O poeta mudo

Enquanto chora o violão eu penso. Penso nas alegrias, na vida que passa sem que ao menos déssemos conta. Penso nos dedos do violonista que corre pelas cordas entoando um sentimento indescritível, nada se sabe sobre a vida do poeta mudo, que utiliza da voz de dentro e não aquela conhecida voz das palavras.

E viajo junto com ele enquanto um cigarro queima esquecido no cinzeiro. Seriam das noites frias e insones que viriam a inspiração para se dizer de amor ou ódio sem dizer uma palavra sequer? Ou viriam de dentro de uma caixa que o compositor guarda dentro do seu violão junto com as lembranças?!

Nada se sabe sobre o poeta mudo, sobre o poeta que sem as palavras que não fazem a menor falta diz mais do que se usasse tantas mil. Não se sabe da dor ou da alegria que sentia ao dedilhar doces palavras mudas no seu violão.

O sentimento do instrumento invade meu ouvido como se quisesse reger as batidas do meu coração, me conta histórias tristes e alegres, histórias de amor e ódio, basta eu me permitir ouvir e entender da maneira que me for propícia neste momento.

O chiado do velho vinil me faz refletir sobre quão velho é o sentimento. Alguns anos se passaram e ao ouvir os típicos chiadinhos que se confundem com as notas penso que o tempo jamais desvirtuará o caminho do amor, do ódio, da alegria ou da tristeza. O sentimento não envelhece, com o tempo torna-se mais belo e fortalecido, com capacidade de diversas interpretações e formas de se sentir. Sentir aqui também com a conotação de ouvir, ouvir a voz de dentro que conduz a trilha sonora de uma vida toda. Como as notas daquela bela música que tudo diz sem mencionar uma única palavra, levemos assim nossas vidas, entreguemo-nos nas mãos do compositor e deixemo-nos levar sendo entendidos facilmente.

Natalia Gregolin
Enviado por Natalia Gregolin em 13/10/2006
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