Escrever por aí.

Era preciso escrever alguma coisa. Para isso, obviamente, era necessário ligar o computador, computar a dor, a fim de avaliá-la, formatar nos moldes usados e dar vazão ao que vier... Era sempre assim. O Sr. Péricles gostava de sentar no alpendre de sua casa para escrever, ou no banco da praça, como dizia, pois desse modo o mundo passava à sua frente, não precisando “muita imaginação” para o ato de escrever. Sr. Péricles era uma piada, aprontando tanto durante ao longo de seus setenta anos completos, que chegou a essa idade praticamente sem amigos ou parentes que o ature. Um “pé-no-saco”, como dizem por aí, ou um “mala-sem-alça”. Na verdade um incompreendido.

Escrever é um ato de compaixão, de dor, de entrega e desintegração; no papel ou na tela, transforma e ao mesmo tempo transmuda a mente do sujeito que escreve a outro plano: o mundo das coisas.

O termo “mundo das coisas” pode ser empregado com significados diversos: o mundo das coisas animadas ou inanimadas; o mundo das coisas dentro do universo jurídico; o mundo das coisas jogadas no entulho municipal, etc., como também pode ser empregado como o mundo das coisas anímicas de cada sujeito em particular no Planeta.

O Sr. Péricles, para citar um exemplo, gostava de sentar no alpendre de sua casa para escrever, ou no banco da praça, como dizia, pois desse modo o mundo passava à sua frente, não precisando “muita imaginação” para o ato de escrever, para buscá-lo; bastava jogar a linha e esperar uma idéia fisgar... . Sr. Péricles era uma piada, aprontando tanto durante ao longo de seus setenta anos completos, que chegou a essa idade praticamente sem amigos ou parentes que o ature. Um “pé-no-saco”, como dizem por aí, ou um “mala-sem-alça”. Na verdade um incompreendido.

Muitas pessoas nascem com predisposição à escrita, às letras, com imaginação fértil; outros adquirem com a vivência, o meio externo incentivador, por aí vai, mas é certo que o gosto por escrever está na verdade além da compreensão humana. Não só a escrita, mas os meios com os quais o homem tentou, no decorrer de seu tempo, transmitir suas idéias, pensamentos, sonhos, fatos do cotidiano, pedidos, profecias, etc.

O sentimentos vão ali, na medida da sensibilidade de transmissão, expressos em diversas manifestações nos campos artísticos.

Um dia Sr. Péricles fugiu para o mundo com um bando de hippies loucos. Ficou alguns anos vagando de cidade em cidade, sonhando com um mundo diferente, cantando e tentando sempre escrever alguma coisa. Vivia falando de sua vida numa rede amarrada entro um pé de jatobá e o trailer, o pôr-do-sol, o chimarrão e, dentro de sua imaginação, sonhando, sonhando, sonhando...

Até que num certo dia Sr. Péricles resolveu deixar de ser hippie e deixar a trupe. Seguiu de volta a sua terra de origem, que dizia amar por ser sua terra de origem, e de fato escreveu um livro de causos do cotidiano, o qual não lhe devolveu a credibilidade. Seu problema era a ranzinzisse.

Outro dia Sr. Péricles foi visto na rodoviária, com mala é cuia, e, perguntado sobre onde ia, disse:

“Vou escrever por aí...”

Savok Onaitsirk, 30.06.10.

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 02/11/2010
Código do texto: T2592221
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