Dia de eleição...E as lembranças afloram. Saudades de meu avô, de Pilões, que agora nem Pilões mais é, virou Vila Maia. Saudades de minha avó, sempre caminhando kilômetros pela cozinha, ora matando uma galinha do terreiro, ora atiçando as brasas do fogo á lenha. Alí estava ela a comandar as ajudantes na difícil tarefa de encher os buchos sempre famintos dos eleitores. Meu avô, ostentava o título pomposo de Cel. sem nunca ter sido, era o líder absoluto da região. Dele a palavra final. Cel. Quinca detinha o saber e a liderança.
   Logo nas primeiras horas do dia, aparecia ele, moreno do sol, alto, magro, esguio, alternava momentos de humildade e altivez. Era um sábio. Trajava um terno de linho inglês, nas maõs cédulas para serem entregues aos seus eleitores, já devidamente preenchidas. Todos, sem exceção, recebiam de suas maõs os votos e só tinham o trabalho de depositar na urna.Ele detinha o poder total das urnas. Logo as filas se formavam. Todos com as melhores becas, um riso estampado no rosto com a satisfação de obedecer ao seu senhor. Ás sete em ponto, dava-se início a votação. Apesar dos fiscais que na verdade concordavam com tudo,já que havia uma conivência pacífica, resultado dos acordos firmados anteriormente, de antemão já se conhecia o resultado do pleito.
   Mas, a felicidade maior era chegada... o almoço, resultado de dias de trabalho de D. Amália, minha avó. Os pratos eram extremamente exagerados, uma montanha de comida, coroados  com a carne que se equilibrava. E, como eles comiam... O apetite, descomunal. Logo que terminavam o primeiro prato se dirigiam a cachoeirinha que fica por trás da casa. E, imaginem a cena... Iam molhar a barriga para vagar lugar para um segundo prato. E, lá voltavam eles á fila, novamente famintos. Ás crianças da família tocava o dever de distribuir as sobremesas. Geralmente, doce de cajú, feito num taxo enorme de bronze, especialidade da família. As frutas oferecidas eram relegadas.
   E, durante todo o dia continuava aquele ar de festa. Não democrática, mas festa. Eu não entendia a gravidade do que estava acontecendo. Jamais alcançaria que meu avô pudesse fazer algo ilícito para continuar a dirigir a vida daquelas pessoas. Eles pareciam aceitar de bom grado a sujeição. Ou será que era apenas pelo prato de comida?