O Pregão e Eu

Manhã de uma quinta-feira de maio, igual a todas as manhãs de meus dias, não fosse o garoto amolador de facas com seu pregão. As palavras não são inteligíveis, pois é mais importante a entonação legítima dos pregões antigos. O fato me lembra a infância, quando passava pelas ruas do Bairro Funcionários, hoje consagrado como Savassi, o menino pregoeiro anunciando peixes e ovos. Como agora, as palavras também não eram bem claras. Lembro-me de  que eu não entendia a palavra "peixeiro" que me soava como "Teixeira" e não fazia sentido algum. Agora, distante no tempo, já não estou pensando nem nos pregões do amolador nem do peixeiro, mas na confusão que gera o ouvir mal as palavras. Vem-me à mente o conto de Guimarães Rosa FAMIGERADO e nele me mergulho.

Deixemos de lado pregões e Guimarães Rosa e voltemos ao presente. Passa agora um carro de som convidando a todos os moradores do bairro para uma manifestação em defesa de um patrimônio: o Mercado Distrital do Cruzeiro. Será que a Prefeitura irá entender o que representa aquele local para nós? Lá conhecemos cada fornecedor e cada fornecedor sabe o que compramos de frutas, biscoitos, verduras, queijos, doces... Mais do que um local onde se fazem compras, o Mercado representa pra nós um valor afetivo do qual não podemos abrir mão para satisfazer ambição de quem vai ocupar o espaço.

E, por falar em ambição, volta-me à mente o que hoje me preocupa. É uma dúvida hamletiana, não do Ser ou Não Ser, mas do Fazer ou Não Fazer uma opção. Acho mesmo que vou ficar quieta, deixando tudo como está e me esquecer da ambição salarial. Repetindo o velho ditado: "Fica tudo como dantes no quartel de Abrantes".

Bom, já falei de presente, passado e futuro, chega. Agora vou voltar à manhã de quinta-feira e retomar meus afazeres domésticos.

A todos que me leram, desejo um bom dia com o mesmo céu azul, salpicado de algodão, que vejo agora.