O CHB e O BANCO DO NORDESTE

Eu tinha quatorze anos, estudava no colégio Santa Luzia, na Estância, e nas horas vagas o que eu mais gostava mesmo era de jogar bola. Batia pelada nas ruas próximas a minha casa, na quadra de Jardim São Paulo, e nos bairros vizinhos como Vila Cardeal, Vila dos Industriários, Estância, Barro, etc... Era uma secura por bola que não tinha mais tamanho. Jogava de manhã, de tarde, de noite e se tivesse um joguinho de madrugada (se minha mãe deixasse lógico!) eu estava lá. Jogava oficialmente no Botafogo da Estância, um time com bastante tradição do local, que disputava o campeonato Pernambucano de futebol de salão, era assim que chamavam antes de americaniza-lo para futsal. Chegamos a conquistar o vice-campeonato no ano de 197.. , mas infelizmente não fomos campeões por conta de uma série de fatores que não citarei neste texto, pois o foco deste está direcionado para outro ponto. Posteriormente falarei a respeito disto. Também tinha um time criado por mim e Luciano (Um amigo do colégio Salesiano) em 1974, chamado: BLUMENAU FUTEBOL DE SALÃO, eu ficava um pouco dividido entre um e outro, sem saber qual gostar mais, mas na hora H quando tinha mesmo que escolher qual dos dois eu iria jogar, não tinha dúvidas: Optava mesmo pelo meu time, formado pelos meus mais admirados amigos e peladeiros de infância. Minha família era o que se pode chamar de “classe média”, mas mesmo assim eu já vivia procurando o que fazer para ganhar uns trocados... Fazia uns mandados pra uns e pra outros, andava com meu Tio Hélio pra cima e pra baixo, ajudando-o com instalações elétricas e hidráulicas, o que mais tarde me serviu tremendamente, pois na vida a gente tem que aprender a fazer de tudo um pouco. Sou muito grato ao meu Tio, por ter me ensinado muitas coisas na vida... Talvez ele não saiba disso, mas através deste texto, com certeza ele saberá. Entrava escondido na padaria de Ozéas e pedia pra ajudar os padeiros a fazer pães, bolos e bolachas... No final da tarde ainda ganhava uns pães e leite que levava pra casa e o pessoal de casa ficava perguntando onde eu tinha conseguido aquilo tudo? Quando eu dizia, às vezes levava uma bronca de um dos parentes: - você fica trabalhando na padaria dos outros, se chegarem com uma fiscalização, o dono pode ser autuado e você pode ser punido! Eu dizia: - isso é besteira, eu quero fazer alguma coisa pra ganhar dinheiro, eu quero trabalhar!

Eu nem imaginava que estava tão próximo desse dia! Não precisava tanto assim de dinheiro, pois tinha uma mesada que meu Pai me dava, mas quando eu queria mais, tinha que dar satisfação do por que eu precisava daquele dinheiro e isso me angustiava e me fazia procurar uma saída imediata para o assunto. Um dia, sem ter pra que, meu Pai chegou pra mim e disse: - Amaro Augusto, o BNB abriu inscrição para o concurso público de Bancário Aprendiz, você não tem interesse em fazer? Eu não sabia nem o que era BNB, nem tão pouco do que se tratava um concurso público e muito menos: Bancário Aprendiz, mas meti a cara e fui fazer a inscrição.

A agência do Banco do Nordeste do Brasil que estava fazendo as inscrições era a Metro-Recife que ficava na Rua Sete de Setembro, ao lado das Lojas Americanas. Era uma das agências mais bonitas e elegantes que existiam na região metropolitana do Recife. Tinha umas portas que assim que os clientes pisavam em seu tapete, elas abriam automaticamente, era muito chique para a época.

