Difícil explicação

Os dias atuais estão mesmo difíceis. A dificuldade não se restringe apenas ao aspecto financeiro, motivado por baixos salários ou pela ausência deles. A cada dia, o brasileiro se depara com situações que nós, nordestinos, chamamos de “aperreio”.

Segundo o dicionário Houaiss, “aperreado” é a pessoa tratada como um “perro” ou perseguida por ele, e que a mastozoologia denomina de “cão”. A expressão "perro" é de pouco uso em nosso idioma vernáculo. Em sentido figurado, o termo aperreado é atribuído ao cidadão sem liberdade, oprimido, preso a interesses de poderosos semelhantes seus. Pejorativamente falando, corresponde ao indivíduo de má qualidade moral. Trata-se, pois, do canalha, do patife, e do tratante.

A maioria dos brasileiros não deve ser considerada velhaca. Nem mesmo um cão, embora, em alguns casos, tenha “vida de cachorro”. As designações canalha e patife devem ser atribuídas, merecidamente, aos políticos, com raras exceções, por não seguirem os princípios da boa conduta, da honestidade e dos demais valores que deveriam nortear suas relações sociais.

Diz, ainda, o insigne dicionarista, que, regionalmente (leia-se Nordeste), a expressão aperreado é própria dos que vivem ou estão temporariamente sem recursos financeiros. São muitos os endividados! A inadimplência do cidadão espoliado por muitos impostos, mal remunerado em seu trabalho diário, quando o tem, confirma o aperto em que vive.

O Brasil é habitado por boa parcela de perros, cães insaciáveis que se locupletam do dinheiro público, em detrimento de seus aperreados conterrâneos, sujeitos à exploração de sua ignorância política.

Os dias atuais estão mesmo difíceis, como disse no início. Reafirmo o meu ponto de vista, depois de analisar diversas facetas do cotidiano em que vivemos, e após ler e ouvir abalizados profissionais das áreas econômica, social, política e de segurança pública.

Esmeraldo, um velho e dileto amigo, disse-me certo dia, estar com dificuldades para explicar ao filho de catorze anos, a necessidade de conservar os valores morais, éticos e intelectuais, tão exaustivamente conquistados em passado distante.

Em diálogo com seu único herdeiro, perguntou-lhe:

– Que pretendes ser, quando cresceres?

– Presidente da República! – respondeu Marquinhos.

– Legal filho! Mas por quê?

– Não precisarei estudar. – respondeu o garoto.

Foi difícil a Esmeraldo explicar ao filho que não era assim. A vida exige grande soma de conhecimentos, de preservação da cultura e de valores morais e profissionais, sem o que não se obterá o êxito desejado.

O pai, preocupado com o desenrolar da conversa, disse ao menino que era necessário estudar. E estudar muito, para ser presidente da República, se ele assim o desejasse.

O garoto lembrou ao pai, de que o Lula concluiu apenas o ensino fundamental e tornou-se presidente da República, tendo o José Alencar como Vice, sem este ter estudado tanto quanto o magistrado tupiniquim.

O pai insistiu, dizendo:

– Não é assim, filho. Alencar trabalhou muito para chegar aonde chegou...

– Pai, todo mundo que se deu bem, não estudou quase nada. Veja o exemplo da Xuxa, do Kaká, do Zeca Pagodinho, do Ratinho; do Leonardo, o cantor sertanejo... – lembrou Marquinhos ao pai, contando dezenas de nomes nos dedos das mãos, insuficientes para enumerar tantos exemplos.

– Eles têm talento, filho...

– Estudar, então, é para quem não tem talento? – perguntou o jovem, ansioso por uma resposta que pusesse fim ao cansativo diálogo com o apreensivo genitor.

– Eles são artistas! – respondeu o pai.

– O presidente e o Vice são artistas?

– O presidente é um bom ator. Mas não um artista, embora se saia melhor do que muitos deles, em seus pronunciamentos fantasiosos. – respondeu Esmeraldo, lembrando momentos em que Lula causara risos a quem o ouvia.

– Pois bem, pai. Irei estudar se o senhor garantir que, estudando, ganharei mais que o Kaká, o Ronaldo Gorducho, o Ronaldinho, o Neimar, o Ganso...

– Não, filho, estudando, você ganhará muito menos.

– Ah, já sei! Vou ser político. Político corrupto. Enquanto mais desonesto, melhor. Ouvi dizer que eles nunca são penalizados por seus crimes. E se tornaram bastante ricos! Veja o Sarney, o Jáder Barbalho... e quase todos os que praticam o nepotismo. Não se preocupe, pai. Quando eu for político irei arranjar um bom emprego para você. E não precisa trabalhar! – concluiu Marquinhos, retirando-se da sala.

Esmeraldo encerrou a conversa com o filho. Em sua mente desfilavam nomes de pessoas que ficaram ricas. Veio-lhe à lembrança, o Faustão, a Hebe Camargo, o Datena... o Lulinha, e, proximamente, o Tiririca... e o Romário, que se recuperaria de ameaçadora falência...

O número era tão grande que congestionou os pensamentos de Esmeraldo, preocupado com “tudo isso que está ai!”.

Está difícil explicar aos filhos o que se passa nesse Brasil tingido de vermelho, corrupto e sem esperanças de dias confiáveis.

Estou deveras aperreado!