DONA MINICA -PROFESSORA RURAL

D. M I N I C A --- Professora rural

Por volta de 1951, na Fazenda Baía, os nossos pais José Carneiro e Cici, resolveram matricular-nos na Escola Rural do Baia, mais precisamente na Escola de D. Minica, como era conhecida a Prof. Guilhermina.

D. Minica era uma professora famosa na região , poi naquela época ela já lecionava há mais de 20 anos. Do lado esquerdo de quem desce o Rio Piranga, frequentavam essa escola os alunos das seguintes localidades: Baía, Aquenta-Sol, Monteiro, Taquara-Assú. Do outro lado do rio, eram: Ferraz, Salto, Volta-Fria. A rivalidade entre as regiões era uma constante na escola. Até para beber água existia a mina do lado de lá e a do lado de cá. Se algum aluno tentasse beber água na mina que não fosse a do seu lado, era briga na certa.

A Escola possuía mais ou menos 30 alunos, do 1º. ao 3º. ano. Assentávamos em bancos de madeira, sem encosto, mas, na frente tinha uma tábua onde eram colocados os objetos escolares. As 03 classes funcionavam na mesma sala, sendo que os alunos do 1º. ano ficavam na frente, vindo a seguir, o 2º. e o 3º. ano.

A aula iniciava às 10 horas , pois os alunos almoçavam às 09 horas e tinham tempo suficiente para chegarem até à escola .

No primeiro dia, chegamos meio ressabiados, embora bem acompanhados pelos veteranos do nosso lado ( o lado de cá). Como era previsto , assim que chegamos começaram as provocações por parte do Nelson (filho da professora) e do Fabinho do Sô Benvindo. O nosso líder, o Pedro do Colodino (Claudino) foi logo avisando: “- ai, de quem encostar a mão em algum aluno de nossa turma!” Se isso acontecesse, eles teriam de se haver com ele. Ficamos encorajados pois , afinal, o Pedro era “o Pedro” e ele estava do nosso lado.

Às 10 horas , a D. Minica tocou o tímpano, colocou a turma em fila e ordenou que entrássemos para a sala. Antes do início da aula, fomos avisados de que às quintas –feiras teríamos que cantar os hinos Nacional e da Bandeira. Como era quinta-feira, cantamos os dois hinos, com permissão de acompanhar a letra que estava impressa na contra-capa do caderno. Nesse primeiro dia, para a turma do 3º. ano, a D. Minica escreveu no quadro-negro o que havia acontecido na região com a grande enchente do Rio Piranga. A “ponte de arame” que ligava os dois lados do rio teve arrebentados os cabos de aço, ficando a região sem comunicação. A D. Minica morava do lado de lá. Nessa redação que ela havia escrito, apareciam os agradecimentos às autoridades de Piranga e Calambau (então distrito de Piranga) pela reconstrução da ponte. Houve um agradecimento especial ao Tião Dentista (casado com a nossa tia Letícia), pois o mesmo emprestou o seu bote para essa reconstrução.

Veio o recreio, cada um com a sua turma. Nesse primeiro recreio, as atenções ficaram por conta do Pedro, que querendo aparecer, principalmente, para nós os novatos, andava vários minutos com as mãos no chão e os pés para cima. Quando estava quase terminando o recreio, fomos com ele conhecer a nossa mina, na qual poderíamos tomar a nossa água, bastando para isso que arrancássemos uma folha de inhame que iria servir de copo. Voltamos para a aula que transcorreu sem novidade, a não ser no final quando a D. Minica explicou para nós como funcionava a palmatória, principalmente quando era argüida a tabuada.

A professora despediu-se dos alunos e todos foram para casa. Da nossa turma, o primeiro a chegar a encruzilhada de sua casa foi o Pedro do Colodino. Cá da estrada dava para ver a D. Olira, sua mãe, soprando feijão. O Pedro, assim que entrou em direção à sua casa, pôs em prática o ritual que era adotado na região: - “Vão chegá gente!

- “Agora, não!” respondíamos.

- “Então vai com Deus!” dizia o Pedro. E nós respondíamos: - “ Fica com Deus tamém!”

Na encruzilhada do Monteiro, era a vez do Zé Tendinha, do Sô Juca e do Carlitos repetirem a mesma despedida. Na encruzilhada da Fazenda, como era chamado o caminho que ia para a nossa casa, repetíamos a mesma coisa, sendo que dessa vez o “vamos chegá gente!”, erámos nós que dizíamos. Os que sobraram para irem em direção à estrada do Aquenta-Sol, eram: O Raimundo Bananal, o Sebastião Monteirinho, o Sebastião do Juarez, que ainda eram do Baia. Daí para frente, a Turma do Aquenta-Sol: Zé Lourencinho e suas irmãs, Maria Benta, Idalina e Celina do Zé do Carmo, Zé Baía, Zé de Benvindo, Geraldo Custódio, Geraldo de Chico Rodrigues, Helena e Aparecida Custódio e outros.

Ficamos na escola de D. Minica por mais ou menos 06 meses, mas foi o tempo suficiente para aprendermos muitos dos ensinamentos da professora. Presenciamos muitos acontecimentos pitorescos naquela época. Na sala de aula havia um despertador sem o vidro e, por várias vezes, o Pedro adiantava o relógio em 10 minutos, fazendo com que a aula terminasse mais cedo. O Geraldo Custódio tentava convencer o Pedro a adiantar o relógio em meia hora, mas este não era bobo e não cedia a essa tentação.

O Sebastião de Juarez comentava com a turma que o hino que mais gostava era:” Quando eu vim lá do Piranga...”, querendo referir-se ao Hino Nacional.

O Sebastião Monteirinho na hora de estudar a tabuada cantada, gritava a todo pulmão: 4 x 3 é 6; 7 x 2 é 10; 5 x 4 é 12.

O Fabinho não acertava a tabuada de 9: era só perguntar para ele quanto era 9 x 6 que a resposta era imediata: 45. Até hoje dá para reparar que a mão dele é fina de tanta palmatória...

O Juquinha Pinheiro chegou ao cúmulo de dizer para a D. Minica:: - “Eu acho que esse B é um A” .

A D. Minica ensinou as primeiras letras a várias pessoas de nossa região. Todos são gratos a ela. Os alunos que conseguiram estudar com ela até o 3º. ano primário, sabiam ler e escrever muito bem e eram bons em aritmética.

O Helvécio, o Nelson, e a Lúcia, todos filhos da professora, também foram nossos colegas. O Antonio que também era filho, por haver terminado o primário em Piranga, ajudava a sua mãe a lecionar, principalmente para os alunos do 1º ano.

Foi bom ter sido aluno da D. Minica, pois fomos testemunhas do grande bem que ela fez à nossa comunidade.

CALAMBAU/ DEZEMBRO/ 1980 – MURILO VIDIGAL CARNEIRO

murilo de calambau
Enviado por murilo de calambau em 16/01/2011
Reeditado em 13/01/2012
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