A MÚSICA E SEUS PODERES

O rei Saul tinha crises histéricas e se acalmava quando Davi tocava a sua harpa. A música de Davi era o acalanto para a ira de Saul. Não sou muito adepto de crises histéricas, mas tenho os meus momentos de fúria. A música “Pride” do U2 é meu Davi e sua harpa. Ela exerce verdadeiro domínio sobre mim. Acama-me o espírito. Domestica e adestra minha ira. Faz de mim um manso e afável cãozinho.

De todas as pessoas que conheço, com óbvia exceção dos surdos, meu pai é a única que não tem qualquer necessidade de música. Não tem nenhuma preferência musical. Para ele, a 5ª Sinfonia de Beethoven e uma moda de Reginaldo Rossi têm o mesmo peso: nenhum. Canção alguma consegue exercer um domínio sobre meu pai. Ele é um cidadão livre da magia que a música mantém sobre a alma humana.

Uma pesquisa conduzida por cientistas ingleses concluiu que algumas músicas podem ser até mais poderosas e eficientes para o desempenho de atletas que substâncias ilegais que são encontradas com freqüência em exames antidoping. Além disso, a música serve como um regulador do humor antes, durante e depois das atividades físicas. Leigo, este autor sempre desconfiou da ligação entre a música e a droga. Sem ter como provar, escondia minhas convicções no mais profundo armário. Bendita a ciência que agora prova a minha tese de que a música do Calypso, do Zezé di Camargo & Luciano e do Wando são mais fortes, vamos assim dizer, do que a maconha ou o crack.

Mais ciência: a Universidade de Columbia, nos Estados Unidos prova que música e medicina associadas têm se mostrado eficazes para tratamento, cura e alívio da ansiedade. Há mais de 3 mil anos, Davi e Saul já provavam essa teoria. Victor Hugo, escritor francês do século 19 disse certa vez que “a música expressa o que não pode ser dito e não deve ser silenciado”. Não consigo conceber a minha existência sem música. Vou além: o ideal seria ter trilhas sonoras para todos os momentos. Com certeza aquele beijo na chuva, aquele olhar de encantamento, aquela despedida ficariam eternizados com o auxílio divino da música.

Uma das minhas grandes frustrações é não dominar nenhum instrumento musical. Sinto-me um portador de necessidades especiais por não saber tocar. Esta condição me faz invejar qualquer músico de rua que toca em troca de moedas no seu chapéu. Eu seria muito mais feliz tocando flauta chilena em alguma praça ou saxofone nos becos de Paris.

Mas como não nasci com o dom de encantar produzindo música, posso me dar bem reproduzindo música: pesquisadores franceses chegaram à conclusão que música romântica deixa as mulheres (não apenas as francesas) mais suscetíveis às investidas masculinas. Preparam o terreno. A música romântica é uma espécie de preliminar. Na dúvida, Roupa Nova sempre dá conta do recado.

A Bíblia não faz menção sobre como se passou o encontro proibido entre o rei Davi e Betseba. Arrisco um palpite: Davi deve ter se aproveitado da sua habilidade musical para enfeitiçar a jovem senhora. Tal como acalmava os ímpetos de Saul, deve ter aflorado os hormônios de Betseba. Bendita a música! Maldita a música!

Anderson Alcântara
Enviado por Anderson Alcântara em 30/04/2011
Reeditado em 10/04/2012
Código do texto: T2940272