CAUSA MORTIS: OXITOCINA DE AMOR...! (ROMANCE) final

Proclamo que nesse mundo não há coisa mais necessária que um homem amar uma mulher. E ser amado na mesma intensidade por esta mesma mulher.

Em minhas leituras, aprendi que a Igreja no início da Idade Média, depois do longo período das catacumbas e das perseguições que povoaram de mártires o céu, também estava implantando a pena de morte através das perseguições feitas durante as Cruzadas, depois da chamada era de “caça as bruxas” e, por último, da era das “fogueiras” dos hereges. Até um padre chegou a ser queimado na fogueira! Só não vi minha Suzy sendo colocada na fogueira! Ela não era bruxa, mas tinha enfeitiçado meu coração, com seu amor!

Essas minhas divagações não faziam esquecer de Suzy, minha doce Suzy! Eram delírios, apenas.

Cada vez mais estava ligado a ela e ela a mim, embora não vivesse mais ao meu lado. Só em minhas lembranças. Se aparecia alguém que estivesse estado ao seu lado, olhando-o em seus olhos, esse alguém era digno de meu respeito. Depois que ela casou, me internei mais duas vezes; as duas por depressão, diagnosticadas erradamente pelos médicos como “distúrbios mentais”. Só obtinha notícias sobre a vida de Suzy, através de informações de terceiros. Desejava tê-la ao meu lado naqueles dois momentos terríveis e angustiantes para mim!

Ah, como é triste viver sem o calor, sem o beijo e o amor de Suzy!

Por que as coisas têm que ser assim, e o que faz a felicidade do homem se transformar em sua própria desgraça...?

Havia me transformando em um farrapo humano. Deixei os cabelos crescerem. A barba também. Não me vestia direito, não comia, não dormia...só pensava nos carinhos da minha amada, do nosso amor que havia se tornado impossível!

A plena e cálida sensibilidade do meu coração, tinha-me transformado em um trapo inútil, descartável, sem vida, sem razão de viver!

Hoje fui visitar uma amiga querida que de há muito não possuía qualquer notícia. Estava caindo uma chuva na ocasião. Ela desceu e abraçou-me de forma tão forte e terna que me causou uma forte emoção. Chovia no momento como chovia nas vezes que encontrava a minha amada, sempre de forma furtiva. Ah, minha doce amada! Onde estarás e como estarás? Preciso de uma notícia tua!

Minha amiga falou-me de sua doença. Tinha tirado todo o útero. Tinha um câncer, em comum o crescimento desordenado de céculas que invadem tecidos e órgãos, podendo espalhar-se para outras regiões do corpo. Felizmente, foi diagnosticado antes. Nada disso lhe aconteceu. Ficou só no útero mesmo.

Já era casada essa minha amiga; não teria mais filhos! Que pena!

Maldito câncer que esterilizou completamente a amiga! Maldito câncer!

Será que este não era o problema de que sofria minha amada quando ela disse-me: “não posso mais ter filhos!” Não tive coragem de perguntar à Suzy. Ficaria mudo na frente dela, com medo da resposta. Também não tive qualquer ação ou reação frente a minha amiga. Só lamentei!

Contou-me que havia perdido recente um sobrinho, em acidente de carro. Maldito seja motorista que ceifou a vida de uma criança. Ela poderia ter um grande futuro. Mas agora, como sabê-lo? Nunca saberemos.

Compreendo agora porque a Igreja é sempre contra as pesquisas com “célula tronco” de cordão umbilical. Ela é contra uma vida digna. Uma vida que cure o amor da alma; contra descoberta de um remédio que possa cura-me dessa paixão que ainda sinto por Suzy! Não. Não há e nem haverá remédio para inibir a paixão do coração.

Que maldita doença é essa que deixou minha amiga sem condições de ter filhos?

Eu tive diagnóstico de câncer também. Era leiomiossarcoma de alto grau! O diagnóstico veio de um laboratório especializado em patologia. Excelência em diagnóstico, como informava a parte superior do papel timbrado da clínica.

E era verdadeiro, mas não o aceitei de início e busquei tratamento em outro Estado.

Tinha mandado fazer uma biópsia em tecido que foi removido em uma das várias internações que vinha sendo submetido. Junto ao diagnóstico de câncer, acompanhavam três fotos mostrando a doença com a expressão “desmina e actina de músculo liso”. Coisa que não sei o que é.

Na despedida, o abraço que a amiga me deu foi muito forte! Parecia que estava adivinhando meu sofrimento de amor interior e queria transferir para ela o que estava sentindo naquele momento. Se tentou fazê-lo, não conseguiu. Porque minha dor de amor era só minha, doía por dentro, não era aparente.

Lembrei-me das muitas vezes que visitávamos eu e minha amada, o cais do porto da cidade. Ela era representante de um município, cujo prefeito da cidade era um parente seu. Já falei disso. Sempre fazia o envio de encomendas, malotes e outros assuntos de interesse municipal. Não sei o que aconteceu com a pessoa que ela representava, mas acho que abandonou a política.

Depois da visita à amiga, voltei para casa. Entrei. Fiquei admirando meus vários quadros graciosamente colocados na parede: V...Pereira; F.... Stefani; M... Andrade; Moema A...; M... Borges; Palheta, pelo qual fui presenteado com uma caricatura.

Nada, contudo, fazia-me esquecer da minha amada Suzy!

