Aquele tal de Chico

Esta crônica poderia ser mais um grito no vácuo: irmãos, o que andais a ouvir?

Mas não adianta gritar. Melhor falar com calma.

Os irmãos, primeiramente responderão: Ouvimos o educativo e sempre tão primoroso sertanejo universitário. Sim, eles ouvem. A toda hora. No carro, na ‘balada’, na televisão e na escola (não necessariamente de nível superior como o nome do estilo induz). E sabem, eu também ouço! É um ritmo tão bom, convidativo, dá vontade de dançar. As letras das músicas logo ganham os ouvidos e penetram fundo na memória. Difícil esquecer um ‘sou foda, na cama te esculacho...’

O resto da letra da música, infelizmente, eu não lembro. Mas a parte importante ficou: ‘sou foda, na cama te esculacho’. Todo mundo canta. Não só os homens, mas as mulheres, as vovozinhas mais modernas e por que não, as crianças. É fácil de decorar, o ritmo é harmonioso, simples e inconfundível: ‘sou foda, na cama te esculacho’. Eu não consigo parar de cantar! É como um vício. Quando vejo, já cantei.

Mas sabem da grande verdade? Eu também canto outros estilos, não obstante ser este o único que ouço ultimamente. Eu conheço um pouco de Chico Buarque, entendo ligeiramente do rock dos Beatles e adoro pesquisar bandas alternativas na internet.

Então, reformulo a pergunta: O que andais a ouvir, irmãos? Os irmãos, da faixa etária dos 12 aos 30, dirão: Ouvimos, ‘sou foda, na cama te esculacho’. E só.

Eu não lhes tiro a razão. A música é boa, tá na moda. Não critico a letra. Não sou feminista nem puritana para tanto.

Ora... Ouvem os irmãos o que querem! Pena que a banalidade lhes tira um pouco de musicalidade. Sim. Musicalidade é conhecer de musica, em seus amplos e intangíveis aspectos. Conhecer de estilos, navegar por sintonias. Música é poesia, rima, perfeição de tons e sons. E se eu ouço apenas um único tom e som... Eu não tenho a mínima musicalidade.

Mas em que isso importa?

Importa em possuir horizontes estreitos. Se eu não conheço a música que ‘os outros ouvem’, eu também não ouço o que os outros dizem. Eu só conheço uma parte da realidade: aquela que me é (im)posta. E aí o problema da música é só um reflexo:

Hoje, os pais ensinam aos filhos como ganhar a vida. E se orgulham disso. Eu ainda não cheguei ao estado magnífico da paternidade, mas quando chegar lá, sabe o que direi?

-Meu filho, conquiste a vida! Saia em busca de outros métodos, outros estilos, outros sons. Conheça as várias parcelas da realidade que estão disponíveis, e depois, escolha de qual será partidário!

A música é uma metáfora pra falar da indolência dos jovens. Eu ouço o que os outros ouvem, eu faço o que os outros fazem, eu conheço (o pouco) que os outros conhecem. E todos viram tão iguais! Todos cantando como um grande coro:

Sou foda, na cama te esculacho!

Música de uma nota só. Um único refrão.

Mas a culpa é mesmo da ‘mídia’, dirão os corações mais revoltosos. Ela é que deixa de abrir o ‘leque’ de opções. Verdade. E mentira. A mídia é um meio de comunicação. Certo? Sim! Então, por que não procurar outro meio de comunicação?

Qual? Sobrou algum? O mais primitivo, talvez obsoleto, deles: a conversa. A boa conversa com gente ‘diferente da gente’. E se ela não bastar, eu procuro a única mídia que não é de massa: a internet. Ela nunca será de massa. Eu vejo o que quero, o que preciso, o que entendo e o que procuro na internet. O Google não é instrumento de uma nota só. Ele apenas ‘espera’ que você dê o primeiro acorde. E logo, está-se diante do que separa o mundo de todos do mundo de um só: a palavra- chave. É só digitá-la.

Talvez surja uma incontrolável vontade de digitar o ‘sou foda, na cama te esculacho’, na próxima visita ao Google, só pra ver no que dá o resto da música. Ou quem sabe, conhecer mais sobre aquele cara, aquele tal de Chico Buarque.

Andrea Sá
Enviado por Andrea Sá em 15/06/2011
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