Navegar é Preciso

Navegar é preciso

O mar é azul, o tempo está calmo e não se percebem turbulências.

Aí eu questiono e me pergunto:- Assim está bom?

Como diria o não poeta, o falso poeta, um poeta qualquer como eu, e que como eu vai escrevendo bobagens e mais bobagens, e que não tem a pretensão maior que não seja comunicar as próprias angústias:- Está calmo, está bom?

Quanto ao verdadeiro poeta, ele é diferente de mim, porque, ele, sapiente e profundo, observa com critérios de razões conhecidas, para validar o pensamento, ou a percepção de querer saber ou pensar de que se é capaz de filosofar o silêncio da alma.

- “São demais os perigos dessa vida”

Não arriscarei jamais a tentação de ouvir essas pausas ou intervalos.

Eu não seria capaz de ouvir o grito, o sorriso, o choro, e nem mesmo a oração das ansiedades que não fossem as minhas.

No entanto, imagino que todos nós saímos para o mar, como os peixes e, como eles, não apenas pelo sabor do alimento que consomem. Somos iguais.

Os peixes se realizam também na melodia das ondas do mar, o peixe poeta.

Às vezes, como os peixes, nós não trazemos nada e ficamos tristes, mas nós sabemos como eles sabem que navegar é preciso, essencialmente necessário.

Em nossa ida ao “mar”, como os peixes, pescamos sentidos, pescamos conversas, pescamos sensibilidades, pescamos olhares, mas, e principalmente, pescamos as coisas que dizem para nós que existe uma relação de necessidade entre o objeto da pescaria e o sujeito pescador.

Vamos ao alimento quando temos fome.

Vamos às conversas quando precisamos comunicar.

Vamos aos olhares quando precisamos ver e precisamos ser vistos.

Vamos às sensibilidades quando precisamos nos perceber sensíveis.

Sempre, portanto, uma relação que justifica o passeio a justificar a necessidade de navegar.

É muito interessante observar, quando estamos pelas ruas andando sem destino, pescando o tempo que não passa, esse aglomerado de criaturas, todas em busca das próprias pescarias.

E eu digo criaturas porque acontece com homens e animais.

Já observei cachorros que pescam lixos, pássaros que pescam migalhas, gatos que pescam novelos.

Mas também tenho observado crianças que pescam a bola, comerciantes que pescam clientes e clientes que diluem seus dias pescando mercadorias que nem sempre necessitam.

Todos ao mar.

Vejo o frenesi ostensivo de um dia inteiro, uma vida inteira, dessa gente, como nós, que se vai lançando às águas.

E sei que, por diversas vezes também, nos surpreendemos pescando a nós mesmos.

Além do mais, é realmente interessante observar a relação estabelecida entre o objeto fim e esse sujeito ativo. Agentes e complementos.

Uma vez ouvi um menininho apontar para o céu e dizer:- Mãe, a pipa está buscando o vento.

Entendo assim : - A pipa está pescando o vento.

Até a inanimada pipa com suas necessidades.

São os complementos.

Como se pode ser pipa se não existe o vento?

Essas coisas todas, portanto, acontecem porque existem, e são aquilo a que chamamos de realidade.

E mesmo o vento que venta, aparentemente aqui, é um processo que nasce nas longínquas regiões existentes dos pólos, complementando e complementando.

Isso é realidade.

Pescam-se ainda as roupas para as vaidades, os pedaços de pão velho pelos mendigos, e, no caso dos peixes, até uma porção de minhoca.

Mas se existe algo de comum em tudo que se pesca, também existe uma expectativa de que o pescado estará sempre por perto, complementando.

Impossível a existência de lojas sem objetos, lixos sem restos, conversa sem palavras, expectativas sem respostas.

São os frutos dos complementos necessários

E se somos capazes de saber que podemos ir ao mar, resta acreditar, como os peixes, que o anzol e sua iguaria estarão por perto.

E tudo isso também é realidade.

Assim, eu sigo observando o mar calmo e o balanço quase imperceptível desse navio em que preciso pousar por fazer parte de todo um contexto.

E observo quieto o movimento das ondas que esse mar às vezes me trás.

Está calmo está bom, mas somente e tão somente se for um mar absurdamente cheio de sentidos.

Um mar para os peixes sonhadores.

Navegar é preciso, e quanto é preciso!

Piloto
Enviado por Piloto em 02/06/2011
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