UM ANIMAL CHAMADO CAVALO

Nunca montei um cavalo. Se tivesse vivido na Idade Média eu seria um sujeito fora de moda. Andaria a pé. A minha falta de intimidade com os cavalos não me faz insensível, porém, para com a sua condição hoje dentro do cosmo. Com o perdão do trocadilho infame, o cavalo caiu do cavalo ao longo dos séculos. Resolvi explorar um pouco a sua saga de glória e ocaso. Uma espécie de homenagem ao mais útil amigo do homem.

Comecemos com a literatura. Ao perder seu cavalo em plena luta, o rei britânico Ricardo III exclama: “Meu Reino por um cavalo!”. O relato é do dramaturgo William Shakespeare, na peça Ricardo III, escrita no século XVI. No calor da batalha, o cavalo do monarca é atingido. Ricardo III vai ao chão. Desesperado, ele oferece todo o seu reino por um simplório animal.

Quem hoje vê o cavalo reduzido ao ofício de fazer pequenos fretes como transportar sacos de cimento, latas de areia e móveis usados, entre outras coisas, não imagina que o animal já foi símbolo de nobreza e esteve presente nos mais decisivos momentos da história da humanidade.

Durante séculos, todas as batalhas e guerras eram travadas sobre lombos de cavalos. Até o século XIX, o cavalo era o principal meio de transporte. Era o motor das carruagens que levavam reis, príncipes e nobres. Com a força do cavalo escoavam-se as produções agrícolas.

O ostracismo do cavalo teve início com a Revolução Industrial, no século XVIII, na Inglaterra. Foi nesse período que o animal passou a ser substituído pelas máquinas no sistema de produção. A Inglaterra foi a grande vilã na história do cavalo. Foi lá também, com a inauguração da primeira ferrovia, em 1825, que o eqüino deixou de ser o principal meio de transporte terrestre. Secundário em áreas que antes reinava absoluto, o cavalo teve no campo militar um trunfo que ainda lhe renderia muitas glórias.

O que seria de Alexandre se não contasse com o lombo cingido de um bom alazão? Napoleão ficou célebre por suas conquistas militares. Não se sabe o nome de seus subordinados, mas até hoje o senso comum comenta sobre o cavalo branco do corso. É um engano pensar que este tipo de animal foi aposentado nas batalhas do século XX. Só a título de ilustração, mais de 50 mil cavalos foram mortos durante a II Guerra Mundial, o que mostra a sua importância militar, mesmo em tempos de tecnologia e veículos modernos.

Mas o tempo foi cruel com a trajetória do cavalo. A modernidade o reclassificou como um simples integrante do reino animal, não mais reconhecendo seus dotes utilitários que por séculos serviram à humanidade. Exilado dos campos de batalha, corpo estranho ao transporte de príncipes e súditos, matéria obsoleta para a produção industrial, ao cavalo ainda resta algum brilho em competições como o hipismo. O esporte é o último reduto nobre do cavalo, uma espécie de área de preservação da espécie como ser encantado.

Anderson Alcântara
Enviado por Anderson Alcântara em 29/07/2011
Reeditado em 10/04/2012
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