O medo cortou minhas asas

Lembro ser destemida a pessoa que fui quando criança. Livre. Talvez até inconsequente, agindo mais por impulso do que pela razão.

Mas a vida me podou ao longo dos anos e me regou de medos inúmeros que hoje já estão entranhados em mim. Fazem parte de quem eu sou. Definem minhas reações. Determinam que meus passos sejam inseguros, imprecisos.

Com o tempo, acumulei traumas que me fazem calcular milhões de prós e contras antes de tomar uma iniciativa. E vi tantos horrores que passei a andar com o olhar baixo, esquivo, atormentado com pensamentos tortuosos.

Não há mais quase nada de destemido em mim. Hoje, não nado para longe da beira do mar, não viajo apreciando a paisagem, não durmo relaxada com o amanhã. Temo a fúria da correnteza, os precipícios nas estradas. Temo abrir meu coração.

Os medos foram transformando meu reflexo no espelho, acusando feições de amargura e o peso do tempo. Daí o meu sorriso trêmulo que pouco se sustenta sincero.

O terror me deixa acurralada em cantos de parede enquanto observo a vida passar. Fico ali, longe de tudo, fingindo que, isolada, meu mundo é mais seguro. Mas eu, na verdade, só sofro...