Repeteco da própria vida

Com seis anos de existência e mais de 8.500 membros, a comunidade Café Filosófico "Das Quatro" continua sendo uma das melhores do Orkut. O nome é uma referência às quatro amigas fundadoras, que sempre estimulam a postagem de tópicos interessantes em seu fórum de debates, inclusive com entrevistas com escritores, músicos, educadores e filósofos.

Sou um visitante regular dessa comunidade há mais de quatro anos e, sempre que posso, participo de seus debates. De forma mais espaçada também deixo lá algum tópico, como o que leva o título “Você seguiria os mesmos caminhos?”. Nele menciono que há momentos da vida (principalmente após os 30 anos) em que paramos, olhamos para trás e nos perguntamos: e se eu tivesse escolhido um rumo diferente do que segui?

Numa proposta já levada algumas vezes para a literatura e para o cinema, deixei lá o seguinte exercício de reflexão existencial: se você pudesse voltar a um determinado ponto do seu passado (tido como divisor de águas) com a consciência e lembranças de tudo o que vivenciou até aqui, você seguiria um caminho diferente ou manteria a mesma rota que o trouxe até os dias atuais?

A maioria dos que participaram assegurou que nada mudaria. Chris Herrmann – co-fundadora da comunidade, que reside na Alemanha – mencionou que, por um lado, tem a impressão de que se pudesse voltar no tempo teria agido diferente nesta ou naquela situação. “Por outro, penso que eu sou exatamente aquilo que vivi e que todos os erros e acertos me fizeram mais forte e me deram a identidade que tenho hoje. Então, diria que a melhor resposta que encontro é uma pergunta: será que eu seria mais feliz se não tivesse experimentado meus erros?”.

Sílvia Vitória, de São Paulo-SP, registrou que já tentou pensar tanto no sim quanto no não sobre seguir os mesmos caminhos caso pudesse voltar ao passado. “Quando me lembro de como estava naquele momento, a única resposta que consegue me convencer é a de que eu fiz exatamente o que estava ao meu alcance. Se eu tivesse a vivência que tenho hoje naquela época será que eu teria vivido aquele momento a ponto de ter que me decidir, como o fiz?”

Celso Pestana, do Rio de Janeiro-RJ, enfatizou que voltar ao início da estrada para percorrê-la do mesmo modo que a percorreria quando tinha menos 40 anos lhe parece um sinal de estagnação. “Há coisas que eu não gostaria de repetir. Há coisas que não fiz e gostaria de ter feito. Há coisas que faço hoje que estão atreladas ao que fiz ou deixei de fazer e, muitas vezes, me impedem de ver outros caminhos.”

A única que confessou que optaria por uma mudança radical em sua vida, Juliana, de Londrina-PR, disse que faria tudo diferente. “Não porque me arrependa do hoje; gosto de quem sou, onde estou. Mas mudaria porque acredito não existir apenas um caminho certo, um futuro bom... Existem 'n' combinações que podem ser positivas. Essa aqui eu já conheço.”

Há outros posicionamentos bem interessantes para esse assunto que sempre foi instigante no meu círculo de amizade. Há pouco tempo um amigo, casado e com filhos, disse que se pudesse retornaria uns quinze anos no tempo para fazer outra escolha afetiva. No entanto, ele mencionou que sente uma angústia enorme só em pensar que não teria os seus filhos como eles são.

A verdade é que há riscos em todas as escolhas, e nelas há quase sempre o que se lamentar e o que se enaltecer. Sou um tanto saudosista, mas não mudaria nada em minhas escolhas. Sinto apenas ver tantas mudanças coletivas para pior no planeta. Aos 10 anos, em 1980, eu tinha uma visão mais poética do futuro, naquela época representado pelo ano 2000 e a virada do milênio. Hoje acho que o mundo tinha muito mais poesia e que perdemos a essência do que há de melhor na existência humana. Mas esta é outra questão...