Alternativas

O poeta grego Terêncio dizia, "nada do que é humano me é estranho", ou seja, posso, sem ter experiência directa de certas situações humanas, compreender a dimensão concreta do sofrimento do "outro". Aleatoriamente escolho uma notícia que constitua um exemplo, um exemplo que atinja a nossa sensibilidade e nos provoque, simultaneamente, impotência e revolta. Mas, não nos iludamos, a frase do poeta ganhou novos contornos. A sociedade moderna é talvez, como nunca, a expressão de um novo tipo de solidão. Quanto mais a "aldeia global" se expande e a comunicação é omnipresente, mais, paradoxalmente, cada um dilata a impossibilidade de "ser presente". Tornámo-nos seres anónimos, ou pior, o outro para mim é o estranho, o seu sofrimento é apenas aquilo que eu não quero para mim. Os exemplos proliferam na comunicação social, mediando a realidade que nos chega todos os dias, perante a indiferença colectiva e anódina. Tenho um olhar desencantado sobre o que têm sido as nossas escolhas, que, por anomia social, demissão ou omissão, a todos responsabiliza e não deixa ninguém impune. Não há inocentes. A política é demasiado séria para ser entregue apenas aos políticos, alguém já disse. A sociedade civil pode fazer muito mais, participando e intervindo nas grandes questões que a todos dizem respeito. O modelo de desenvolvimento à escala universal está esgotado, faliu. A ética e a moral são o resultado de uma economia que molda um certo perfil axiológico onde os valores são os do sucesso, do consumo e do individualismo. É urgente levar até às últimas consequências este niilismo e inventar outros projectos que tenham como objectivo a transformação da política. Fizeram-nos acreditar no fim das utopias, apresentaram-nas como premonição de novos e mais sofisticados totalitarismos. Ora, a utopia é possibilidade sempre aberta, inscreve-se no imaginário colectivo, expressão do desejo que mobiliza os homens para outras formas de existência. Ela pode ser "o que impede o horizonte de expectativa de se fundir com o campo de experiência". Continua Ricouer, é "aquilo que mantém o afastamento entre a esperança e a tradição".