Uma manhã de domingo e a doce tortura das lembranças

Há dias em que nossos pensamentos teimam em reviver histórias que já vão longe no tempo. Umas até muito agradáveis, outras nem tanto. E uma pequena parte de nossa vida, é bem verdade, gostaríamos de nunca ter lembranças dela. Mas a memória é implacável, sádica se é que assim pode ser considerada quando nos faz retroceder no tempo e nos leva para pedaços de nossa história pessoal que deveriam ser deletados definitivamente dos arquivos de nossa memória. Mas se não tem jeito, remediado está, diria minha avó numa situação assim.

E nesse tim, tim, tim, vamos levando as coisas com essas lembranças atormentando, vez por outra, nossa vida. Hoje é um desses dias... Voltar ao passado, recordar que não é vivier num caso desse, mas sim sofrer num “recall” desnecessário e impiedoso. Tudo é tão estranho quando o passado nos assalta e nos aprisiona em lembranças amargas cujas cicatrizes do momento ruim ainda pingam dor e angustia.

Mas cá estamos nós, há mais de cinco horas lutanto para espantar o flagelo dessa inútil e tortuosa lembrança que teima em brincar de esconde-esconde com meus preciosos minutos de uma manhã dominical. Finge que sumiu e quando menos se espera, lá está a memória novamente pertubando a paz do sono com as malditas lembranças. Vira, revira, vira de novo, busca novos pensamentos enveredando pelos mais luxurientos possíveis, tenta encontrar uma saída do labirinto da memória não quista e, nada... nada... e mais nada. Apenas a ilusão que as lembranças se foram... ledo engano voltam com força... com a mesma força da dor que as guardou como mágoa.

E assim, de instantes e instantes, a manhã vai se arrastando pelo dia que promete tornar-se um inferno quando não mais aguentar a pressão das lembranças e cair em pranto. Ou sei lá o quê. Mas sei que meu domingo não será de praia, de sol e de cerveja gelada. Tão pouco terei os amigos ao meu redor para longas e divertidas conversas regadas a risos e “causos” de garotas e aventuras. Não... meu dia hoje será de hibernação... Será mais um dia onde me esconderei do mundo nas malhas da saudade, da vontade de acreditar que nada do que aconteceu é, ou foi, verdadeiro. Um dia quando meu coração se despedaça por inteiro e as cicatrizes que o costuram são ponteadas pela solidão.

Mas inútil é resistir às lembranças. Guerrear contra o inevitável. Cercear a incontida vontade de voltar e sentir novamente os beijos que adoçaram minha boca, o corpo que escondeu meu corpo, a mulher que me acolheu dentro de si e me fez Deus por minutos, segundos que seja, mas me deu o dom de criar o mundo sem miséria, sem dor, sem fronteiras, sem discriminação, sem medo de ser homem no corpo da mulher amada.

Me dobro as lembranças como o menino que adormece sonhando com o amanhã.

Marcus Ottoni
Enviado por Marcus Ottoni em 15/05/2011
Reeditado em 15/05/2011
Código do texto: T2971005
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