SOFRER



Para alguns a piedade deve ser uma espécie de paixão viciosa, como creio ser para os estoicos.
 
Impõem-se-nos que devemos socorrer os aflitos, os que sofrem, mas não querem que soframos com eles, que não fraquejemos. Deve ser algum tipo de caridade fria. Ajudo, porém não me envolvo.
 
Como? Não sou super-homem!
 
Como ver, ou conviver com um só ser humano que sofra, que padeça do abandono social e nada sentir?
 
Sendo máquina? Prefiro ser gente!
 
Mas sou humano. Olho o mundo com meus olhos, racionalizo com minha mente, porém enxergo este mesmo mundo não só com meu viver, mas com o viver dos demais.
 
Se até pelos animais sou parceiro de seus sofrimentos, como ser ausente de sentir e de dividir com meus irmãos o sofrimento destes?
 
Aqueles que me pregam uma total independência com o sofrimento alheio, me parecem mais com psicopatas caridosos, ajudam mas são insensíveis para sentirem o sofrimento alheio. São estes mesmos que acabam ajudando apenas, a maioria das vezes, com sobras: Sobras de tempo, sobras de recursos, coisas que já perderam utilidade ou estão velhas.
 
Agora, aqueles que são capazes de sentir e vibrar em dor com todo o sofrimento alheio, são os que se entregam, se empenham e se doam de verdade na ajuda.
 
Não me refiro a vibrar em tristeza, ou em pena, já que no caso da primeira concordando com os estoicos, não me parece razoável de sentir. Quanto a segunda, a pena, não me parece justo ter pena de ninguém, mas sim vibrar sentindo a mesma dor do sofrimento alheio, buscando a verdadeira revolta para lutar contra aquele estado de dor.
 
Apesar de concordar com os estoicos a respeito da tristeza, sendo humano, me é impossível assumir que nunca à sentirei. Dependendo do fato, a tristeza pode ser tanta que domine todo o meu ser, minha mente e minha alma. A dor pode ser tanta que bloqueie por algum tempo, o pensar e o sentir, inclusive impedindo a liberdade de minhas ações, pondo-se ao largo da vontade e do desejo.
 
Me perdoem os estoicos se estou errado, mas se devesse estar alheio ao sofrimento para ajudar, preferiria sofrer com eles, para ai sim ajudá-los de corpo e alma.
 
Com minha pouca experiencia, vejo no homem um ser complexo demais. Somos espantosamente variados, e para piorar somos espantosamente inconstantes.
 
É praticamente impossível tecer uma avaliação única e muito menos uniforme sobre este bicho homem.
 

Arlindo Tavares
Enviado por Arlindo Tavares em 09/11/2010
Código do texto: T2604963
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