Na inquieta solidão de quem ama, em vão estendo os braços para acariciá-la a meu lado. Despertei do sonho terrível e julguei que ela estivesse sentada na relva verde do pasto, e eu a cobrindo de beijos. Acordei. Ah, quando ainda meio tonto do sono que se fazia profundo, despertei para a realidade. Ela não estava ao meu lado. Minha amada não me pertencia mais. Mas a outra pessoa, sim. Será que ela deitava-se na cama dele como o fizera várias vezes na minha? Acho que não, mas não tenho certeza.

Ah, meus leitores, são tantas as perguntas. As dúvidas, as incertezas nesta vida que me transformaram em um fraco e maltrapilho ser, vagando pelo mundo das ilusões a perseguir o inatingível: o amor pleno, o amor verdadeiro!

Minhas forças ativas se degringolaram em inquieta solidão. Não posso estar ocioso.

Novamente comecei a ler tudo o que aparecia na minha frente, mas em tudo que eu estava fazendo, parava um instante e pensava em minha amada. Não tinha nenhuma idéia de como iniciar as leituras que tentava iniciar. Quero ler os livros que o poeta que esteve em meu aniversário citou, mas não consigo fazê-lo. Essa paixão está me consumindo inteiramente.

Muitas vezes invejo a capacidade do Alberto, amigo de muitos anos. Ele sempre convida para almoçar peixe fresco na casa dele. E a esposa prepara um peixe cozido como ninguém! Toma sua cerveja – muitas por sinal, declama alguns poemas que produz, fazendo sempre trocadilho com as palavras e pergunta-me muito sobre temas literários e sempre interessantes.

Contudo, nada fazia esquecer-me de Suzy, minha grande paixão!

Eram sábados deliciosos àqueles. Mas nada, nada mesmo, fazia esquecer de minha amada Suzy. Era uma paixão louca! Arrebatadora! Fulminante! Terrível de aguentar! Todas as manhãs ainda estendo os meus braços procurando-a, deitada em minha cama. Mas ele não está mais ao meu lado. É inútil a procura.

O amigo Alberto, diz ainda que vai publicar um livro, “Injustiça da Justiça!”- informa o nome da futura obra. Diz que não concorda com o capitalismo e sempre afirma que Jesus foi um dos primeiros comunistas da história. Explica o porquê: - “Jesus deixou seu pai carpinteiro e foi combater César, o Grande Imperador de Roma.

- Só acredito em Deus! – diz sempre ele – Não acredito em Igreja! Só em Deus!

Uma vez, entre suas muitas divagações, perguntou a mim se eu sabia qual era o setor da economia que mais havia gerado emprego. Respondi que não sabia. “O da segurança!” – respondeu-me ele, no ar de sua sabedoria! É verdade! Concordei com ele de imediato.

Em uma de minhas visitas a casa de Alberto, contou-me que o professor muito intelectualizado, perguntou aos alunos:

- Quem conhece Machado de Assis? Alguns alunos teriam levantado suas mãos. O professor batera palmas e dissera: “Muito bem!!!!”

- Dos que levantaram as mãos, quem leu qualquer obra de Machado de Assis? –insistiu o mestre.

Ninguém ergueu as mãos e o professor voltou a bater palmas e dizer novamente: “Parabéns....! De forma irônica, dessa vez! O professor havia comprovado que existe muita “cultura axilar” em salas de aula!

Era muito divertido estar com Alberto aos finais de semana!

Lembrei-me de uma fábula em que o cavalo, cansado. muito cansado mesmo da liberdade em que vivia, deixou-se colocar uma cela e condenou-se a desonra de ser montado. Era assim que eu estava me sentindo. Eu dei muita liberdade à Suzy e sofri a desonra de vê-la casada com outro.

Assim eu me sentia naquela manhã fria, chuvosa, quando debrucei na janela do meu apartamento olhando para uma grande varanda vazia e uns quadros pendurados pelo lado de fora, pequenos! Só o vento que soprava lembrava-me dela. Ah, doce amor! Doce paixão! Por que tu não és arrancada de dentro do meu peito e jogada às traças?!

Era inútil minha luta contra as lembranças de Suzy e dos momentos felizes que passamos juntos.

Não sei o que devo fazer para extirpar de meu coração essas amáveis lembranças de Suzy.

Inebriado com as lembranças de Suzy, caminhei pela rua da cidade, absorto. Não pensava em nada; só havia em mim um turbilhão de indagações que deveria fazer a minha Suzy: por que ela me deixou? Por que se casou com uma pessoa que ele nem sabia se amava? Por que ela deixou para trás todas as coisas boas que fazíamos? Por que ela não mais recebeu minhas rosas roubadas dentro dos cemitérios da cidade?

Aprendi que o saber gera o poder. Isso é fato por demais comprovado ao longo da história, como é fato que ela se tinha ido embora sem dizer uma palavra, exceto enviar-me pelo correio um convite para o seu casamento. Aquele convite me causou duas certezas: uma de que ela poderia ser feliz; outra, a de minha total infelicidade!

Para o meu mal de amor jamais haverá remédio, nunca! Por mais que a medicina se desenvolva. Ah, como dói meu coração!

Se pudesse, mudaria meu destino ingrato!

Ah, solidão que me apavora!

À noite, a dor que rasgava meu peito era terrível! Estava ficando louco. Só em pensar ela chegando à casa e sendo possuída por outro como eu tantas vezes o fizera no passado, matava-me por dentro. Era um morto vivo! Já estava morto! Irritava-me ao saber que outro beijaria sua boca linda que tantas vezes eu também a beijara. Era melhor esquecê-la, caso contrário morreria mais rápido.

