Eu, a pedra e a estrada

O menino andava por uma estranha estrada, estrada no meio do nada, sem princípio, sem fim, sem cor, sem curva. Ao norte, ao sul, eu procurava e, além do menino que andava, nenhuma paisagem. Tentei alcançá-lo em vão, sucumbiu aquele nada. Sumiu-se. Abandonado, respirei fundo e continuei a trilha. Caminhei e caminhei e caminhei – e assim, quase em êxtase, deslumbrei uma pequena pedra, uma pedra em meio aquele nada. Agora era eu, a pedra e a estrada.

Pedra quebra a tesoura, tesoura corta o papel, papel embrulha a pedra. Era assim a velha brincadeira. Como num jogo, segurei a pedra e arrisquei um pensamento: - um lago margeando a estrada. Um sonho dentro do sonho e uma atitude anunciada; a pedra encontrando a água. Nada, não havia nada, apenas o sorriso do menino que, também do nada, ressurgira lépido. Seus olhos indicavam a mão que segurava a pedra e, suplicante, esperava. Sem palavras, atirei a pedra.

Os sonhos encerram visões sem tempo e, acredito na possibilidade de serem nossa melhor realidade. Um mundo de alternativas, onde passado, presente e futuro convergem, promovendo um turbilhão de ondas que rebentam e transmutam na consciência. A poesia justificando a condição humana de compactuar com o universo em todas as dimensões. Pedra, papel, tesoura. A velha brincadeira que, ao contrário do sonho, resume o círculo da vida que, implacável, condena, julga e aprisiona o homem a seu próprio destino.

A pedra cortou aquele nada e, do nada, explodiu em sete cores, iluminando a estrada e descortinando um paraíso que nunca imaginara merecer.

Marco Araujo
Enviado por Marco Araujo em 02/12/2006
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