Fiz a inscrição e comecei a me preparar para o referido concurso. Eu não era um desses alunos que gostava de estudar, como disse anteriormente, o que eu gostava mesmo era de bater uma bolinha, mas na hora de estudar eu sempre fiquei muito atento às explicações dos meus mestres, pois sabia que depois que saísse da sala de aula, não estudaria mesmo! Tinha certa dificuldade com matemática e um pouquinho com português, no mais, tirava tudo de letra. Então conversei com meu professor de matemática, não lembro o nome dele, mas ele era um cara bonachão e fumava tanto que os dedos dele ficavam cheios de nicotina, falei das minhas dificuldades e disse-lhe sobre o concurso e ele se prontificou a ficar depois das últimas aulas dele para dar um reforço no que eu precisasse, junto comigo também ficaram outros alunos que estavam um pouco atrasados e outros dois que também fizeram inscrição para o concurso. Sei que essa foi uma das causas de eu ter conseguido passar no BNB, a outra, as minhas eternas professoras: Amenades e sua filha Albene que tanto me ajudaram, dando reforço na preparação para o colégio militar, que graças a Deus eu não passei.

Lembro o dia que meu Pai chegou em casa todo sorrindo pra mim, orgulhoso do seu filho e brincando comigo... Eu não sabia que onda era aquela e fui tirando sarro da cara dele: - qual foi coroa (ele não gostava de ser chamado assim), o que é que está havendo? Ele disse: Você não está sabendo ainda? – Sabendo o que? Perguntei. Você foi aprovado no concurso do Banco do Nordeste! Eu não sabia onde colocar os pés e as mãos de tanto contentamento, assim... Não sabia exatamente o que significava aquilo para mim, mas sabia que tinha dado um grande passo para conquistar a minha tão sonhada liberdade. Isso era de noite e no dia seguinte eu me dirigi à porta da agência para ver a relação dos aprovados. Eu havia sido aprovado em 30º lugar. As turmas do C.H.B. – Curso de Habilitação Bancária eram formadas por 30 participantes, mas devido as várias desclassificações e desistências nas turmas anteriores, a nossa turma, que foi a terceira, foi agraciada com mais seis participantes. Portanto, a maior turma do CHB Recife. No dia 11 de julho de 1977, entrei para os quadros do Banco do Nordeste do Brasil S.A. com a cara e a coragem, deixando para traz minha vidinha de peladas e maloqueiragem que a adolescência me brindava.

O C.H.B. e o BANCO DO NORDESTE

Como o nobre amigo e compadre Adauto disse uma vez: - "O Banco foi uma tábua de salvação pra mim! Foi um resgate!" Tirou muitos do mau caminho e colocou rédeas nos impulsos de uma adolescência que acabava de conhecer o fim do militarismo e começava a vislumbrar novos horizontes sem limites para a liberdade de escolhas.

Eu não deixava de ser uma dessas pessoas, pois não sei o que seria de mim, se não tivesse passado naquele concurso. Talvez não estivesse fazendo coisas erradas por aí, pois minha educação e minha índole não permitiriam, mas e as dificuldades e circunstâncias da vida? Quando visito minhas irmãs, que ainda moram no mesmo bairro e passo por velhos amigos e conhecidos de infância e observo-os, muitos entregues a bebida, outros envelhecidos precocemente por conta da pobreza e das necessidades, fico muitas vezes a meditar sobre o assunto... Sei não... E se fosse eu?

Tínhamos aulas pela manhã, das oito as dez, sobre todas as áreas do Banco e praticamente as mesmas matérias do colégio à noite. Das 12 às 18 horas trabalhávamos no Banco, aprendendo os mais diversos serviços, nos mais diversos setores. Após o expediente, saíamos às pressas para nossos colégios para complementarmos nosso aprendizado! Era altamente desgastante, mas por outro lado era compensador, pois a bagagem de conhecimento que recebemos até hoje aplicamos na nossa vida diária. Fizemos amizades que vão durar para a eternidade! Foram dois anos e meio de muita luta e muito companheirismo, muitos choros e frustações, mas também de alegrias e prazeres que relembraremos para sempre.

Não sei por que o Banco do Nordeste não continuou com essa experiência tão maravilhosa. O Banco foi o pioneiro em matéria de dar oportunidades profissionais ao jovem que tanto precisa do primeiro emprego e de repente acabou um projeto que transformou pessoas sem expectativa de vida, em grandes administradores dessa mesma instituição. Como é que sem ter pra que, acaba-se uma experiência que deu tão certo, sem dar nenhuma explicação? Eu realmente não compreendo e sinto muito por isso.

Ao final de 1979 encerramos o curso e fomos a primeira turma escolhida para ser encaminhada para as agências do interior. Mas aí é outra história, depois eu continuo...

Olinda, 25 de setembro de 2010.

Augusto Rocha.