Por que a vida não me deu a oportunidade de nascer aos 90 anos, casar aos 40 e viver meu grande amor em uma idade madura? Mas, não! Decidiu fazer-me nascer como uma “folha em branco”, sem nada pensar. Ah, como era doloroso para eu esquecê-la! Mas tinha que fazê-lo.

A dor que eu sentia dentro do peito, dentro da alma, era maior que a força que me restava para resistir ao casamento de Suzy.

Mais uma vez procurei um meio para por um fim a minha vida. Mas não achei nada que pudesse aliviar a minha alma.

Só em pensar Suzy deitada na cama com outro, abrindo suas pernas para receber o amor de outro, como eu tantas vezes fizera, me irritava. Ah, Suzy! Ah, Suzy! Não consigo dormir!

Era chamado de “o solitário”. Era com esse nome que escrevia em todos meus poemas de amor de juventude. Deveria ter continuado usando esse nome. Mas, não. Quis ser alguém. Perdi minha paixão!

Louco? Talvez estivesse louco, louco de amor! Desgraçado eu sou e estou desgraçando minha vida sem objetivo, pois atualmente só tenho um: voltar aos braços de minha amada!

Era sim. Eu era um louco, solitário e apaixonado.

Nada de bom acontecia. Todos os meus pensamentos eram voltados para Suzy. Estava ficando louco mesmo. Minha obsessão por Suzy era tanta que...

...Decidi viajar. Andei por outros Estados para tentar esquecê-la. Foi inútil minha fuga.

Voltei. Sangrei pela boca novamente. Mais um diagnóstico: câncer no intestino.

Um novo emprego talvez fosse à solução para o mal de amor que eu vivia. Comecei em mais um trabalho. Criava cartas para um programa de rádio. Mas como? Se todas as cartas eram de amor, dirigidas à Suzy? Fui demitido de novo.

Busquei na bebida um motivo para esquecê-la. Logo na entrada, uma placa. “Se bebes para esquecer; pague antes de beber!” Saí do bar. Fui buscar na religião uma cura para a minha alma. “Irmãos, amai-vos uns aos outros como Deus vos amou”. Também desisti. Era impossível esquecê-la desse modo.

Decidi pintar! Era uma coisa que sempre tinha desejado fazer na juventude, mas sempre adiava. O primeiro rosto que pintei foi o de Suzy. Desisti também.

Caminhei sem rumo pelas ruas. Ouvi uma música. “Sentei no banco da praça, só para esquecer...” Não deu certo.

Hoje é novamente dia do meu aniversário. Convidarei muitas pessoas. Receberei muitos presentes. Não quero receber flores. Mas o primeiro que recebi, foi um buquê de rosas. Mas não havia sido enviado por Suzy. Voltei a lembrar de Suzy e das rosas roubadas em cemitérios que lhes eram entregues como prova de amor quando eu não conseguia comprá-las. Mas eram raras essas vezes.

Uma música orquestrada começou a ser tocada. Lembrei-me novamente de Suzy. Outra música, agora, Sertaneja. Também voltei a lembrar-me de Suzy. Não haveria um só momento em que as lembranças de Suzy não me viessem à mente. Não tenho mais outro culto que não seja ela...até quando não quero pensar; penso...e isso me dá horas de felicidade...até que de novo sou forçado a fugir de tais pensamentos...!

Hoje, as flores da vida não passam de fantasias...Quantas morreram sem deixar vestígios? Quantas pereceram sem dar frutos...? O que me espera dessa paixão...frenética e infinita? Esses poucos instantes de lembranças de Suzy causam-me felicidade, até que sou forçado a fugir delas...O que meu coração quer afinal, se não a terei mais?

Onde reside a felicidade sem o amor? Não existe felicidade sem amor. Eu respondo. E quando a melancolia novamente me invade a alma, eis que recebo um telefonema. Era ela!

“Alô!”. Eu respondo: “alô”!

No dia do meu aniversário, sempre costumávamos cantar “Parabéns a você!” ao telefone. Nesse dia, exatamente no telefonema dela, no dia do meu aniversário, nada aconteceu. Não escutei mais que uma voz fraca dizendo apenas “alô” e desligando em seguida.

Teria eu feito muitas perguntas para Suzy: “como está indo seu casamento? Como você está...?” Eram muitas as perguntas, mas ouvi o marido perguntando ao fundo: “você está telefonando para quem?”

A voz dele privou-me de todas as perguntas que desejava fazer à Suzy! Mas valeu assim mesmo. Foi um telefonema breve que me remeteu ao nosso passado de amor intenso. Adorei ter-se lembrado de mim, no dia do meu aniversário!

Estava ficando louco. Eu a enxergava em qualquer outra pessoa na rua. Não me enganaria a mim próprio.

Entrei em um Teatro. “Romeu e Julieta”. Quer prova de amor melhor do que essa peça?

Fui a um cinema. “Love Story”. Em outro, “Dio comi ti amo”. Impossível!

Desse modo era impossível tirá-la do meu pensamento, extirpá-la de minha vida.

Dentro de canoa, embaixo de uma ponte de madeira, na rede. Estava amando minha amada Suzy, de novo. Em delírio. Era um amor gostoso, intenso, frenético, meio às pressas... Acordei com o barulho do carrinho de café no corredor do Hospital, no qual novamente havia me internado. Ah, minha amada Suzy, quantas lembranças agradáveis do passado ainda guardo de ti...!

O café da manhã era pontual. O almoço também. Lembram que falei que havia recebido diagnóstico de câncer? Fui confirmar ou desmentir o diagnóstico. Fiquei primeiramente na ala destinado aos doentes de oncologia.

