina a lista de presença da greve e fica por ali enquanto durar a manifestação. Ele me fez recordar de um interessante personagem de programa humorístico da televisão: o famoso Patropi, criado pelo artista Orival Pessini

Ora – imaginei num momento de plena descontração e fantasia mental - supondo que o Patropi tivesse que defender com o verbo e a fala a causa do nosso plano de cargos, imagino que ele diria algo mais ou menos assim:

- É o seguinte: quer dizer, eu também não sei. Mas supondo que soubesse, eu diria: sei lá, entende! Será que dá pro pessoal aprovar logo esse PCS? É que eu tô atrasado...

Pois bem: existe ainda um terceiro e mais importante personagem que surge diariamente entre nós. Em verdade ele se encontra conosco durante toda a manifestação e mesmo antes ou depois dela. Mas é no final de cada ato que este personagem surge resplandecente: é o Hino Nacional Brasileiro.

Ao final de cada ato nos damos as mãos, elevamos os nossos pensamentos e desejos de vitória e entoamos com orgulho o Hino Nacional Brasileiro. Ao término dele erguemos juntos os punhos e soltamos um brado que marca e representa a nossa solidariedade e o nosso objetivo comum naquele momento.

Para nós, estas são as palavras mais importantes de cada ato público de que participamos:

Mas, se ergues da justiça a clava forte,

Verás que um filho teu não foge à luta,

Nem teme, quem te adora, a própria morte.

Terra adorada

Entre outras mil,

És tu, Brasil,

Ó Pátria amada!

Dos filhos deste solo és mãe gentil,

Pátria amada,

Brasil!

São estas as palavras que mais nos dizem do nosso momento. São elas que fazem transparecer o que sentimos e o que desejamos. E são elas, finalmente, que falam da nossa garra (“Verás que um filho teu não foge à luta”), da nossa perseverança, da esperança e do nosso desejo de vitória.

XXXI

Cada um ao nascer

traz sua dose de amor,

Mas os empregos,

o dinheiro,

tudo isso,

nos resseca o solo do coração.

Sobre o coração levamos o corpo,

sobre o corpo a camisa,

mas isto é pouco.

Alguém

imbecilmente

inventou os punhos

e sobre os peitos

fez correr o amido de engomar. Quando velhos se arrependem.

A mulher se pinta.

O homem faz ginástica

pelo sistema Muller.

Mas é tarde.

A pele enche-se de rugas.

O amor floresce,

floresce,

e depois desfolha.

(Maiakovski)

Dia 09. Pouco mais de duzentos servidores estiveram presentes ontem na manifestação ocorrida na porta do TRE. As liminares concedidas pelo STJ fizeram os seus efeitos e deixaram as suas marcas. Além da liminar determinando a volta de 80% dos servidores do TRE, temos agora a liminar que determina a volta ao trabalho de 60% dos servidores do TRT.

Tudo isso - afora as pressões do dia-a-dia e às quais eu denominaria simplesmente de “comezinhas” e próprias da nossa vida doméstica. Alguém disse na manifestação de ontem que para aderir à greve tivemos que discutir e muitas vezes nos explicar inicialmente com uma série de pessoas: nossos colegas, nossos chefes e até mesmo para com a nossa família, esposa e filhos, etc.

Comigo não foi diferente. Em relação a este último item, tive uma vasta discussão com minha esposa. Ela não é favorável à greve. Tive que lhe dizer que eu também não sou, mas que me vejo obrigado e impelido a participar dela.

O fato é que se hoje eu recebo um salário suficiente para pagar uma escola particular para os meus filhos, o aluguel de um apartamento e a mensalidade de uma faculdade, devo isso às conquistas das greves que antecederam a esta e à influência dos reajustes salariais provenientes dos planos de cargos e salários. Se ficar de braços cruzados – tentei convencê-la – daqui a pouco o meu salário mal vai dar para pagar o aluguel e comprar alimentos, como acontecia quando tomei posse no Tribunal no ano de 1996. principalmente levando-se em conta as pretensões do governo de congelar por dez anos os salários de todos os servidores públicos brasileiros.

