A poesia de simplicidade

Quem não aprendeu que poesia é rima e métrica, levante o dedo que ganha 5 centavos, mas tem que provar! Os primeiros passos foram esses: poesia é rima e métrica. Talvez por isso o limbo das letras mal feitas tenha sido o destino da maioria dos poemas. Valia quase tudo, desde que rimasse, e as palavras saíam pobres, forçadas, sem a fluidez que se espera quando se lê um poema. A forma se sobrepunha ao conteúdo e pronto.

O conteúdo também sofria, pois poemas tinham que verter ou sangue ou mel ou lágrimas ou desgraça ou conversão ou amor eterno.

Isso se aprendia até descobrir um outro universo da poesia: o mistério do cotidiano, a beleza do som, o encanto do ritmo, a palavra lapidada, a dureza da precisão, a magia da descoberta. Com isso, a rima e a métrica se transformaram em instrumentos a favor da beleza, truques de melodia, e deixaram de ser leis opressoras.

Há uma tendência entre os poetas mais modernos – especialmente os que começam – e não me declaro isento disso, de privilegiar tanto a palavra e o próprio som dela que o conteúdo fica impenetrável. Sempre chega o dia da grande lição, e comigo ele durou três meses; três meses em que entrevistei 52 pessoas para o livro “Pequenas histórias de São Bento”.

Quanta poesia havia naqueles depoimentos, sem que os entrevistados o soubessem! Falavam de brincadeiras, travessuras, trabalho, tempos difíceis e realizações; falavam de risos e de gratidão e havia um poema em cada frase, em cada a face radiante pela lembrança de sua trajetória.

A obsessão do artista em aprender sua arte, a satisfação da costureira em deixar as clientes contentes, o sorriso do empresário ao olhar para trás e sentir-se realizado e para frente e sentir-se desafiado, o entusiasmo do pesquisador, a bem-aventurança de quem foi criança em tempos de carestia, a florista e suas protegidas, os livros amigos e seus mistérios, o choro de milhares de crianças trazidos à luz por duas mãos abençoadas, a música na vida de tanta gente. Histórias semeadas de poesia. Sem preocupação em obedecer normas, apenas de seguir a vida - esse poema em nossas mãos, que a simplicidade consegue escrever de maneira sublime.