Durante 17 dias, aguardei o resultado das lâminas. Havia dado positivo. Não fiquei deprimido. Nem abalado. Apenas preocupado, pois sabia tratar-se de uma doença sem cura. Eu já estava morto mesmo, por que preocupar-me com o diagnóstico. E o médico manteve-me no setor oncológico.

Exames e mais exames foram feitos e refeitos. Acho que os médicos queriam identificar em meus exames, onde que se manifestaria esse amor doentio, dentro do meu cérebro. Seria inútil, por certo. O amor não está no cérebro, mas no coração. Dizem os médicos que tudo era uma manifestação do cérebro, o coração só absorvia os estímulos cerebrais. No meu caso era diferente!

Estava morrendo, sabia disso, mas meu amor por Suzy morreria junto. Ficaria dentro do meu cérebro. Quem sabe nos encontaríamos em outro mundo.

O amor estava todo dentro do meu coração. Depois chegava ao cérebro. Tenho certez.! Não fosse isso, não poderia ser ao contrário?

Não havia mais veias em meus braços. Tomei remédios até no dorso superior do meu pé. Doeu muito! Minhas veias estavam todas inchadas!

No setor oncológico, onde estava quando fui despertado do meu sonho com a Suzy, conheci um casal – ela de origem alemã e ele psicólogo brasileiro. Já tinham mais de 80 anos meu companheiro de quarto e sua esposa. Havia momentos em que duvidava de todas as suas faculdades mentais.

Um dia, acordou e perguntou-me se já tinha tomado café na varanda da casa em que morava, olhando para a lagoa?

Lógico que não! Ele devia ter sonhado naquela noite!

Falava de sua casa à margem da lagoa. E como falava. Maurício era o seu nome. E Petra, a alemã, era o nome de sua esposa.

O senhor Maurício adorava ouvir as histórias de vida que lhe contava sobre minha experiência em vencer. Só não estava conseguindo vencer minha doença de amor por Suzy. Essa estava me matando por dentro e por fora.

Continuava aguardando o resultado dos seus exames. Todos os seus familiares visitavam-no Ele tinha um ex-genro que era médico. O ex-genro, também o visitava. E falava do tratamento a que se submeteria, explicava tudo para os familiares. Dizia que o câncer estava na medula! Seu Maurício não andava. Tinha que usar cadeira de rodas para tudo. E a esposa, sempre ao seu lado.

Mas nada me fazia esquecer da paixão que sentia por Suzy. Nem meu câncer já confirmado.

Acho que até já faleceu, o seu Maurício. Nunca mais tivera notícias sobre dele, embora tivesse ficado mais duas vezes internado mesmo hospital. Mas em outro leito e com outras pessoas que tinham câncer, como eu.

Mais uma vez esse maldito câncer levara uma pessoa boníssima. De onde vem essa doença? Como ela surge?

Aprendi que as células de câncer se dividem rapidamente e tendem a ser muito agressivas. Estudei muito sobre essa doença. Folheava revistas para saber tudo a respeito do mal que estava me matando. Aprendi que outras características que diferenciam os diversos tipos de câncer entre si, são a velocidade de multiplicação das células e a capacidade de invadir tecidos e órgãos vizinhos ou distantes, quando se forma a chamada “metástase”. Era a minha doença!

Tabagismo, hábitos alimentares, alcoolismo, hábitos sexuais, medicamentos, fatores ocupacionais e radiação solar podem ocasionar o câncer.

Será que tinha adquirido câncer durante o período em que, separado de Suzy e sem as esperança de tê-la de volta, me transformei em um quase animal, só querendo sexo? Acho que foi isso. Nunca fumei, sempre tive hábitos alimentares sadios, bebia socialmente, havia tomado poucos medicamentos, não recebia radiação solar e os fatores ocupacionais meus eram todos acompanhados.

Também não havia na família fatores hereditários – são raros os casos de câncer exclusivamente por fatores hereditários, familiares ou étnicos, apesar de o fator genético exercer um importante papel na oncogênese. Só em indivíduos portadores de retinoblastoma é que, em 10% dos casos, apresentam história familiar deste tumor. Também não era meu caso!

Durante todo meu tratamento, tivera informações de que as células são formadas por três partes: a membrana celular, o citoplasma e o núcleo. Todos são componentes de genes, arquivos vivos que guardam e fornecem instruções para a organização das estruturas, formas e atividades das células no organismo.

No hospital, pensando sobre essa terrível doença, voltei ao meu passado, à adolescência, à puberdade...Tivera sido uma época feliz! Não se ouvia falar nessas doenças – câncer, AIDS. Falava-se muito em gonorréia, cancro, sífilis. Essas doenças! Uma garapa de cana, comprada em qualquer carrinho de vendedores de rua, respondia com exatidão se a pessoa estava com gonorréia ou não; antes mesmo de qualquer manifestação da doença.

Sem qualquer preocupação com a vida, vivíamos jogando bola pela rua, empinando papagaios de papel, tomando banho nos igarapés ou nas cacimbas. Era uma vida feliz e despreocupada! Por que hoje teríamos que nos preocupar com essa terrível doença? E a certeza que eu estava morrendo e que perderia para sempre minha Suzy.

Lembrei-me de uma farmácia do “Dr. Menescal”. Era onde procurávamos tratamento para nossas poucas doenças. Ele aplicava uma injeção de penicilina e nos mandava para casa. Doía muito; mas tínhamos que agüentar a picada!

Ou quando tomávamos caldo de cana para ver se na noite anterior não havíamos contraído “doença venérea”. O caldo de cana era um santo remédio para isso!

