As lições do tempo

Nos quatro últimos meses tenho me dedicado a ouvir histórias e a tentar transcrevê-las com o carinho com que foram urdidas e contadas, corrigindo o português apenas na medida do necessário para preservar sua pureza. Atravessei o período mais frio e chuvoso deste ano em São Bento do Sul, sentindo um calor que deve ter vindo da avidez desses personagens em contar o que viveram. Na semana passada escrevi as últimas palavras do livro: “Pequenas histórias de São Bento”, resultado de 52 entrevistas – só usei 40, pois 12 já estão reservadas para o segundo volume, no ao que vem – com operários, empresários, barbeiro, cabeleireira, músicos, donos de salão de baile, políticos, médicos, religiosos, professoras, costureira, filantropos, artistas, desportistas, colonos etc. Somada a experiência de vida dessas pessoas, passa bastante dos dois mil anos.

Não sou propriamente jovem e já vivi experiências fascinantes, desconcertantes e outras nem tanto, mas essa foi uma das mais tocantes. Diariamente recebi lições de vida de quem poderia passar o tempo se lamentando de dores no corpo e outras mazelas. No lugar de lamentações, muitos e muitos sorrisos. “Naquela época era muito bom, também, as pessoas se contentavam com pouco”, dito por quem, aos oitenta e tantos anos, ainda quer ser tratada por “senhorita” por não ter casado, vale por um livro inteiro de conselho para a juventude egoísta que grassa nas baladas de hoje em dia.

Dona Hilda está com oitenta anos e se queixa, sim: “Naquela época era tudo mais divertido; hoje é tudo muito sério”. Santa e bendita queixa. Brososky dá gargalhadas o tempo todo ao contar as passagens de sua vida na Barbearia do Povo que, parece, reunia o maior número de aprontadores de São Bento por metro quadrado. A reverência e o amor filial demonstrados por Johannes Pfeiffer a seu pai, comovem em todos os sentidos. Romão, com 89 anos, ainda plantando nas encostas de Rio Natal porque “Não dá pra comprar tudo”, é o retrato da simplicidade dos puros de espírito.

Para não contar tudo do livro, a resposta de Luiz Grossl, ao ser perguntado se sentia saudade da época em que tocava na Banda Treml: “Saudade eu mato com as gaitas”.