Porém, houve um preço: a minha solidão.

Sinto um cansaço secular que me abate a cada dia. Busco o silencio quando o encontro não me basta, quero coisas que não posso mais ter. Gostaria de viver uma vida profissional que não vai acontecer, pois o tempo foi desgastando tudo ao seu redor. Mesmo que existam chances de mudar, de reverter o meu fracasso profissional, sinto-me exausta, não quero mais nada. Sinto-me num oco, num vazio sem fim como se nada de bom pudesse acontecer neste momento. Estou cansada desta existência vivida através dos livros, da internet, das vidraças. Estou farta desta história de papel sem atitudes próprias, cheia de mofo e bolor. Tenho me perguntado quem sou eu? Sinto dificuldade de responder, olho-me no espelho e não me vejo mais, parece que não tenho mais o que fazer na minha vida. Ás vezes, o espelho reflete uma face que não me pertence mais: um rosto bonito, translúcido com poucas marcas, olhos escuros, intensos com pequenas rugas de expressão e um sorriso sempre estampado com dentes brancos e regulares, um corpo que o tempo e a maternidade não mudaram nada.

Olho e não vejo que os outros vêem, pois dentro de mim há uma angústia que não estanca, se esparrama ao redor de todos os meus atos. Ultimamente, nem os livros tem me segurado, das letras ando afastada. Sinto bastante vontade de ficar sozinha. As pessoas me perguntam: - Tudo bem? Respondo com meu eterno sorriso bonito de dentes perfeitos: - Sim tudo ótimo! Talvez as feias me odeiem ao ler este texto, pois já devem ter notado que sou bonita. Mas, isso não é garantia de felicidade, principalmente, quando a idade vem se achegando. Tenho um amigo que diz que o passar do tempo para quem sempre teve beleza é mais difícil de aceitar. Realmente, quando passamos a ouvir senhora muitas vezes ao dia é um choque e pior quando nos dizem:- não te aposentou ainda? A minha profissão é ingrata, trabalho, diariamente, com crianças, adolescentes e para eles ter 46,48 anos é sinal de velhice absoluta. Já sei, estão rindo de mim, mas, o meu cansaço é interno, é pela falta de sonhos, muitos dos meus desejos foram se perdendo pelo caminho. Um detalhe, os filhos cresceram, um está entrando na faculdade e outro está no Ensino médio.

Este texto tem três pontos: meus sonhos profissionais não realizados, a idade se encostando em mim e os meus filhos que não precisam mais de mim. Eu sei que tudo se mistura em nossa cabeça, pois não temos compartimentos para separar, catalogar nossas dores. Elas vem se instalam e vamos pensando, analisando, assim chegamos a algumas conclusões, às vezes, insanas. Porém, são sempre arremates para vivermos melhor. Em primeiro lugar, ainda sonho com o meu doutorado, a minha casa própria, é dolorido assumir isto. Porém, é melhor aceitar as minhas limitações financeiras do que inventar uma vida ficcional. Em relação à idade, o tempo passa, ele é inexorável destrói tudo ao redor. Surgem as rugas, cabelos brancos e tudo que vai mostrando o DNA avançado de cada um de nós. Não, não me fale da dona sabedoria (odeio), o espelho, principalmente, se for grande, não se importa se somos cultos ou não. A pior parte são os filhos e a independência do crescimento. Eu os criei para vida, ensinei-os desde muito cedo a ter liberdade, acreditar que é ótimo viver, ter amigos, sorrir, enfim curtir a vida. Também os ensinei a ter respeito pelo outro, educação e ética, direcionei-os para construção de um ser humano integro. Porém, houve um preço: a minha solidão. Simples. Não, muito dolorido, crescer em qualquer época dói.

13/05

Marisa Piedras
Enviado por Marisa Piedras em 13/05/2011
Reeditado em 15/05/2011
Código do texto: T2968219
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.