Recordei de uma vez que eu e seis amigos procuramos uma feira que existia na cidade, chamada de “Feira das Frutas”. Devido à quantidade de meretrizes que se reuniam no local e da grande quantidade de motéis que existiam nas redondezas.

Lá, encontramos uma meretriz que disse chamar-se “Raimundinha” e aceitou sair com todos, condicionou que entraria um por vez.

Aceita negociação, rumamos para um motel. Foi o primeiro; o segundo e, no terceiro, entramos todos de uma vez. Assustada, “Raimundinha” perguntou:

- Vocês querem me currar, é isso?

Não queríamos fazer nada com a meretriz, só saber por que o último colega que havia entrado no quarto, estava demorando tanto...

Mas nem essas lembranças de um passado alegre e gostoso me faziam esquecer de minha Suzy!

Em meio a essas lembranças, sei o porquê, mas recordei de um amigo dessa época. Eu, ele e outros vencemos a pobreza, o preconceito e ganhamos um prêmio também para nossa escola. Não havia câncer. A diretora da Escola, Alexandra, brigava por tudo, e nos colocava de castigo sempre que fazíamos alguma coisa ruim dentro da escola. Mas, para nós e para a escola onde estudamos, ganhamos o prêmio e fomos recebidos como heróis. Passamos a ser citados como o exemplo da turma! Vencemos e brilhamos, eu e meu amigo!

Em minhas divagações, relembrei de dois irmãos que estudaram em nossa sala. A família deles possuía um pouco mais de posses e nós os convidávamos para participar em nossos trabalhos de aula.

Um outro amigo que nunca tinha pisado em um cinema foi convidado para ir a um deles.

Entrou, sentou e ficou olhando aquela tela imensa!

Cadê o controle para eu ligar essa televisão imensa – pediu ele. Era a tela do cinema que queria ligar. Rimos, colocando a mão sobre a boca para ele não ouvir!

Só que a Suzy não me saia da cabeça, nunca!

Estava em um quarto com muitos pacientes de oncologia, uns no início da doença e outros em fase terminal.

De novo essa maldita doença!

Mas eu preciso contar o que aconteceu. Um dia um paciente que estava usando uma bolsa para defecar. Ela estourou durante a madrugada. Logo cedo, o enfermeiro entrou no quarto e retirou todos os pacientes, para a desinfecção. Fomos removidos para um quarto ao lado, provisório; depois de desinfetado, voltamos ao quarto antigo e o paciente que tivera sua bolsa de excrementos estourada, pediu mil desculpas para os outros internos.

Eu estava dormindo ou sonhando? Não vi e nem senti nada. Estava de fato sonhando com a amada Suzy em meus braços, totalmente nua. Deitada a meu lado. Ela já estava casada!

Mais nada era maior que a pena e a dor que eu sentia no peito desde o dia que a Suzy decidiu-se pelo casamento. Ah, dor danada! Ah, dor incurável! Acho que não terei remédio em toda a medicina para curar o sofrimento por perdê-la.

Depois de idas e vindas aos médicos, voltei para minha cidade só para preparar meu Imposto de Renda.

Imposto de Renda! Deveria ser Imposto sobre Trabalho, e não renda. Renda, é o resultado ao trabalho e das economias feitas.

Tenho amigos na Receita Federal e tentaram convencer-me – sem sucesso, que a forma de cobrança está correta. Pode ser correta, mas é injusta uma pessoa passar quatro meses de sua vida trabalhando para pagar impostos

Um amigo encaminhou-me uma carta comparando o valor do imposto que se paga no Brasil e o valor do imposto que se paga nos Estados Unidos. Havia uma pergunta: “Quem é mais rico?”

Depois da leitura de toda a carta, concluí que o Brasil era mais rico que os Estados Unidos. Tudo aqui no Brasil, começando pelo Imposto de Renda, que é de 27,5% sobre o salário. E depois, os demais impostos, vêem em cascata!

Depois de entregar a declaração do meu Imposto, voltei para continuar o tratamento. Os médicos insistiam em pedir tomografias e mais tomografias. Mas já disse que não haveria remédio em toda a medicina para curar o meu mal de amor. Mesmo com minha terrível e terminal doença, não conseguia esquecer-me de Suzy.

Fiquei hospedado no apartamento de um amigo. Tinha-o conhecido através de uma irmã que faz tratamentos seguidos nos hospitais fora da cidade. Ele morava só. De vez em quando aparecia um filho ou filha em seu apartamento. Não estranharam minha presença porque o amigo da minha irmã sempre acolhia pessoas em seu apartamento. Já era comum, então.

Ao final de mais um tratamento sem cura definitiva para minha doença de amor, recebi alta ambulatorial e fomos eu e meu amigo, visitar uma exposição de arte em uma praça. Muitas coisas encontramos na exposição.

Decidi retornar, em cadeira de rodas, tal era a fragilidade de meu estado de saúde.

Mais uma vez, acabei de chegar da residência do Alberto. Ele, leitor de Karl Marx, é crítico da sociedade capitalista. Em parte, concordo com ele. Na sua essência, qual seria a fórmula correta de economia? O comunismo ruiu em toda a Europa e nenhum outro modelo econômico foi apresentado até hoje.

Certa vez, um revolucionário latino-americano que percorreu toda a América Latina de motocicleta com um amigo, sustentava que o socialismo não era um regime de sociedade beneficente.

Dizia o revolucionário nascido na Argentina e famoso em outro pais, que o socialismo era um regime que havia chegado historicamente para ficar, e sua base estava na socialização dos bens fundamentais de produção e distribuição equitativa de todos os bens da sociedade.

