PASÁRGADAS BRASILEIRAS

Há algumas coisas que fazem de nós, brasileiros, seres únicos em todo o mundo. O tão propagado jeitinho brasileiro é uma delas. A criatividade é certamente outra característica. Nossa coleção de misérias faz com que usemos da inventividade para garantir a sobrevivência. Acontece que o brasileiro estende essa qualidade para todas as áreas.

Em um momento raro de ócio, debrucei-me sobre um catálogo com o nome de todas as mais de 5 mil cidades brasileiras e, como em um roteiro de humor, garanti minha ração diária de gargalhadas. Há cidades com nomes tão exóticos que desafiam a nossa credulidade. Confesso que fiquei tentado a fazer um tour por essas pólis. Acabei de desmanchar meus planos futuros e utópicos de conhecer Paris, Praga e Budapeste. Quem precisa ir a Paris, na França, quando pode muito bem ter momentos de felicidade em Naque-Nanuque, em Minas Gerais? Duvido que Praga, na República Tcheca, seja tão interessante como Coité do Nóia, em Alagoas. Budapeste, na Hungria, não é nada se comparada a Pessoa Anta, no Pará.

Fico a imaginar a surpresa e a felicidade do viajante que, desavisado, acaba de chegar à cidade de Chá de Alegria, em Pernambuco. Impossível estar triste num rincão como esse. Como serão chamados os habitantes de Jijoca de Jericoacoara, no Ceará? Tal dúvida fez com que este curioso autor se debruçasse sobre compêndios geográficos. Descobri que quem nasce em Jijoca de Jericoacoara é jijoquense. Acabei sabendo também que a cidade é rica em belezas naturais, especialmente em praias paradisíacas. Um verdadeiro paraíso. Jijoca significa, segundo a língua tupi, “morada das rãs”. Jericoacoara é algo como “toca das tartarugas”.

Constrangidos devem ficar os habitantes de Pintópolis, em Minas Gerais, quando participam de algum congresso intermunicipal. Imagine um mestre de cerimônias apresentando a delegação da simpática cidade de Pintópolis. Enigmática para mim é a cidade de Varre-Sai, no Rio de Janeiro. O cidadão varre-saiense deve ter muita dificuldade para passar incólume em outra cidade quando alguém descobre de onde ele é oriundo.

Triste mesmo deve ser morar em Bela Solidão, em Pernambuco. Quase todos os municípios brasileiros são conhecidos por sua produção agrícola. Por exemplo: Araguari (MG), pelo café. Jataí (GO), pelo milho. Sorriso (MT), pela soja. Quero imaginar que o município de Bela Solidão seja um grande produtor de poetas. Creio que não haja terreno mais fértil para se cultivar a poesia do que lá. Casinha do Homem, na Paraíba, é para mim um exemplo de criatividade exótica. Fico imaginando o momento de sua concepção. Um grupo de notáveis pioneiros se reúne com o propósito de escolher um nome para a nova cidade. Após horas de debates calorosos e votações, a assembleia, enfim, tem um veredicto: Casinha do Homem! Confesso que minha imaginação não ousa compreender tamanha criatividade.

A lista é enorme. Inclui ainda Peixe Gordo (CE), Jacaré dos Homens (AL), Corta Mão (BA), Nhecolândia (MS) e Passo do Sabão (RS), só para citar os nomes mais simpáticos. O poeta Manuel Bandeira sonhou com Pasárgada, terra de prostitutas bonitas para namorar. O povo hebreu, cativo no Egito, sonhou com Canaã, a terra que mana leite e mel. Sou menos exigente. Minhas malas estão prontas. Na próxima oportunidade ganho a estrada, enfrento poeira e buracos, mas não descansarei enquanto não chegar a Passa e Fica, no Rio Grande do Norte. Como o nome da cidade sugere talvez eu fique por lá. Lá serei o mais feliz dos homens.

Anderson Alcântara
Enviado por Anderson Alcântara em 19/06/2011
Reeditado em 10/04/2012
Código do texto: T3044622