QUANDO A INSISTÊNCIA LEVA À DESCONFIANÇA
Tem coisas que, se analisadas friamente, percorrendo todos os caminhos, fatalmente, elas lhe mostrarão o perigo que são os meios de comunicação, a internet, a globalização, enfim, a falta de privacidade – e sigilo de seus dados –, na modernidade de seus dias. Principalmente, se essas “coisas” estiverem, de certa forma, relacionadas com a sua vida conjugal, mesmo que você não tenha culpa de nada, como foi o meu caso nesse “causo” que agora vou contar.
Eu havia acabado de chegar do trabalho e, como sempre acontece, a minha digníssima estava me esperando para abrir o portão para eu pôr o carro para dentro (uma gentileza que se faz necessária devido aos tempos em que nós vivemos, pois qualquer descuido poderá nos fazer vítimas dessa violência gratuita que impera em cada esquina e que não escolhe hora nem ocasião para ser praticada).
Assim, quando entrei em casa, coloquei a minha bolsa e a pasta nos seus devidos lugares, eu lhe perguntei se tinha alguma novidade para contar (é um costume que trago comigo e que eu me apresso a perguntar sempre que vejo nela um semblante mais fechado, mais desconfiado, mais inquisitivo. E, naquele dia, especialmente, o rosto da minha cônjuge estava tipo “hoje você não me escapa! Hoje eu descubro tudo!”
-Tem sim. Como você sabe? – ela já foi falando e me olhando com aquele ar de detetive prestes a elucidar um crime.
-Por nada. É que eu lhe conheço, não sabe disso? E quando eu vejo você com essa “cara” amarrada, cheia de interrogações nela, eu já sei que vem chumbo grosso – respondi me afastando uns dois passos por motivo de segurança.
-Ligou uma “tal de Dora” pra cá – disse me olhando dos pés a cabeça.
-Sim. E daí? – respondi tentando aparentar uma calma que, na altura do campeonato, estava longe de demonstrar (mesmo sabendo que não tinha feito nada de “errado").
-Daí que ligou mais de uma vez (ela fitou os olhos lá bem no fundo dos meus - o que me fez sentir um calafrio lá no início da “espinha”) e ainda insistiu para que eu lhe desse o número do seu celular.
-E você não perguntou de onde era? – indaguei tentando antecipar o “bote”, comumente chamado de “verde”, quando a mulher quer pegar o “cabra”.
-Ela não disse. Só disse que estava falando de Natal.
Pronto! Quando ela me disse isso, já raciocinei o porquê de sua desconfiança: por casualidade, eu estava indo para Natal, no dia seguinte. E, como toda mulher, fazendo o mais e o menos, ela chegou à conclusão que, se a “Dora” estava em Natal e, estava, insistentemente, ligando para falar comigo, com certeza tinha uma conexão “duvidosa” aí no meio.
-Bem, não sei quem é. De qualquer forma, se ela ligou mais de uma vez, vai ligar de novo. Deve ser, no mínimo, gente de instituição filantrópica ou de cartão de crédito. Vamos esperar – já disse eu me dirigindo para o quarto (e sem olhar para trás).
Depois de um bom banho, depois de revisar um material que iria levar para a capital do Sol, eu fui chamado para o almoço. Ela, a minha consorte, enquanto colocava a “comida” na mesa, me dava, de vez em quando, uma “espiadela” de cortar o “couro” das costas, feito “lapada” dada em burro de carga.
Nem liguei. Primeiro, porque não sabia e nem conhecia quem era essa tal de “Dora”. Segundo, porque não queria que o interrogatório voltasse, justamente, na hora de saborear o guisado posto à mesa.
Eu não queria. Mas o telefone sim. O danado tocou. Eu dei um pulo para ir atender, mas não fui suficientemente rápido para chegar antes que a minha carametade percorresse os “cem metros” em menos de dois segundos. Nem Usain Bolt conseguiria um “arranque” daqueles. Quando imaginei pegar no telefone, ela já estava dizendo “alô”.