Como hoje só existe um pais que resiste com essa ideologia, resta-nos, então, a certeza de viver com o capitalismo. Ou o evolucionismo!

Dizia para ele que a teoria de Charles Darwin, “Evolução dos seres, das espécies e das coisas” talvez fosse à única capaz de explicar tudo o que acontece nos dias de hoje: as questões sociais, as incorporações, as fusões, as compras de empresas menores pelas maiores. Tudo para aumentar o mercado!

Mas poderia explicar a evolução da sociedade, pelo menos!

Falei de “questões sociais” porque a maioria dos eventos ocorridos no país desde a implantação da República até os dias de hoje foram transformados em movimentos revolucionários. Não foram vistos com o olhar de questões sociais. As questões sociais surgiram na Inglaterra, durante o processo de industrialização e continuam até os dias de hoje.

Os mais fortes sempre fazendo fusão com os mais fracos. Essa verdade está na natureza, na economia, nas questões sociais. Exatamente como Darwin definiu na teoria da evolução dos seres, das espécies e das coisas.

Será que essa teoria serviria para definir o amor que sentia por Suzy, depois de tantos anos sem vê-la? Acho que não! Nada, porém, Darwin escrevera sobre a evolução do amor.

Lembro-me, também, de uns dizeres num quadro na casa de Alberto, em que constava uma frase de autoria de Leon de Tostsky, intelectual e revolucionário russo assassinado por um agente soviético em sua residência, em 1940, na cidade mexicana de Cayoacám, cujo teor diz que a paixão entrou como convidada; depois virou amante e agora é proprietária! É isso mesmo! A paixão que se apoderou de mim já virou proprietária de meu corpo e de minha alma. É inútil a resistência. Não há como lutar!

Alberto depois que declamava suas poesias, sempre dizia que se casou com uma mulher que em princípio a via como uma princesa, depois teria virado uma floresta e agora era um pântano. Coitada da mulher! Ela ouvia e ria muito. Mas ele dizia isso só da boca para fora. Na verdade, era e sempre foi apaixonado pela esposa, como eu também sou por minha Suzy. Ah, doce Suzy!

Um dia, um convidado de uma amiga entrou na piscina como um gay e saiu como um garanhão! Alberto pegou a espingarda. Correu atrás dele. Era ciúmes que da esposa Andréia. Alberto não é de atirar em uma mosca, quanto mais em um homem.

Estamos evoluindo para a exclusão dos nossos recursos naturais e caminhando rápido para a Idade Média, quando as famílias ricas ficavam encasteladas e os vassalos ficavam à volta esperando receber refeições ou roubando-as para comê-las. Hoje, estamos vivendo o mesmo processo de desenvolvimento. Seguindo rápido rumo à Idade Média.

E dizem que isso é desenvolvimento! No máximo é uma evolução às avessas!

Doente, Darwin pediu a um amigo para defender a tese que escrevera. Outro pesquisador estaria escrevendo outra tese sobre o mesmo assunto. A Igreja Católica, tentando desmoralizar a teoria de Darwin, teria informado que o homem teria evoluído de seu ancestral, o macaco.

Darwin nunca afirmara isso! Ele apenas supôs que essa era a origem evolutiva do homem. Mas nem isso – a evolução do homem a partir do macaco - serviria para explicar o amor doentio que ainda sentia por Suzy!

É por Suzy que ainda estou vivo, respiro e resisto! Ah, amor louco, amor pouco!

Tenho que tomar uma decisão na minha vida, mas não sabia qual, a que deveria tomar, e nem sei se a decisão que deveria tomar seria a mais acertada.

Minhas divagações não me permitiam esquecer de Suzy, da paixão, da razão porque ainda vivia, da causa de minha ruína e nem da verdadeira causa de estar vivendo como um trapo humano! Suzy!

Mas era assim que queria viver se não pudesse tê-la a meu lado. E isso não poderia mais acontecer porque ela já está casada. Ah, vida cruel, vida ingrata!

Tive uma outra recaída. O câncer já havia se apoderado de mim, agora com mais força. Ou era simplesmente excesso de oxitocina?

Antes de perecer dessa terrível doença, já em estado de metástase, decidi voltar ao bairro que me acolheu durante longos anos da infância à juventude.

Deslizando com o carro, suave e lentamente pela rua principal do bairro, recordava os momentos felizes onde tinha vivido. Eram brincadeiras de bola, papagaio de bolinhas de gude, canga – pé, carrinhos de rolimã.

As lembranças de minha infância feliz deixaram-me por alguns instantes em estado de êxtase. Mas nem assim consegui esquecer por um instante de minha Suzy.

Tinha ido à busca de amigos da infância e a um reencontro com meu passado. À medida que o carro andava pelo asfalto onde antes era só areia, dizia para mim mesmo “aqui era minha casa; ali era um campo de futebol...” Eram lembranças de um tempo sem luz elétrica, sem aparelhos de televisão, mas feliz na simplicidade em que vivíamos eu e minha família. Mas tudo estava diferente. Não identifiquei quase nada: O Bazar Centenário, o Bar Copa 70, importantes referências na minha infância e adolescência, não existiam mais.

Além do câncer, a melancolia também havia se apoderado de mim e, por momentos apenas, não pensei em Suzy. Em seguida, desejei estar caminhando ao seu lado e falando de coisas de minha infância feliz! Ah, dor que não sai do meu peito! Ah, são lembranças que não consigo tirá-las de minha memória ou de meu coração, nem por um segundo apenas!

