Necessidades inventadas

O mundo quer que você consuma. Aceite isso. Feudalismo, Comunismo, Capitalismo, qualquer “ismo”, o sistema para se as pessoas não querem algo que ainda não possuem. Até se leões perderem o interesse por zebras e estas não comerem mais vegetais, declara-se arruinado o ciclo da vida.

O agravante é sermos reféns do exagero do consumo. Não basta querer... tem que desejar muito, quase tudo, constantemente, como se cada produto enfiado no mercado fosse essencial. E o que não falta é coisa nova para se sonhar em adquirir.

Depois que lançaram o vídeo game, por exemplo, ninguém quer ser a criança que se distrai de graça brincando de amarelinha. Para ser “cool” e ter assunto com os colegas, necessita-se respirar tecnologia. Como se fora disso fosse impossível conhecer o verdadeiro sentido da diversão. Afinal, se há bonecos que falam, fazem xixi, atiram, por que sofrer o esforço de imaginar diálogos e ações?

E nem pense que apenas pimpolhos são vítimas dessas tentações. O mercado quer seduzir gente de qualquer idade, sexo e religião. Para isso, traz ao mundo as mais loucas variações das coisas. Desde um livro escrito para explicar a história lida em outro, até um relógio que serve de lanterna e calculadora.

Pior ainda é saber que tudo é divulgado como revolucionário, a melhor invenção do milênio, mas é produzido para durar pouco – devido a baixa qualidade ou porque logo ficará ultrapassado. A nova versão de TVs é 1mm mais fina do que a sua. O depilador que você comprou há dois meses agora já vem com um fantástico mecanismo massageador.

Por aí vai. Quem baixa a guarda é sugado pelo sistema e jamais vai parar de consumir. Pense nos cinco próximos itens que você quer adquirir. Daqui que termine a lista, você lembrará de algo mais para comprar – nem que seja para substituir um objeto “antigo”.

A situação é mais arriscada se você está montando um apartamento, como eu. Mil pessoas perguntando o que você quer, 500 listas do que é essencial, e 900 bilhões de produtos paquerando contigo nas lojas.

É fazedor de pão, panqueca, muffin, arroz. Cortador de bagel! Potes individuais para esquentar manteiga! Vassoura de cerda angular, reta, curta, longa, fina, grossa, macia, mista. Travesseiro para dormir de bruços, de lado, de costas, de conchinha... Máquina de café, chá, chocolate quente (?!). O que houve com simplesmente pôr leite e Nescau na panela? E o que é esse lance de 100 tipos de prego, parafuso, rolha, e suas respectivas ferramentas?!

Meu voto é por um mundo simples, para filtrar essas essencialidades inventadas. Porque a maioria desses cacarecos é tão absurdamente desnecessária que jamais existiria se não representasse a chance de alguém no planeta fazer mais dinheiro.

Convenhamos, uma faca simples, tradicional, serve para fatiar bagel, pão, carne, ovo, frutas e queijo sem sacrifício. O que te poupa de comprar muitos cortadores por aí de design específico, cuidadosamente desenvolvido por cientistas cegos da Tanzânia.