E o que nós temos com o pum da vaca?

Dia desses eu estava trabalhando de madrugada e sofrendo com o ar pesado e quente. Pensei comigo mesma que a primavera mal começou e fiquei imaginando o que será de nós no alto verão. Quase sem perceber, me peguei pensando no quanto os bois e as vacas, em sua tranqüilidade irracional ao viverem pastando e dando os seus arrotos e puns, são ou poderão vir a ser efetivamente culpados por este clima.

Não pensem que as minhas divagações são meros delírios de quem trabalha atordoada de sono pelas madrugadas.

Desde 1992, é realizada anualmente a convenção-quadro da ONU para Mudanças Climáticas. Consequentemente surgiu também o Protocolo de Quioto, que estabeleceu metas que devem ser atingidas pelos países desenvolvidos para a diminuição de emissão de gases causadores do efeito estufa num prazo entre 2008 e 2012. Interessante notar que os EUA, que são os maiores emissores de gases, e também a Austrália, não aceitaram assinar o acordo e, portanto, não participam do Protocolo de Quioto.

Com toda essa preocupação com o aquecimento do planeta, foram feitos diversos levantamentos sobre a emissão de gases e um deles, emitido pela Organização da ONU para Alimentação e Agricultura (FAO - Food and Agriculture Organization), afirma que a pecuária contribui para o efeito estufa mais que os automóveis.

Um bovino produz cerca de 60 quilos de metano por ano. O Brasil possui um rebanho de cerca de 170 milhões de animais, então acho que dá para se ter uma idéia da quantidade de pum de ruminantes lançados na atmosfera.

Parece engraçado? Mas não é.

Segundo o Australian Journal of Agricultural Research, globalmente os ruminantes são responsáveis por 25% de todo o metano produzido pela humanidade.

Para que se tenha uma idéia das implicações do metano, podemos dizer que quando se fala de aquecimento global, a maior preocupação é o CO2. Formulando uma base comparativa, basta dizer que o metano tem um poder de aquecimento global 23 vezes maior que o CO2. Além do metano, os ruminantes ainda produzem óxido nitroso (N2O), que aquece 296 vezes mais que o CO2 e os ruminantes também são responsáveis por 64% da emissão global de amônia, que causa a chuva ácida.

Alguém com elevado senso de humor sugeriu nos meios virtuais que se todo esse metano pudesse ser coletado, teríamos uma fonte de energia ambientalmente amigável à disposição.

À parte as brincadeiras, um modelo auto-sustentável de moradia, desenvolvido já há alguns anos por ambientalistas, incluía um enorme recipiente que armazenava o metano resultante do processo de tratamento do esgoto da residência e que posteriormente era utilizado como fonte de energia. Para além da utopia é preciso testar incansavelmente as alternativas de sustentabilidade.

O relatório FAO obviamente não cogita a possibilidade de se entubar vacas, mas recomenda o estudo da melhoria da dieta dos ruminantes para possibilitar a diminuição da emissão dos gases. Esse tipo de estudo é imperativo, já que as estimativas demonstram que a produção de carne duplicará até 2050.

A idéia de sustentabilidade tão apregoada hoje em dia, vai além de reciclar um lixinho aqui outro acolá. Sustentabilidade é um conceito amplo, que engloba o uso e manutenção dos recursos naturais e preocupa-se em assegurar o bem estar coletivo. Sustentabilidade é realmente pensar no futuro e enxergar-se no contexto desse futuro.

(publicado no jornal Tribuna de Vargem Grande do Sul em 29/09/2007)