Cidades

Cidades são a alma de um povo. Ou deveriam sê-lo. Infelizmente, a maioria, quando cresce, se torna um amontoado humano cercado por amontoados humanos onde o que menos importa é o ser humano. Primeiro incha e, depois que explode, procuram-se soluções, quase todas doloridas e agressivas em que, muitas vezes, sonhos acalentados por toda uma vida são derrubados como dominós em tardes de domingo.

À medida que uma cidade avança no tempo, a distância entre ela e o bem viver torna-se maior: há mais quilômetros para percorrer e a velocidade para fazê-lo é cada vez menor; precisa-se de mais água potável e ela está menos disponível; os rios, que poderiam servir de caminhos alternativos, transformam-se em fossas que se movem entre fedores, o ar fica mais e mais pesado e irrespirável, as pessoas, finalmente, se transmutam em robôs amargurados e assim se morrem. Nada disso seria necessário se houvesse consciência e planejamento e execução do que se planejou, mas parece que isso não existe em certos vocabulários prenhes de demagogias.

Por isso tudo, não suporto cidades grandes e evito ao máximo, até, passar por elas. Sei que perco uma agenda cultural riquíssima, mas ganho olhos não irritados.

Mas andei pensando, se tivesse que morar numa cidade bem maior e pudesse escolher, onde moraria? Como não conheço o mundo todo, certamente haverá escolhas melhores, mas ficarei com essas de um ex-viajor que não viajou tanto. A ordem não significa nada e não me julguem pretensioso, até porque a escolha é minha e não vai acontecer mesmo:

- Santiago do Chile, muito mais pelos Andes, no nariz da gente e podendo morar, digamos, em Las Condes ou um bairro por ali, ainda com certo ar de província.

- Nova York, bem já que é para ser, nada de Queens, Bronx, Staten Island ou Brooklyn, mas Manhattan, aquela ilha recheada de charme. Quem não sabe o que é ser cosmopolita, tem que ir para Manhattan. Quem quer respirar cultura e culturas, lá é o lugar. Quem quer experimentar as comidas mais exóticas do mundo sem sair de uma ilha, Manhattan. Quem quer torrar toda grana que tem e que não tem em espetáculos, basta uma rua. Tudo isso, numa cidade segura, onde os problemas facilmente se transformam em tempero.

- Buenos Aires, aqui pertinho de nós. A cidade das bibliotecas, de mais de 130 museus, de “la avenida más ancha del mundo” (desculpem, não resisti...), do magnífico Teatro Colón, de “La Boca”, “Recoleta”, “Puerto Madero” e da meio feinha, mas imensa em seu significado, “Plaza de Mayo”, da “Costanera Sur” dos cafés, dos tangos e das pessoas bem vestidas. Há muitos anos quase fui morar lá, não deu certo. Na semana passada me contaram que está com sérios problemas de segurança. Pena, pena, no meu coração continua, como no tango de Gardel e Alfredo de La Pera, “Mi Buenos Aires querido”.