Visita inoportuna ao QG

Visita Inoportuna ao QG

Theo Padilha

Primavera de 1966. 5ª. Cia do Quartel General, Praça Rui Barbosa, Curitiba-PR. Anos difíceis para os militares comandados pelo Presidente Geisel. Era o ano das prisões e perseguições aos subversivos. Nesse aglomerado militar morava o soldado n.o 289. No mesmo agrupamento, existiam a 5ª. Cia. de Manutenção e a 5ª. Polícia do Exército. Eram comuns os soldados nas horas de folga, dar um passeio na praça e jogar conversa fora com outros amigos do aquartelamento. Ver as namoradinhas. E até tomar cerveja no bar que havia na esquina, com um pouco de medo dos superiores. Nessa manhã o soldado 289 estava sozinho. E viu quando encostou um belo ônibus azul, cheio de turistas. Uma bela morena bronzeada lhe chamou na janela do ônibus e disse:

— Bom dia, soldado. Somos de Minas Gerais. E estamos procurando o Hotel Guaíra. Você pode nos dizer onde fica?

— Bom dia! É ali mesmo, do outro lado da praça! As árvores não deixam visualizar o edifício! – respondeu o 289, enquanto todos desciam.

— Tome, trouxe para você, essas flores vieram do sertão mineiro! – falou a moça, entregando-lhe um pequeno buquê com minúsculas flores.

— Muito obrigado, vou guardá-las com carinho. Como se chama?

— Josi. É o meu apelido. Sou de Belo Horizonte. Meu nome é Josefina, mas eu não gosto dele. E o seu?

— Como você já viu na farda – Sebastião - eu também não gostei muito desse nome! Fazer o quê? Vocês vão demorar muito aqui?

— Uns três dias. Depois iremos para as praias!

— Você é muito bonita, deve ter trazido o namorado junto!

— Muito obrigada. Não tenho. Sou muito nova – 16 anos - quero primeiro terminar os estudos! Quero ser jornalista!

— Você mora naquele quartel? Deve ser muito lindo. Gostaria tanto de conhecer um quartel por dentro. Tenho lido nos jornais que os militares têm cometido muitas atrocidades lá dentro, é verdade?

— Não. Não é bem assim. Pelo menos ali. A Polícia do Exército só prende aqueles que se rebelam. Ou ousam desafiar, subversivamente, os atos do regime!

— O AI 5? Este ato persegue até os pobres artistas da música, os escritores, não é?

Na verdade, Josi tinha razão. Anos depois ficou constatado que naquele quartel houve muita repressão. O livro “Onde andam os nossos mortos?” fala de muitas torturas e atrocidades.

— Vamos mudar de assunto Josi. Eu não quero ser expulso! Vou falar com o meu sargento Marco Aurélio, ele é muito camarada e solicitar autorização para que todos vocês nos visitem amanhã de manhã. À noite eu lhes procuro!

Sabendo que o Marco Aurélio, era solteiro, e gostava de mostrar o quartel não foi difícil para o Sebastião arrumar uma visita que foi marcada para as dez horas do dia seguinte. À noite Sebastião comprou um botão de rosa e foi visitar Josi no hotel. Deu o recado para a turma e começou um namoro com a mineira. Que não demorou muito, porque o soldado tinha horário para se recolher.

No dia seguinte, na hora marcada, Sebastião e o Sargento Marco Aurélio atravessaram a rua e foram se encontrar com os mineiros que estavam curiosos para entrar naquele complexo. No entanto aconteceu um terrível imprevisto. Assim que o corpo da guarda abriu os portões, entraram junto, o grupo mineiro a pé, e toda a equipe do General Comandante da 5ª. Região Militar de Jipe. Enquanto o corneteiro, imediatamente, tocava o sinal anunciando o General. Foi o maior mucuvuco. Ninguém entendia nada. O General viera a propósito, de surpresa. Talvez por causa do clima de terror que ameaçava o país. Todos os soldados ficaram assustados. E os turistas mineiros, achavam que todos aqueles toques tinha sido para recebê-los e começaram a aplaudir. O sargento e o soldado ficaram bem quietos para não piorar o evento. Nunca mais o 289 viu a mineira.

Joaquim Távora, 23 de setembro de 2010.

Theo Padilha
Enviado por Theo Padilha em 24/09/2010
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