O dia em que o MEU mundo parou!

Cada pedrinha que via pelo caminho, chutava. Velhos tênis sujos, all star – moda da época – calças ligeiramente rasgadas, blusa de uniforme do colégio em que estudava e mochila nas costas. Nesse dia, estudar era a última coisa que pensava – o que era fora do comum.

Caminhava pela pequena distância entre a escola e o ponto em que esperava o ônibus, diariamente. Tinha acabado de chover, então, desviava das poças de água nas ruas; na verdade o fazia automaticamente, pouco se importava em molhar os pés. Aproximava-se do ponto e já o avistara. ‘O que vou falar? Ou melhor, como vou falar?’. Teria que decidir logo, ele vinha apressadamente ao seu encontro e teria que conversar e decidir o que fazer. ‘Como isso foi acontecer?’.

Ele a abraçou forte e sussurrou demoradamente em seu ouvido: ‘Como você está? Eu estou com muitas saudades’. Sem nem prestar atenção no que ele acabara de dizer ela o afastou e sorriu com ligeiro embaraço. Nos quatro meses que conviveram, ele já havia aprendido a identificar o comportamento dela. ‘Precisamos conversar – ela foi direta – Mas não aqui, vamos para a sua casa’.

Entraram no ônibus. Ele primeiro – não era cavalheiro, e ela não sabia ainda o quanto isso importava num relacionamento. Escolheram os últimos bancos – ele com a intenção de iniciar a conversa e ela querendo apenas se manter afastada de tudo, como se isso fosse deixá-la longe da realidade. Desviava o olhar por qualquer motivo e logo o fez perceber que ali não seria o lugar apropriado para iniciar a tal conversa.

Suspirou agradecida por ele sequer perguntar sobre o que era. Seus pensamentos vagavam. Olhava pela janela: os carros passavam apressados, o semáforo logo ficou vermelho, o rio estava cheio e o dia estava nublado, estranha e inesperadamente nublado – Cuiabá não passava mais de dois dias em chuva, costumeiramente. Seus cabelos voavam desordenados e ela nem ligava. Chegaram ao destino, desceram e caminharam calados até o apartamento dele.

Sentaram no sofá, distantes – por iniciativa dela. Tinha o estômago embrulhado e a palidez estampada no rosto. Não queria prolongar aquele momento, então foi logo dizendo entre choros e soluços: ‘Estou grávida!’ Não esperava nenhuma reação dele, nem dela mesma. Preocupava-se mesmo era com seu pai.

Antes dele falar qualquer coisa ou mostrar qualquer reação, ela pensou que acabara de completar 18 anos, não tinha saído da escola, sonhava em se tornar jornalista e, definitivamente, não queria passar o resto de sua vida com ele.

‘Foi o que de melhor aconteceu pra gente’ – ele falou. Foi aí que ela se pôs a chorar ainda mais. ‘Casamos, moramos juntos e criamos nosso bebê’ – completa ele, para desespero dela. Seu quarto ainda era rosa, tinha ursos espalhados pela cama e usava adesivos decorativos em seus cadernos.

Após a notícia ter se espalhado e, oficialmente chegado aos seus pais, a única opção que tinha era seguir a vida nas condições que ela e os mais próximos impunham. Saiu de casa – por imposição, e tentou achar algo de positivo em ter que morar com ele. Começou a trabalhar, esperava que fosse aprovada no vestibular e dormia cedo. Sem mais. Depois do sufoco que foi seu ‘casamento’, sua mal vivida gravidez, e a boa notícia de poder se formar jornalista, ela volta para casa e tenta recuperar o que passou: a juventude, um amor de verdade e a convivência proveitosa de se ter uma família.

Sheila Liz
Enviado por Sheila Liz em 10/02/2011
Código do texto: T2784132
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