Dissertando sobre o Não-dito

Coloquei-me certa vez a pensar nas tantas coisas engolidas, empurradas garganta a baixo que, por algum motivo de força maior não são debulhadas.

Diariamente engolimos sapos homéricos que indigestamente nos ataca as paredes estomacais.

Tantas coisas lindas ou não que ficam entaladas na traquéia e que para viver harmoniosamente na mentira mastiga-se melhor e engole-se.

Como diria Cazuza, somos canibais de nós mesmo, uma vez que nos dispomos a anular-nos na condição de falantes pelos cotovelos. Se Fulano fala demais com certeza não seria ele a sofrer de gastrite nervosa.

Fica então o dito pelo não-dito. Trezentas e cinqüenta e oito frases diárias são mastigadas, engolidas e não digertidas, apenas caladas, emudecidas e veladas pela vontade de abrir a boca e vomita-las.

Sendo assim, concluo que a vontade de falar fica só na vontade todos os dias. A vontade de olhar nos olhos e explicitar felicidade ou ódio guardamos na garganta para mais tarde se confundir com o suco gástrico. E enquanto isso, esfriamos os sentimentos calando a própria voz, confundimos as dores de estomago crônicas com as dores no peito por não ter falado.

Implorando para ser ouvida a voz de dentro nos expressando com os olhos quando fosse cabível uma única palavra, vamos esfriando mais e mais o coração que agora cabe entre os dedos.

Natalia Gregolin
Enviado por Natalia Gregolin em 13/10/2006
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