Hoje, porém, teremos um novo encontro entre os técnicos do Judiciário e os representantes do Ministério do Planejamento. Espero que aconteça qualquer coisa.

XXXII

Uma parte de mim

é todo mundo:

outra parte é ninguém:

fundo sem fundo.

Uma parte de mim

é multidão:

outra parte estranheza

e solidão.

Uma parte de mim

pesa, pondera:

outra parte

delira.

Uma parte de mim

almoça e janta:

outra parte

se espanta.

Uma parte de mim

é permanente:

outra parte

se sabe de repente.

Uma parte de mim

é só vertigem:

outra parte,

linguagem.

Traduzir uma parte

na outra parte

— que é uma questão

de vida ou morte —

será arte?

(Ferreira Gullar)

Os servidores do Tribunal Superior do Trabalho divulgaram ontem um boletim designado sob o nome de: “Respeito profissional não se mendiga, conquista-se lutando pelos nossos direitos”.

Senti que aquele texto dizia muito da minha pessoa e dos sentimentos dos meus colegas. O texto é o que vai abaixo:

XXXIII

Tu tens um medo:

Acabar.

Não vês que acabas todo dia.

Que morres no amor.

Na tristeza.

Na dúvida.

No desejo.

Que te renovas todo dia.

No amor.

Na tristeza.

Na dúvida.

No desejo.

Que és sempre outro.

Que és sempre o mesmo.

Que morrerás por idades imensas.

Até não teres medo de morrer.

E então serás eterno.

(Cecília Meireles)

22 de junho. Depois de alguns dias ausente dessas minhas anotações, torno a dar continuidade ao presente diário da greve do Judiciário Federal.

Vou falar hoje das palavras de ordem da greve. Palavras de ordem são aquelas gritadas por todos os participantes durante as manifestações e que, de uma forma ou de outra, deixaram as suas marcas em nós e na própria greve.

Muitas vezes essas palavras vão embaladas ou acompanhadas por algum tipo de rima, servindo também para animar o grupo e fazer aflorar a unidade entre os manifestantes, proporcionando-lhes uma voz de conjunto.

Vejamos algumas das principais palavras de ordem utilizadas nesta greve:

- PCS Já.

Palavra de ordem de maior importância e freqüência durante toda a jornada da greve. Na vigília iniciada no dia 22 de junho diante do STF, manifestantes vindos dos vários estados do Brasil, desenharam essas palavras com velas acesas no pátio externo daquele Tribunal. Essa palavra de ordem pautou também todos os dias da greve.

Em relação à referida vigília, foi ela encerrada com a apresentação de um grupo de quadrilha e comidas típicas das festas juninas de São João.

- Ô seu Peluso, negocia e valoriza a categoria.

- Acorda Peluso! Negociação Já!

Essas duas palavras de ordem procuraram demonstrar a intimidade e a parceria dos manifestantes com o Presidente do STF.

- Acorda Peluso! Negociação Já!

- Direito de greve merece respeito, corte de ponto eu não aceito.

Essa se refere ao corte de ponto e de salários proposto pelo TST e por outros Tribunais espalhados pelo Brasil. O próprio Superior Tribunal de Justiça, entretanto, já começa a rever essa questão. Os ministros do STJ já se posicionaram contra o desconto de salário na greve do Ministério do Trabalho. Também em Santa Catarina o TRT se dispôs igualmente a negociar os dias parados. E, finalmente, o Tribunal Pleno da 15ª. Região suspendeu o corte de ponto que havia sido proposto e efetivado anteriormente. Com a suspensão do desconto, uma nova folha de pagamento já está sendo rodada pelo setor de pagamento de pessoal e a devolução dos valores descontados será feita provavelmente no início do mês de julho.

- Ô seu Peluso, qual é a tua, por que tu não atravessas a rua?

Esta palavra de ordem vai direcionada também ao presidente do STF e faz menção ao fato de que esperávamos que ele colocasse o “nosso PCS” debaixo do braço – como o fez a admirável Ellen Gracie quatro anos atrás – e se encaminhasse até o gabinete do Presidente Lula para negociar o plano e a forma de pagamento.

- Vem/vem para a greve, vem/que o PCS é seu também.