Recebo de bom grado a tua carta, minha sempre amada Suzy e passo a respondê-la. Quando me dizes que não estou sendo punido por Deus com meus infortúnios, não concordo muito com tua afirmativa.

Analisemos minhas explicações: sempre fiz o bem em todas as minhas ações. Isso não é o suficiente? Formei-me em duas faculdades e conclui duas pós-graduações. Para quê isso, se com isso não consegui realizar o sonho de ministrar aulas em um curso superior? E você ainda quer dizer que não estou sendo punido por Deus!

Sonhava entrar em uma sala e dizer “bom dia” para a classe e o coro todo respondendo “bom dia, professor!”

Nada disso eu consegui realizar!

Deveria eu estar sendo punido por dar-te dado rosas apaixonadas, muitas vezes roubadas em cemitérios depois do dia de finados? As quais você recebias com tanto gosto?

Estaria eu sendo punido em função de minhas frequentes internações com sintomas depressivos ou porque depois que tu me deixaste, tornei-me um devasso sexual?

Não saberei responder a esta minha pergunta!

Ou estaria em sendo punido por amar-te em demasia!? É, acho que era por isso! Tenho certeza!

Aceitarei as justificativas e explicações para o teu casamento, que as desconhecia completamente, porque estou chegando ao final de minha desgraçada vida. Mas não posso negar-te que fiquei arrasado por dentro. Informo-a que recebi o teu convite para comparecer ao casamento, mas não compareci, por razões óbvias, as quais me recuso a revivê-las, para não aumentar minha tortura de amor!

Mantenho na parede tão-somente o teu retrato como que me olhando sempre para qualquer lugar que ande em minha sala!

Adeus, Suzy, despeço-me com muito amor ainda no coração, nos momentos finais de minha desgraçada vida!

Sei que tu não vens me visitar desta vez como fizestes quando fui operado de apendicite, na primeira vez. Estás casada e não consegues sair tão facilmente de casa. Ah, como ainda te desejo, mas a levarei para sempre em meu coração!

Depois desta carta que recebi de Suzy, provavelmente em função da certeza que tive de que ela estava bem e feliz, fui novamente hospitalizado. Setor de oncologia! Rezei muito para terminar meu sofrimento de amor!

Todos os temores que tinha vieram à tona: era mesmo o câncer que me acometia!

Desesperado e ainda podendo andar, procurei remédio para minha cura ou um prolongamento ainda maior de minha vida.

“Que coisa chata ficar em busca de remédios se não há remédio para curar-me de meu mal de amor”, pensei. Mesmo assim, decidi procurá-lo, mas não o encontrei.

Decidido, passei por entrevistas com pessoas que poderiam ter sido minhas alunas na Faculdade, se eu tivesse realizado meu sonho de ser professor universitário como planejara ser antes da confirmação do diagnóstico de câncer. “Essa, com certeza, ainda não é formada”, ficava pensando enquanto ela lia papeladas e mais papeladas de informações – relatórios médicos, pareceres, documentos para aposentadoria etc - que lhes depositei sobre a mesa. “Que coisa chata”, pensei novamente. Só nesses momentos conseguia esquecer de minha Suzy. Mas as lembranças de seu rosto, de seu corpo e de tudo enfim, invadiram-me e eu fiquei ainda mais desesperado e comecei quase a gritar no gabinete da profissional que fazia meu atendimento.

“Coitada”, pensei e completei: “ela não tem culpa nem da minha doença; muito menos do meu desespero”. Fiquei calmo por uns poucos instante e voltei a alterar minha voz. Estava de novo quase gritando!

Fui submetido a tratamentos com radioterapia e quimioterapia.

Sentia-me muito mal depois das aplicações. Tinha enjôos e outros sintomas piores ainda. Acredito que estavam aplicando as doses em local errado. Eram sempre nas minhas veias que as aplicavam; mas era no coração que eu precisava que fossem aplicadas. No coração!

Mesmo se aplicadas direto ao coração, não seriam suficientes para extirpar o câncer de amor que estava matando-me, lentamente...

No máximo, aliviariam a dor do meu sofrimento cancerígeno, mas não o de amor cancerígeno que eu sofria.

As sessões de quimioterapia e radioterapia foram levando minha vida até o fim!

Meus longos cabelos caíram. Fiquei quase careca durante meu tratamento médico contra o câncer. Mas isso não era nada diante do meu sofrimento de amor por Suzy. Eu recuperaria tudo novamente; mas, não o amor de Suzy!

Recebi alta depois de quatro meses. Mas foram quatro meses lembrando de minha amada Suzy. Logo em seguida, novamente fui internado.

Durante o novo tratamento, já em avançado estado de metástase, tivera sonhos eróticos. Ela, em uma roupa branca transparente, surgia em meus delírios de amor. Nós fazíamos um amor gostoso. Sempre! Depois, nos deixávamos como sempre ocorria.

Decidi que não deveria mais viver! Sem ela; não!

Tivera ataques de pânico durante o tratamento. Sentia o intenso medo do tratamento contra o câncer e um grande desconforto. Falta de ar, palpitação cardíaca, suor, náusea, tontura e parestesia eram alguns dos sintomas que estava sentindo. Tudo acontecia dentro do meu cérebro e os reflexos eram todos dentro do meu coração.

Deveria ser por isso que em todas as minhas consultas, os médicos oncologistas pediam, além dos exames de rotina, uma tomografia computadorizada. Acho que eles queriam descobrir na oxitocina do meu cérebro as razões para um amor tão doentio e profundo que sentia por Suzy durante todos àqueles anos. E olha que não tinham sido poucos..!

