JOSÉ E O BENZEDOR

José acabara de passar por uma de dar dó.

Saira desiludido da primeira experiencia em Marilia, estado de São Paulo.Procurou um hotelzinho barato onde passou a noite. Ao amanhecer, envergonhado, resolveu não ficar por aquelas bandas. Apanhou seus pertences e chegando à estação ferroviária dicidiu ir para Bauru, entrocamento ferroviário.

Em Bauru, numa construção, contou sua historia; trabalhara na roça, em Alagoas, não tinha letras, mas muita coragem. Arrumou emprego de servente, com direito a morar no alojamento dos solteiros.

Vivia só, e de lembranças. Muito fechado, não conseguia fazer amigos. Bem! O pessoal la da construçãp se divertia com seu jeito matuto, que ele até acostumara.

Certa vez apareceu adoentado. Talvez solidão.

-Procura médico, Zé, dizia um.

-Que nada home, vai no benzedô, dizia outro

-Oxente! Qui dotô, qui benzedo, qui nada. Eu to bão. É só toma um chá e pronto. Fico bão.

Não houve chá que o curasse.

- O Zé, ja disse, vai no benzedo. Eu conheço um bão. Se quizé, do o indereço.

- Oia Pedro, si eu fo, ocê num isparra pur ai? Tu sabe qui nun gosto di conversa fiada. Mi isprica direito isso di benzedo.

- Ti garantu, Zé. Ispera qui vô iscreve o indereço, i você podi i quarque dia qui quisé.

- Prontu, Zé. Toma. Fica meio distante, mais si pergunta pur aí, todo mundo sabe.

O Sábado estava bonito. José levantou bem cedo, barbeou-se e vestiu terno de passeio ( para dar aparência). Perfumado atravessou a cidade rumo à casa do Benzedor(uma casa à poucos kilometros da cidade).

Foi pensando:

"U Pedro mi falô qui o home é bão. As garafada dele cura inté tubrculosi. Eu devo di fica bão desse mar qui mi aperreia"

- O di casa!

- Pode entrá!

- Censa! Oia, to aperriado i u Pedro me mandô cá, pro moço benzê e da uma garrafada.

Velas e santos por todos os lados, garrafadas cheias pelo chão. - Não que eu esteja criticando a crença- mas tudo era exagero. Homem esquisito aquele...

José quis sair correndo, mas Pedro garantira que era um bom benzedor.

" Zé, ô Zé! Se é macho, home. Num corre não!"

Sentou-se no banquinho que o Benzedor lhe indicou. Tremia feito vara verde. Medo? - Não sabia.

O Benzedor se contorcia em caretas, dizia palavras que ele nada entendia, passando-lhe as mãos pelo corpo.

" Oh! Meu bom Jesuis, meu Santo padim Ciço, mi ajude. U qui esse benzedo vai faze? Ai Jesuis!

Os malabarismos do Benzedor continuavam. Num certo instante apoderou-se de uma das garrafas, despejando aquele remédio (remédio?!) mal cheiroso em José. Este acompanhava os sinais cabalisticos com os olhos. Sentia-se até meio vesgo, tanto o homem se mexia.

- Pronto fio. Leva essa garrafa pra tomá treis veis no dia. No nasce do sol, meio do dia e na boca da noite. Num abre no caminho. Custa só isto(aqui deixo o valor por conta da imaginação, pois eu mesma já nem sei por quantas passou nosso dinheiro- sei que não foi barato para um ajudante de pedreiro).

- Mais tão caro assim?

-Oia fio, num adianta chora agora. Fiz u qui mi pidiu. É só pagá, usá e ficá bão.

Ah! José Queria estrangular o Benzedor. Hum! Com certeza Pedro iria se dar mal. Ah! Se ia! Engoliu a ira, como também engoliu o quentão lá em Marilia.Pagou e saiu com a garrafa embaixo do braço...

Porque se irritar;se o remédio fosse bom valeria. Sempre soubera que benzedor não cobra a cura; mas aquele tinha fama...(Pedro disse) Tão logo chegasse em casa iria tomar o remédio, para estar melhor no outro dia.

" Purque será qui num posso abri antes di chegá im casa? Hum! acho qui faiz parte da cura...É, é issu memo."

Chegou exausto e com fome. Não tinha ninguém no alojamento. Sábado, os peões iam à Praça namorar. José tomou um banho e comeu alguma coisa.

" Agora vo toma o remedio. Tomara qui num fede ingual u otro."

Abriu a garaffa e sentiu que o "bofe" vinha fora. Correu para a privada.

"Oxente! qui qui é issu?

"Ah! Si eu pegu aquele disgraçado du Pedro, matu ele. I aquele véio safado, sem vergonha, cabra da peste..."

E jogou fora o que comera.

" Cumu qui podi, Deus du céu! Mi inganaro! Cambada di vagabundu! Cabra relexo. Inda paguei pra issu..."

Xingando foi jogar fora a garrafada de urina, acrescentando mais ao seu fardo de desilusão.

Arrumou as malas, se foi e na segunda-feira Jose não apareceu no trabalho!

(baseado em relatos de meu pai,sobre sua vinda para Estado de São Paulo. Mas não se preocupem. Meu pai aprendeu muito com isto. Estas historias nos contava, como lição de vida. Ele venceu e todos nós(4) pudemos estudar)

Raquel Teixeira Leite
Enviado por Raquel Teixeira Leite em 24/01/2011
Reeditado em 24/01/2011
Código do texto: T2749287
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