ACREDITE: HERMAFRODITA JÁ FOI HERMAFRODITO

Acredite: hermafrodita já foi Hermafrodito

Quem gosta de mitologia (de mito = fábula, história + logia = estudo, tratado) sabe que os deuses eram seres que também agiam como humanos. Parece que os gregos daquela época se recusavam a criar, ou a aceitar, um deus que fosse imponderável, inalcançável, inatingível, esmaecido. Seus deuses eram sim seres concretos, viventes e semoventes, especiais, e, tendo seu templo e morada no Monte Olimpo, não abriam mão da convivência com os humanos, misturando-se a eles e agindo corriqueiramente como eles.

Aliás, o deus supremo, Zeus ou Júpiter, casado com Hera (Juno para os romanos), era o que mais agia como humano, mas sempre em relação às deusas e às nossas mulheres. “Nossas”, no caso aqui, são as humanas. E é de Zeus, em união adúltera com Maia, que nasceu Hermes para os gregos ou Mercúrio para os romanos, o deus dos viajantes, dos mercadores e dos ladrões.

Só pra comprovar como os deuses agiam como nós, basta ver a quantidade de mulheres reais (fora as deusas!) que foram possuídas por Zeus, ou seja, sexo também movia os deuses. Esse ser cheio de volúpia (aliás, Volúpia é também uma deusa da mitologia greco-romana, filha de Eros e Psiquê) era insaciável em suas conquistas amorosas. Usava os mais interessantes disfarces para atingir seu constante objetivo: ter nos braços sua escolhida. Sua esposa, feroz e furiosíssima, distribuía castigos e maldições a filhos e amadas de Zeus.

Hermes, filho de Zeus e Maia, nasceu com algumas qualidades logo notadas pelo pai: assim que nasceu, já se transmudou e praticou seu primeiro roubo, surrupiando 50 cabeças do gado sob responsabilidade de Apolo, que não estava presente porque estava curtindo a presença de seu amado Himeneu (cujo significado é enlace matrimonial, bodas, festas, núpcias: como se vê, a relação homossexual também era uma das características de vários deuses).

Não o roubo propriamente dito, mas a agilidade com que Hermes ou Mercúrio ia de um lugar a outro, sem deixar um rastro sequer, foi o que chamou a atenção do pai, que o transformou em seu mensageiro. A confiança no filho e a conseqüente proteção divina só se manteriam se a mensagem fosse comprovadamente recebida pelo destinatário.

Herdando a volúpia do pai e sendo de beleza apolínea (aliás, era irmão de Apolo, outro filho de Zeus), Hermes destroçava corações. E foi aí que a coisa pegou: de sua união com Afrodite (Vênus para os romanos), uma de suas várias parceiras, talvez a mais bela, nasceu Hermafrodito (nome resultado de Hermes e Afrodite), deus também de intensa beleza e apaixonante, bem diferente de seu irmão Pã, um ser híbrido, parte homem, parte bode, filho de Hermes com a ninfa Driopéia. Outra ninfa (as ninfas eram criaturas de beleza rara, sempre jovens e destinadas a servir os deuses), Salmácida, que morava num lago, apaixonou-se perdidamente por Hermafrodito, que não correspondia a esse fervor. Ela fez de tudo para seduzi-lo, mas sempre foi repelida.

Num belo dia, Hermafrodito, não vendo qualquer movimento no lago da ninfa, resolve entrar e tomar um refrescante banho. No entanto, a ninfa estava escondida e avançou para o mancebo, agarrou-o com volúpia, encostou os peitos nele e apertou-os contra o peitoril do deus, implorando aos seus deuses protetores que não permitissem que os corpos se separassem.

Atendida, os corpos da ninfa e de Hermafrodito fundiram-se num só, tornando-se um ser híbrido, andrógino, hermafrodita.

Hermafrodito, revoltado com essa situação, jogou uma maldição ao lago e a todos os jovens que o freqüentassem. Segundo uns, a maldição castigava os homens que entrassem no lago a ficar impotentes. Segundo outros, eles também ficariam hermafrodita.

De dois mil e quinhentos a três mil anos após essas deliciosas histórias da mitologia greco-romana, no século XVIII, uma tendência religiosa dos grandes enciclopedistas franceses, Diderot, Voltaire, dentre eles, chamada Deísmo ou Teísmo, apregoava que aqui se faz, aqui se paga, ou seja, é com com a justiça dos viventes que se presta conta. Parece que essa também era a lei entre os deuses e humanos da era clássica greco-romana.

Prof. Leo Ricino

Julho de 2011

Leo Ricino
Enviado por Leo Ricino em 29/07/2011
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