Onde está o Silvio?
 
 
     O menino subiu as escadas e tocou a campainha. A dona da casa abriu e o menino pediu: chama o Silvio para mim? A dona da casa respondeu:aqui não tem nenhum Silvio. O menino voltou-se e desceu as escadas intrigado: Mas eu vi ele subindo agorinha mesmo! No mesmo instante a dona da casa recobrou a memória – Deus! Ele estava procurando o Ronaldo!
 
     O nome dele deveria ser Silvio Heleno. Foi o pai quem escolheu. Silvio sabe se lá a razão, mas Heleno porque era o nome de um famoso jogador do Botafogo – Heleno de Freitas, um gentleman. A mãe, bateu o pé: Heleno, nunca! Vai ser Ronaldo.  E assim começou a vida de Silvio Ronaldo Alves de Melo, meu irmão, Ronaldo para a família e para todos que o conheceram ainda em Arantina.
 
     Eles eram muitos, os meninos, que logo o aceitaram em seu grupo. Três se destacaram e permaneceram amigos por toda a vida, amigos também da família. Roberto, o Bob, Juarez, o Juá, e Ronaldo, do Bar do Ponto. Então quando ele chegou, é óbvio que também não poderia ser Ronaldo. Foi ser Silvio, no máximo o Ronaldo da Padaria Rocha.
 
     Madrugada fria de começo de inverno – 23 de junho de 2008. O telefone toca e eu, embora ainda não tivesse dormido, recuso-me a levantar para atender. Sei o que virá pelo fio e não quero ouvir nem repetir. Estamos ligando para avisar que o senhor Silvio Ronaldo Alves de Melo acaba de falecer. Valéria levantou-se, ouvi os sons da conversa e tampei os ouvidos. Quando ela bateu na porta de meu quarto e em seguida abriu, fui logo dizendo: Eu sei, não precisa falar. Fiquei ali deitada ainda por um tempinho, depois levantei-me, vesti roupa adequada e subi as ruas que ele nunca mais veria. Quando cheguei ao meu destino ele estava lá, a minha espera. Tão bonito e tranqüilo que dava dó imaginar que nunca mais ele teria a alegria de viver. Pelo menos por aqui. Fiquei até o fim, para dizer adeus.
 
     Ele viveu intensamente, uma vida que achávamos perdida, desperdiçada. Inteligente, bonito e interessante passou a vida buscando a felicidade e lutando contra as adversidades: o alcoolismo e a deficiência visual, que nunca aceitou. Nunca pensei que esse fosse o seu final, assim, dessa forma. Em abril uma dor que supunha ser de dentes, a recusa em procurar ajuda, o encaminhamento forçado para a terrível descoberta – um câncer na cabeça, bem frontal, a cirurgia, a desistência. Recusou-e a lutar. Outros, já doentes antes dele, recusam-se a desistir. Ele não. Estava cansado.
 
     Muita gente diz:Minha vida daria um romance. Eu digo: A vida de meu irmão Ronaldo daria muitos romances que nunca serão escritos. Eu não faria isso, seria repetir o sofrimento outras vezes. Mas escreverei minhas crônicas sempre que achar pertinente. E quando alguém perguntar:onde está o Silvio? Como já aconteceu, mais de uma vez, certamente direi: em meu coração.
 
 
 
 
 
 
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