Grito de luta criado pelo servidor Nilson, da Justiça do Trabalho da cidade de Juiz de Fora.

- Brasília já está na greve: agora só falta você.

Essa palavra de ordem faz menção à vagarosa entrada em greve dos servidores de Brasília e ao momento em que isto ocorreu.

- Revisão salarial já.

Chamada constante do site do Sintrajusc (Santa Catarina).

- PCS já, eu quero, eu luto.

Faz parte da página do Sintrajud (São Paulo).

- Greve, tá na hora da pressão.

Palavra de ordem constante do Sintrajufe (Rio Grande do Sul).

- PCS 4, aprovação já, sem alterações.

Palavra de ordem do Sinjufego (Goiás).

- PCS, a luta continua.

Palavra de ordem expressa sobre muitos dos bolos de aniversário de um e dois meses da greve do Judiciário por todo o Brasil.

- Conciliar é legal. Na Greve também.

Palavra de ordem extremamente criativa do SINTRAJUSC, Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário Federal no Estado de Santa Catarina e baseada no próprio conceito “conciliar é legal” criado e divulgado pelo Judiciário brasileiro.

Este sindicato iniciou essa campanha junto aos servidores das três Justiças Federais. Mais direcionada ao TRT da 12ª. Região, a campanha busca pressionar a direção do Tribunal a firmar um termo de compromisso para a negociação dos dias parados no período de 6 de maio a 17 de junho de 2010, nos mesmos moldes do termo firmado em 3 de dezembro de 2009, quando ocorreu a primeira greve pelo atual PCS. Parece que um acordo nesse sentido já começa a se fazer real.

- Não devemos nos esquecer, finalmente, da “Ladainha do PCS”, música e letra composta e gravada pelos servidores do Piauí.

Essa é a palavra de ordem totalmente musical. Ela se espalhou por todos os estados da Federação como a “música” da greve. Vão abaixo os primeiros versos desse xote pra lá de arretado:

Quem não greva não merece PCS

E sem greve o governo agradece

Quem não greva o movimento enfraquece

Se a coisa for assim só a gente é que padece

Vem pra cá pra discutir o PCS

É reunindo que a nossa luta cresce

XXXIV

A vida é pouca

a vida é louca

mas não há senão ela.

E não te mataste, essa é a verdade.

Estás preso à vida como numa jaula.

Estamos todos presos

nesta jaula que Gagárin foi o primeiro a ver

de fora e nos dizer: é azul.

E já o sabíamos, tanto

que não te mataste e não vais

te matar

e agüentarás até o fim.

O certo é que nesta jaula há os que têm

e os que não têm

há os que têm tanto que sozinhos poderiam

alimentar a cidade

e os que não têm nem para o almoço de hoje

A estrela mente

o mar sofisma. De fato,

o homem está preso à vida e precisa viver

o homem tem fome

e precisa comer

o homem tem filhos

e precisa criá-los

Há muitas armadilhas no mundo e é preciso quebrá-las.

(Ferreira Gullar)

Dia 23 de junho.

Segundo o Presidente do STF, Ministro Cézar Peluso, “a greve no judiciário está incomodando e é preciso buscar uma soluçao para o problema”.

Greve – nós bem sabemos - é para isso mesmo: serve para incomodar e fazer movimentar a máquina da negociação. Esta, entretanto, vem demorando a achar o seu caminho e a encontrar uma soluçao. Acho que não fica bem para o órgão maior do judiciário brasileiro ficar presenciando e aturando todos os dias as nossas manifestações diante de suas portas. Por outro lado, as vuvuzelas devem de fato incomodar bastante, fisicamente mesmo. Dizem que o barulho delas é tão infernal que chega a impedir o trabalho dos funcionários e ministros daquele órgão. Imagine então se um ministro ou ministra estiver com dor de cabeça ou enxaqueca!

XXXV

Se as coisas são inatingíveis... ora!

Não é motivo para não querê-las...

Que tristes os caminhos, se não fora

A mágica presença das estrelas!

