ADEUS AO MOCÓ

Neste último dia do ano, posso afirmar que 2010 foi um ano de muitas realizações e alegrias.

Meu irmão que o diga. Sempre foi um batalhador, de viagens infindas, que buscava ascender socialmente, claro que negando esta acertiva, como sempre.

A sua vida nos últimos anos foi uma eterna luta pela busca de uma nova morada, onde pudesse viver e proporcionar a sua família um pouco mais de descanso e sossego. Este objetivo, o qual se tornou quase que uma obsessão paranóica, tinha um motivo muito relevante e dramático, o tal de “Mocó” que se estabeleceu ao lado de sua casa, onde tiroteio na madrugada era programa mais certo que o jornal das oito na TV, visto que, normalmente, o programa vai ao ar às nove.

Colocando a sua casa à venda, mas de forma discreta, o meu incomodado irmão conseguiu uma permuta, com pagamento de uma diferença para poder desfrutar a tão almejada paz. Ele sempre foi um sujeito bom de negócio. Já realizou muitas transações de meus veículos, posso até dizer que, com certa rapidez e facilidade.

Eis que chegou o grande dia para o retirante. Levantou cedo, pois a noite foi longa demais à espera do amanhecer, e para viver a nova vida que almejava. Começou a carregar as talhas para fora da casa e doar a quem quizesse tudo o que não pretendia levar para a nova morada, pois a casa era coisa fina, sabe, coisa de burguesia em ascenção social, bairro nobre, aonde os amigos do alheio gostam de visitar nos momentos de descuido. Mas de qualquer sorte estava feliz, com a cola erguida e louco para dar o fora do local maldito (o Mocó da Botafogo).

Meu irmão, era um sujeito experimentado em mudanças, visto que sempre gostou de viajar com mala e cuia. Só que na hora da mudança, e ele não tinha pouca coisa, se deu conta que sozinho não conseguiria realizar o translado de seus pertences. Foi aí que aconteceu o inesperado. Adivinhe quem se apresentou para ajudar a realizar o tão esperado sonho de meu irmão? O tal dono do Mocó que morava ao lado, um velho que era tachado de rabugento e beberrão, e que não deixava ninguém descansar com seus discursos laudatórios, caminhado de um lado para outro, em seu pátio, até altas horas da noite.

Por uns trocados de real, meu irmão comprou o trabalho daquele inesperado ajudante, que foi incansável no carregar da mudança. E meu irmão ficou muito agradecido ao infeliz. A ironia do destino sempre nos surpreende, nos momentos de decisão. O motivo da mudança, virou solução do inesperado. O estopim da decisão de mudar-se, trouxe a solução imediata para a felicidade dos retirantes da zona do Mocó.

Hoje, passada a angústia de morar num local onde não havia mais motivação alguma, o mocozeiro é até considerado como uma pessoa boa, afinal ajudou muito na hora de precisão, e na atual conjuntura, estando longe, não oferece nenhuma ameaça imediata ao descanso e à paz tão almejada.

O ano que se encerra realmente foi muito bom para meu irmão. Está de casa nova, depois de muita batalha, mora num bairro de classe média-alta, deu adeus a vila, vendeu bem a sua joinha Fat-boy (a gorda da HD), incrementou seu caixa e, de quebra, vai partir para uma Road King (a poderosa da HD), pois pretende pegar a estrada e ficar bem longe das lembranças do Mocó da Botafogo.

Outro dia fui visitar o burguês em ascenção, e para minha surpresa, encontrei meu irmão meio triste e contando que o mocozeiro lhe foi muito prestativo. Acho que está batendo a saudade das movimentações do velho Mocó da Botafogo. Ao ser indagado logo se manifesta afirmativo – Botafogo nunca mais, adeus ao Mocó. Mas mesmo assim, com toda a sua veemência, senti no ar um clima de melancolia. Vai entender essa gente.