Crônicas da nova era V - em que consiste a Nova Era:

Tão decantada pelos místicos que há tempos pressentem e alardeiam sua chegada, a nova era decorre de uma novidade econômica que consiste na possibilidade de produção de todas as necessidades materiais da humanidade com um mínimo de intervenção humana, o que permite a libertação do homem e sua dedicação ao seu próprio crescimento e ao engrandecimento de todas as artes e de toda a cultura.

Liberto da obrigação de labutar se sol a sol para conseguir o pão de cada dia, cada indivíduo poderá cultivar sua própria humanidade, poderá crescer intelectualmente, e participar ativamente de toda a enorme atividade cultural que aumenta a cada dia.

Alguns outros fatos se somam a esta libertação econômica, tomemos o campo da música para ilustrar a força dos novos tempos.

Apenas umas décadas atrás, um indivíduo que quisesse fazer música deveria passar alguns anos estudando pelo menos um instrumento, depois poderia se juntar a um grupo, compor músicas, fazer arranjos, encontrar uma gravadora e lançar seu disco. Havia, é claro, outras possibilidades mais modestas, como compor suas próprias canções e tocá-las para os amigos. Hoje, no entanto, os programas de computador facilitam tremendamente a composição e os arranjos, de modo que um músico, mesmo muito amador e fraquinho, tem a possibilidade de fazer suas próprias canções com auxílio de instrumentos muito mais baratos que os que havia uns anos atrás, pode também gravar suas canções, pedir auxílio de músicos colaboradores distantes, gravar seu próprio CD e disponibilizar a um enorme público o trabalho completo, do início ao fim! Note que isso era impensável, digamos, em 1980. Era inimaginável que alguém pudesse compor, executar a obra, gravá-la em um CD, e divulgá-la pelo mundo inteiro!, coisa que hoje pode ser feita na própria casa de uma maneira muito trivial.

O mesmo acontece com os livros, um autor pode escrevê-los, editá-los, imprimi-los e divulgá-los de sua própria casa, executando sozinho todas as etapas da obra, do início ao fim.

Há também a possibilidade de comunicação imediata, de modo que idéias surgidas em uma parte do mundo podem chegar ao outro extremo no mesmo instante em que são concebidas, facilitando tremendamente o aprendizado e a inovação em todos os campos do conhecimento, o que propicia um enorme desenvolvimento das ciências, da filosofia, e de todas as idéias, permitindo também que um contingente muito maior de pessoas participe da elaboração do conhecimento humano.

Nesse instante de transição entre as eras, é necessário que se ilumine todas essas possibilidades, é importante que se aponte a possibilidade de utilização do tempo livre decorrente da mecanização para o aperfeiçoamento da própria pessoa, o que acarretará decisões mais sábias e maduras possibilitando um crescimento futuro ainda mais seguro.

Uma faceta peculiar na era que vemos findar consiste na busca por etiquetas e marcas que falsamente nos rotulam. Parecemos acreditar que comprando produtos que ostentam um dado símbolo, incorporamos, de algum modo, alguma característica intrínseca daquela marca. Por essa razão, ostentamos marcas alheias no peito, nádegas e pés, da mesma maneira que as vacas, à própria revelia, mostram a marca de seu dono estampada em seu corpo.

A era que se inicia revelará a individualidade das pessoas, que não mais se apresentarão filiadas a uma marca, um símbolo exótico, incompreensível e estranho, mas se apresentarão a partir de suas próprias criações, incluindo aí o seu corpo. Ou seja, não mais se apresentarão como compradoras de determinada marca, mas como construtoras de suas próprias idéias, de seu próprio corpo, de seu próprio mundo. É a era dos criadores, a era da criação. É o tempo da grande inovação coletiva.