(Mário Quintana)

Ainda nessa quarta-feira, 23 de junho, o STF soltou uma nota à imprensa acerca do projeto do plano de cargos dos servidores do Judiciário Federal. Esta nota tem ligação direta com algumas notícias veículadas na mídia jornalística e em sites da internet sobre a suposta e não verídica existência de supersalários no judiciário. A nota vai abaixo na íntegra:

Nota à imprensa – projeto de lei sobre reajuste do Judiciário

1. O projeto de lei para reajuste dos salários dos servidores do Judiciário que está em exame pelo Legislativo foi elaborado pelos órgãos do Poder Judiciários da União, sob a coordenação do Supremo Tribunal Federal, sendo inclusive aprovado em sessão administrativa da Suprema Corte antes de ser encaminhado ao Congresso Nacional.

2. Os vencimentos do Poder Judiciário estão comprovadamente defasados em relação às carreiras públicas similares dos Poderes Executivo e Legislativo.

3. O projeto tem por objetivo também eliminar a elevada rotatividade existente nos quadros de pessoal do Judiciário, em conseqüência da falta de atratividade da remuneração desses cargos.

Brasília, 23 de junho de 2010

Secretaria de Comunicação Social

A principal percepção que esta nota nos passa é a de que o próprio STF resolveu tomar a dianteira para esclarecer a população e a mídia acerca das inverdades constantes no artigo publicado anteriormente em jornais e sites da internet.

Por outro lado, com a presente nota o STF se declara à população de modo favorável ao reajuste dos seus servidores. Dispõe-se a defender a nossa causa e a tomá-la em suas mãos.

Parabéns ao Ministro Cezar Peluso pela sábia decisão.

E que ele e seus Ministros nos desculpem o incômodo das vuvuzelas, das velas e das vigílias diante do Supremo. O fato é que se não chamarmos a atenção das “enfermeiras”, elas nem perceberão a presença de tantas “crianças choronas e sonolentas” no berçário do Judiciário.

XXXVI

Ponho-me a escrever teu nome

com letras de macarrão.

No prato, a sopa esfria, cheia de escamas

e debruçadas na mesa todos completam

esse romântico trabalho.

Desgraçadamente falta uma letra,

uma letra somente

para acabar teu nome!

- Está sonhando? Olhe que a sopa esfria!

Eu estava sonhando...

E há em todas as consciências um cartaz amarelo:

"Neste país é proibido sonhar."

(Carlos Drummond de Andrade)

29 de junho de 2010. Cena curiosa e interessantíssima: o Presidente Lula em desabalada correria pela Rua Augusta, centro financeiro da cidade de São Paulo, meio que perseguido por uma quantidade razoável de manifestantes do movimento paredista dos servidores do Judiciário Federal e do MPU. E, à tiracolo, ia o Presidente carregando consigo nada menos do que o Sílvio Berlusconi, atual Primeiro Ministro da Itália.

Por incrível que isso possa parecer, esta cena aconteceu mesmo e foi ele de fato - o próprio Presidente Lula – quem confirmou e nos comunicou em primeira mão que o seu encontro com Cezar Peluso ocorreria nesta quinta-feira, dia 1º. de Julho de 2010. Nessa reunião os Presidentes do Executivo e do Judiciário discutirão à respeito do PCS dos servidores do Judiciário.

Mas aquela cena cômica havia começado bem antes. Os servidores passaram todo o dia na perseguição do Presidente. Foram oito horas de muito barulho, vuvuzelas e apitaços no coração do centro financeiro mais importante do Brasil.

Sem querer – ou talvez inconscientemente querendo, já que durante boa parte de sua vida foi o atual Presidente da República o maior estrategista de greves de que se tem notícia no Brasil - Lula presenteou o movimento paredista com um bocado de energia e de oxigênio.

XXXVII

Vocês, que vão emergir das ondas

em que nós perecemos, pensem,

quando falarem das nossas fraquezas,

nos tempos sombrios

de que vocês tiveram a sorte de escapar

(Bertolt Brecht)

E olhe que estamos precisando disso. A participação dos servidores na greve decresceu bastante nas últimas semanas. A maior parte dos trabalhadores já retornou ao trabalho e a greve segue meio que virtualmente, se é que podemos falar assim.

