Sede de prosa numa cidade grande

Aguardando a condução, embaixo de uma marquise,num desses últimos dias de chuvas, aqui em Belo Horizonte, deparei-me com uma situação imposta pela cidade grande, de que muitas vezes não percebemos, que é a da necessidade das pessoas dialogarem. Muitas têm é sede de prosa numa cidade grande.

Em meio a toda aquela confusão, própria de fim de ano, que te preocupa em não ter os olhos furados pelas pontas das barbatanas dos guarda-chuvas e sombrinhas, fui surpreendido com alguém prostado em minha frente, perguntando-me algo:

_ Senhor! Pode ajudar-me a comprar …

Foi aí que percebi que era um pedinte e estava solicitando-me algo.

_ Perdo-me, mas geralmente saio com o suficiente para voltar para casa, pois está muito perigoso transitar com dinheiro. Expliquei-lhe.

_ Tudo bem ! Eu prefiro pedir que roubar, como outras pessoas agem por aí.

_ Ainda bem ! Respondi-lhe.

_ Esta chuva não pára, hein ? Argumentou-me.

_ É deveras ! Já chove há três dias. Mas está bom.

_ Sim ! Sem a chuva não podemos ficar, não. Ela é muito importante para nós. Continuou ele falando comigo.

Como vi que ele estendeu a prosa, comecei a assuntar-lhe: de onde veio; por que está nessa situação; se tem família; se sabe do paradeiro de seus parentes e de outras coisas.

O papo se alastrou e ficamos a conversar por alguns minutos que pareciam horas. As chuvas amainaram e fomos invadindo o restante da calçada, naquele verdadeiro efeito sanfona.

Ele então se despediu de mim e lhe falei que sentia muito por não tê-lo ajudado. Aí então, retrucou-me:

_ O senhor não me deu esmola, mas me deu prosa. O senhor não imagina o quanto é difícil encontrar alguém que queira dalogar com um pedinte.

Olha ! Isso me fez fazer uma reflexão tão grande que resolvi externá-la a vocês.