Fiquei olhando a fisionomia dela. De preocupada a irritada foi um pulo só. Só ouvi quando ela disse: “vou passar para ele”.
Quando eu atendi, olhei de soslaio e vi que o ouvido da minha esposa estava colado ao meu e, os dois, ouvindo o que estava se falando do outro lado.
-Senhor Raimundo? Aqui quem fala é “Dora” do empreendimento “Vita” daqui de Natal. Estou ligando, desde cedo, para a sua residência, porque fomos informados que o senhor está pretendendo adquirir um imóvel aqui na capital e nós temos excelentes propostas para lhe oferecer.
-Dona “Dora” – disse-lhe eu (sentindo um alívio enorme, pois a pressão das unhas da minha esposa nas minhas costelas, do lado esquerdo, foi “afrouxando”), por que é que vocês, todas as vezes que ligam para a casa de um cidadão e atende a sua esposa, vocês não são claras e já dizem o que querem?
-Desculpe, senhor Raimundo. É uma norma da empresa só falar com a pessoa para quem ligamos – disse a distinta corretora.
-Tudo bem, senhorita. Mas, por gentileza, pelo menos se identifique. Por um acaso eu estou indo para Natal e, mais ainda, o seu nome é igual ao da minha esposa. Entendeu agora? – cutuquei, eu já todo “ancho”, pois, de “esguelha”, eu vi desaparecer aquela expressão de detetive de final de semana que a minha esposa trazia desde que eu havia entrado em casa. Além do mais, você é mulher e sabe muito bem que, na verdade, quem manda, quem autoriza e determina – se adquirimos alguma coisa ou não – são vocês mesmas. Portanto, nada mais correto do que falar diretamente com quem é de direito dentro da “hierarquia” familiar – completei eu, observando que as minhas palavras fizeram um bem enorme à dona do rolo de massas daqui de casa. E a mim também. Ufa!
Obs. Imagem da internetTem coisas que, se analisadas friamente, percorrendo todos os caminhos, fatalmente, elas lhe mostrarão o perigo que são os meios de comunicação, a internet, a globalização, enfim, a falta de privacidade – e sigilo de seus dados –, na modernidade de seus dias. Principalmente, se essas “coisas” estiverem, de certa forma, relacionadas com a sua vida conjugal, mesmo que você não tenha culpa de nada, como foi o meu caso nesse “causo” que agora vou contar.
Eu havia acabado de chegar do trabalho e, como sempre acontece, a minha digníssima estava me esperando para abrir o portão para eu pôr o carro para dentro (uma gentileza que se faz necessária devido aos tempos em que nós vivemos, pois qualquer descuido poderá nos fazer vítimas dessa violência gratuita que impera em cada esquina e que não escolhe hora nem ocasião para ser praticada).
Assim, quando entrei em casa, coloquei a minha bolsa e a pasta nos seus devidos lugares, eu lhe perguntei se tinha alguma novidade para contar (é um costume que trago comigo e que eu me apresso a perguntar sempre que vejo nela um semblante mais fechado, mais desconfiado, mais inquisitivo. E, naquele dia, especialmente, o rosto da minha cônjuge estava tipo “hoje você não me escapa! Hoje eu descubro tudo!”
-Tem sim. Como você sabe? – ela já foi falando e me olhando com aquele ar de detetive prestes a elucidar um crime.
-Por nada. É que eu lhe conheço, não sabe disso? E quando eu vejo você com essa “cara” amarrada, cheia de interrogações nela, eu já sei que vem chumbo grosso – respondi me afastando uns dois passos por motivo de segurança.
-Ligou uma “tal de Dora” pra cá – disse me olhando dos pés a cabeça.
-Sim. E daí? – respondi tentando aparentar uma calma que, na altura do campeonato, estava longe de demonstrar (mesmo sabendo que não tinha feito nada de “errado").