Uma parcela dos servidores continua a se encontrar nas manifestações, mas praticamente voltamos todos a trabalhar e o trabalho atrasado e acumulado começa já a ser reposto e colocado em dia por todos.

E apesar da greve ser de fato a única moeda de troca que possuímos para forçar a abertura de negociação com o governo, o que ainda não morreu entre nós foi a esperança na aprovação do plano. Este se encontra já um tanto distante, mais a vitória ainda sinaliza com a sua bandeira em nossa direção e nos diz para não perdermos a fé e a esperança.

Talvez seja por isso que o povo diz ser a esperança a última que morre!

Capítulo Final

Aprendemos a voar como pássaros e a nadar como peixes, mas não aprendemos a conviver como irmãos. A verdadeira medida de um homem não é como ele se comporta em momentos de conforto e conveniência, mas como ele se mantém em tempos de controvérsia e desafio. Sonho com o dia em que a justiça correrá como a água e a retidão como um caudaloso rio.

Eu tenho um sonho de que um dia meus quatro filhos vivam em uma nação onde não sejam julgados pela cor de sua pele, mas pelo seu caráter.

Nossa geração não lamenta tanto os crimes dos perversos quanto o estarrecedor silêncio dos bondosos.

(Martin Luther King)

É por todos estes motivos que um movimento paredista pode muitas vezes tomar o peito e a alma de uma pessoa e torná-la vitoriosa e cheia de orgulho. Orgulho de si e de seus colegas. Orgulho do humano. Do ser. Orgulho dos que participaram na greve e daqueles que não se atreveram ainda desta vez a se juntar a nós, mas que de alguma forma deram a sua contribuição. Todas essas pessoas às vezes surgem como espelhos ou sombras por detrás de alguma palavra, ação ou imagem nossa.

O mais importante em tudo, porém, foi que cada um que aqui esteve e permaneceu lado a lado com os demais colegas, se uniu durante algum tempo pelos laços da solidariedade e do objetivo comum. E o mais valioso é que estas pessoas se encontram “hoje” menos desamparadas do que se achavam “ontem”, quando tudo começou.

E a razão disso é simples: cada pessoa que aqui esteve deixou atrás de si o casulo da sua suposta segurança e se dispôs a dar as mãos e a se unir a outros colegas, correndo os riscos inerentes ao presente negócio.

E – finalmente - o fato mais marcante e precioso do movimento é que todos os nossos companheiros sabem que estiveram ligados não apenas durante as audições do Hino Nacional Brasileiro, no término de cada ato e de cada dia de manifestação, mas durante todo o tempo em que se encontraram reunidos em torno daquele objetivo comum.

Têm eles consciência de terem sido solidários uns com os outros durante aquele período e que a maior aprendizagem de todas fora mesmo a compreensão dos novos sentidos dessa palavra tão importante e tão desvalorizada nesses tempos tão sombrios e cheios de cólera, de sons e de fúrias.

Eis a palavra:

“Solidariedade”.

Mas,

“É melhor tentar e falhar que ocupar-se em ver a vida passar. É melhor tentar, ainda que em vão, que nada fazer. Eu prefiro caminhar na chuva a, em dias tristes, me esconder em casa. Prefiro ser feliz, embora louco, a viver em conformidade. Mesmo as noites totalmente sem estrelas podem anunciar a aurora de uma grande realização. Mesmo se eu soubesse que amanhã o mundo se partiria em pedaços, eu ainda plantaria a minha macieira. O ódio paralisa a vida; o amor a desata. O ódio confunde a vida; o amor a harmoniza. O ódio escurece a vida; o amor a ilumina. O amor é a única força capaz de transformar um inimigo num amigo. O perdão é um catalisador que cria a ambiência necessária para uma nova partida, para um reinício. Nossa eterna mensagem de esperança é que a aurora chegará”.

(Martin Luther King)

Em Minas a greve findou no dia 09 de julho de 2010, quase dois meses depois de iniciada. A cada um que lá esteve - direta ou indiretamente, uns um pouco mais e outros um tanto menos – fica aqui um grande abraço e um apitaço de alegria e satisfação. Parabéns!