MEXER COM "DIFUNTO" DÁ ASSOMBRAÇÃO

Não vá bulir com os defuntos!

Eu bem que avisei, mas o prefeito de Saracutópolis, MacQuinones Todo Duro, não ligou e começou a bulir com os defuntos do lugar, dando de abrir para loteamento parte do Cemitério Velho, onde, segundo cálculos da boca miúda, ele tiraria uma boa porcentagem para fazer um pé-de-meia. Eu não joguei praga, mas lá muita gente jogou. Como o prefeito era incréu, ex-PFL, e hoje comunista (dizem até que comedor de criancinha), mandou botar metragem e cerca, atravessando pernas, braços, barrigas, pescoços e todos os ossos dos defuntos mais antigos do lugar, que dormiam serenamente há muitos e muitos anos, até mesmo esquecidos de latomias e livuzias.

E foi justamente Júlio Doido, um que ninguém dava nada por ele de abestalhado e bestejado que era, que jogou a primeira das mais de cem mil pragas nas costas do prefeito que permitia um “labuê” desses. Não demorou muito, o prefeito MacQuinones começou com uma pinicação no saco, depois difursou brabo, deu mal de isipra, pegou panariço e frieira, até aparecer um formigamento no bilau. Não demorou de novo, ele estava atrás de garrafadas de catuaba, verga tesa, tribulus terrestris, marapuama e cipó-de-mula pra curar serviço de pau mole.

Eu de minha parte, que não sou de muita ruindade, pedi aos santos e aos defuntos que viessem puxar a perna dele de noite, fazer cosquinha no boga, provocar uma caganeira por semana e botar nele um sestro de apanhar e segurar seu próprio peido com a mão e levá-lo ao nariz para o acintoso deleite olfativo dele mesmo. Essa foi, das mais leves, a pior praga que alguém rogou nele, porque a partir daí passou a ser chamado de “Mac Cata Peido”. Não se fazia de rogado e até mesmo nas mais importantes reuniões da prefeitura ele catava um peidinho aqui e outro acolá para cheirar gostoso. E se regalava.

Saracutópolis hoje parecia estar vivendo um tempo de "Acúmulo de Absurdos", que ultrapassava o cúmulo. Enquanto no mundo todo as pessoas reverenciavam seus mortos, com cerimônias, pompas e circunspecção, enaltecendo a beleza dos cemitérios, alguns sendo até motivos para visitação turística, em Saracutópolis os defuntos estavam caindo em desgraça, re-morrendo, sendo desrespeitados e jogados às traças. Aquela guerra contra os defuntos estava deixando muita gente morta de raiva.

Parafraseando os poetas da música Fernando Brant e Milton Nascimento, defunto também é coisa pra se guardar, como amigo, do lado esquerdo do peito. O povo bradava em passeata, fazendo manifestação. Quaisquer velório e enterro eram motivo para manifestação contra a invasão do cemitério. O prefeito MacQuinones absorveu também uma praga de ir endurecendo as juntas do corpo. Primeiro, falanges. Depois, joelhos, tornozelos, braços e pescoço, calhando o sobrenome Todo Duro. Por isso mesmo, todos de lá que apareciam com um endurecimento nas juntas recebiam a pilhéria de que tinham bulido com defuntos.

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Crônica de Hélverton Baiano publicada hoje 1º de fevereiro de 2011 no Diário da Manhã. Goiânia GO. O artista das letras é natural de Correntina, um conterraneo arretado e revoltado com a denucia feita neste Recanto, sobre a invasão do antigo cemiterio do lugar, por sua excelencia Mac Cata Peito,