-Daí que ligou mais de uma vez (ela fitou os olhos lá bem no fundo dos meus - o que me fez sentir um calafrio lá no início da “espinha”) e ainda insistiu para que eu lhe desse o número do seu celular.
-E você não perguntou de onde era? – indaguei tentando antecipar o “bote”, comumente chamado de “verde”, quando a mulher quer pegar o “cabra”.
-Ela não disse. Só disse que estava falando de Natal.
Pronto! Quando ela me disse isso, já raciocinei o porquê de sua desconfiança: por casualidade, eu estava indo para Natal, no dia seguinte. E, como toda mulher, fazendo o mais e o menos, ela chegou à conclusão que, se a “Dora” estava em Natal e, estava, insistentemente, ligando para falar comigo, com certeza tinha uma conexão “duvidosa” aí no meio.
-Bem, não sei quem é. De qualquer forma, se ela ligou mais de uma vez, vai ligar de novo. Deve ser, no mínimo, gente de instituição filantrópica ou de cartão de crédito. Vamos esperar – já disse eu me dirigindo para o quarto (e sem olhar para trás).
Depois de um bom banho, depois de revisar um material que iria levar para a capital do Sol, eu fui chamado para o almoço. Ela, a minha consorte, enquanto colocava a “comida” na mesa, me dava, de vez em quando, uma “espiadela” de cortar o “couro” das costas, feito “lapada” dada em burro de carga.
Nem liguei. Primeiro, porque não sabia e nem conhecia quem era essa tal de “Dora”. Segundo, porque não queria que o interrogatório voltasse, justamente, na hora de saborear o guisado posto à mesa.
Eu não queria. Mas o telefone sim. O danado tocou. Eu dei um pulo para ir atender, mas não fui suficientemente rápido para chegar antes que a minha carametade percorresse os “cem metros” em menos de dois segundos. Nem Usain Bolt conseguiria um “arranque” daqueles. Quando imaginei pegar no telefone, ela já estava dizendo “alô”.
Fiquei olhando a fisionomia dela. De preocupada a irritada foi um pulo só. Só ouvi quando ela disse: “vou passar para ele”.
Quando eu atendi, olhei de soslaio e vi que o ouvido da minha esposa estava colado ao meu e, os dois, ouvindo o que estava se falando do outro lado.
-Senhor Raimundo? Aqui quem fala é “Dora” do empreendimento “Vita” daqui de Natal. Estou ligando, desde cedo, para a sua residência, porque fomos informados que o senhor está pretendendo adquirir um imóvel aqui na capital e nós temos excelentes propostas para lhe oferecer.
-Dona “Dora” – disse-lhe eu (sentindo um alívio enorme, pois a pressão das unhas da minha esposa nas minhas costelas, do lado esquerdo, foi “afrouxando”), por que é que vocês, todas as vezes que ligam para a casa de um cidadão e atende a sua esposa, vocês não são claras e já dizem o que querem?
-Desculpe, senhor Raimundo. É uma norma da empresa só falar com a pessoa para quem ligamos – disse a distinta corretora.
-Tudo bem, senhorita. Mas, por gentileza, pelo menos se identifique. Por um acaso eu estou indo para Natal e, mais ainda, o seu nome é igual ao da minha esposa. Entendeu agora? – cutuquei, eu já todo “ancho”, pois, de “esguelha”, eu vi desaparecer aquela expressão de detetive de final de semana que a minha esposa trazia desde que eu havia entrado em casa. Além do mais, você é mulher e sabe muito bem que, na verdade, quem manda, quem autoriza e determina – se adquirimos alguma coisa ou não – são vocês mesmas. Portanto, nada mais correto do que falar diretamente com quem é de direito dentro da “hierarquia” familiar – completei eu, observando que as minhas palavras fizeram um bem enorme à dona do rolo de massas daqui de casa. E a mim também. Ufa!