Solitários em um mundo social



 
Percebo nossa existência como intrinsecamente solitária por mais que vivamos no meio de uma multidão de pessoas, sejam elas amigos, famílias, amores, colegas de trabalho ou mesmo estranhos que atuam para nossa sobrevivência, ou que jamais chegaremos a conhecer. Somos no fundo estranhos a todos eles, mesmo que os amemos em profundidade e em diversidade.
 
Posso estar certo. Devo estar errado. Mas esta é a leitura que faço da existência humana. Provavelmente alguns crerão, enquanto outros terão a certeza que dividem suas vidas em toda sua plenitude com os semelhantes, em nossa sociedade. Eu pessoalmente não percebo isto, percebo que sou solitariamente responsável por caminhar junto com a sociedade, sendo assim responsável pela realidade social de nosso mundo, mas sempre agindo de forma solitária, mesmo que em equipe.
 
Sou sinérgico por atitudes e comportamentos, mas sou solitário por experimentação desta mesma realidade e desta possível sinergia. Sou coletivo por ações e demonstrações, mas sou solitário enquanto ser pensante que escolhe e decide mentalmente o que fazer, o como fazer e o que ser. Algumas vezes ajo mesmo sem consciência, sendo levado a maioria das vezes por necessidades prementes e emergenciais, a agir por instinto e por reflexo. Sou solitário pertencendo ao todo, sou um pouco reflexo deste todo, sendo internamente solitário em meu viver e em minha apropriação deste viver.
 
Nossas vidas são sociais com certeza, posto que somos agentes de um mundo socialmente dinâmico, entretanto nossa existência pessoal é eminentemente unitária e solitária.
 
Somos reflexo de nossa mente e ela é para nós próprios um complexo quase inescrutável em sua profundidade e em sua revelação como ente mental, consciente ou inconsciente. Se para nós mesmos somos estranhos e quase isolados, mergulhados em nosso próprio mundo de segredos e mistérios, somos ainda mais arredios e desconhecidos para o mundo exterior.
 
Acredito que em nosso quase sagrado e continuamente mutável fosso mental existimos e experimentamos o que ninguém jamais será capaz de evidenciar. Entendo que por mais transparentes que sejamos, esta transparência é em sua existência efêmera e funciona apenas como uma fina mascara para o que realmente somos e experimentamos. Penso que somos únicos e complexos, somos múltiplos e indistinguíveis em nós mesmos, somos enfim solitários em nossos múltiplos seres mentais.
 
Somos apenas nós mesmos quem, em nossa solidão, e no secreto de nosso ser, vivemos e experimentamos nossos sofrimentos, nossas dores, nossos medos, nossas duvidas e nossas incertezas, por outro lado por mais que irradiemos alegria para o mundo, somos nós próprios que também experimentamos e vivemos nossos momentos de paz, alegria e felicidade, ninguém nos poderá roubar estes sentimentos, apenas nós mesmos os viveremos e os experimentaremos como seres solitários.
 
Ser solitários não nos exime de compartilhar e de dividir a responsabilidade do social.
 
Somos seres solitários enquanto independentes em nossos sentimentos mais secretos e marcantes, mas seria abstrair do real achar que por isto não somos seres sociais. Somente vivemos em totalidade quando parte de alguma comunidade, de alguma sociedade. Somos atores em um palco dinâmico onde todos os movimentos individuais se completam em uma sinfonia social. Posto desta forma somos responsáveis pela nossa sociedade e pelas mazelas desta sociedade, mesmo que sendo solitários em nossa experimentação deste mesmo mundo.
 
Aprender a conviver com nossa solidão é premente, mas abrir mão da sociedade é de uma maldade inestimável.


Arlindo Tavares
Enviado por Arlindo Tavares em 14/03/2011
Código do texto: T2847890
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