A medicina diz que o ataque de pânico pode ter origem em fatores hereditários. Mas não acredito nisso porque nunca nenhum membro de minha família viveu uma paixão tão intensa por alguém como eu estava vivendo por Suzy.

Convulsões eram freqüentes. Meus músculos se contraíam e passavam a ter mais força do que era normal. Um dia cheguei a morder um anel de ouro quando tentavam puxar minha língua de dentro da boca.

Uma vez, dando entrada na emergência de um hospital, urinei em toda minha roupa. Espalhou até pelo chão. O médico disse que era normal. Acho que ele estava querendo fazer com que não sentisse vergonha pelo que havia acabado de fazer. Diziam que respirar fundo ajudaria a tranquilizar o cérebro, mas o meu não poderia ter qualquer tranquilidade com a lembrança constante de Suzy.

Era melhor morrer!

Com o continuar do tratamento, decidi dar uma chance a mim mesmo e marquei um psicólogo. Estava deprimido e queria um profissional para ajudar-me a extirpar Suzy de dentro do coração. Não deu certo o tratamento porque as causas da depressão ainda são desconhecidas.

O médico disse-me que a causa mais provável da minha doença de amor seria um desequilíbrio bioquímico devido à comprovação científica de que os remédios farmacológicos já faziam algum efeito. Mas, mesmo com os remédios que passei a tomar, o tratamento não deu certo.

Tenho certeza que parte do câncer que se apoderou de meu corpo foi causado pelo amor excessivo que sentia e ainda sinto por Suzy. Isso já foi comprovado cientificamente Mas, ainda não havia sido inventado remédio para combater o amor que estava sentindo dentro do meu peito. Sofri mais ainda.

Ao falar de Suzy, passei a ter mais desejo ainda por ela. Desisti do tratamento e não voltei mais ao psicólogo. Desejava desabafar com alguém sobre meu amor doentio por Suzy!

Estava ficando louco, além de estar possuído pelo câncer. Receitaram-me remédios. Mas nada para curar meu coração, que sentia tantas saudades e paixões por Suzy!

Já perguntei uma vez o que é a loucura, afinal? Entendo que todos nós temos um pouco de loucura.

Continuei deprimido e sem uma identificação exata das suas causas. Sei que todo o dia acordava triste; não manifestava interesse por qualquer atividade; não conseguia ficar parado e meus movimentos passaram a ser mais lentos do que os de costume.

Passei a ter sentimentos inapropriados de desesperança, desprezava-me como pessoa e passei a culpar-me pelo câncer que havia adquirido. Com isso, passei a ser um paciente potencialmente fatal para os médicos que me tratavam. Esse meu novo quadro clínico, contudo, foi pesquisado por vários médicos por quase duas semanas até que recebi o diagnóstico.

Mas, dentro de meu coração, no íntimo de minha consciência, sabia que estava morrendo de amor e de câncer por Suzy!

Até na hora da minha morte! Queria que ela fosse visitar-me nos últimos momentos de vida. Mas ela não apareceu. Fechei os olhos. Cheios de exitocina de amor. Dormi o sono eterno dos apaixonados. Dei o último suspiro de dor! Era a minha vida que chegava ao fim!

Antes de meu último suspiro, a exoticina de amor, a proteína invadiu todo meu corpo e meu cérebro. Era difícil de aguentar esse bombardeio de exoticina de amor. Desisti de viver.

Essa substância foi estudada pela primeira vez em 1777, quando o químico francês Pierre-Joseph Macquer descobriu que pelo aquecimento a caseína e o globulina se modificavam de uma maneira muito peculiar; o aquecimento as tinha transformado de estado líquido para o estado sólido.

Nada disso explicava minha doença de amor, nem o químico holandês Gerardus Johannes Mulder, com sua a formula C40 H62 O12 N10, criada em 1839 foi capaz de explicar meu desespero de amor.

Como último recurso, os médicos introduziram uma enorme agulha no meio de minha coluna; eles queriam retirar os amonoácidos e tratá-los com reagentes químicos. Não conseguiram. Saiu um líquido branco de minha coluna mais os médicos não conseguiram diagnosticar nada.

Em 1953, o bioquímico norte-americano Vincent du Vigneaud conseguiu sintetizar um peptídeo cadeia exatamente como o que aparentemente representou exoticina molécula. E, além disso, o peptídeo sintético mostrou todas as propriedades do hormônio natural.

Vigneaud Du foi agraciado com o Prêmio Nobel de Química em 1955. Mas eu já estava morto e de nada mais adiantariam os estudos médicos. Não ia esperar a continuidade desses estudos para encontrar a cura para meu câncer de amor!

Meus familiares e amigos por certo saberão que morri, mas nada saberão sobre as causas que me conduziram rápido rumo à morte. Antes de morrer, porém, passou um filme pela minha mente e revivi tudo o que havia passado ao lado de Suzy e, então, fechei os meus olhos. Seria a última vez que veria a luz do dia, o clarão da lua ou o brilho do céu.

Decidi que não queria mais viver e suspirei pela última vez!

Eu, que passei a minha vida toda buscando conhecimento como a forma inesgotável de melhorar de vida, cheguei aos últimos momentos em um leito de hospital e futuramente serei transformado em nada, devorado pelos micróbios que infestam nosso corpo. Eu só desejo mesmo um enterro digno, como deixei escrito para meus familiares e amigos

E assim foi assim que terminou a história de amor entre mim e Suzy! Com minha morte!

FIM

carlos da costa
Enviado por carlos da costa em 24/11/2010
Reeditado em 14/12/2010
Código do texto: T2634249