O amor tem dessas coisas

José Severino dos Santos conheceu Inacinha no interior de Limoeiro em Pernambuco, ele jovem vendedor prestanista, veio do Recife para tentar a vida como comerciante no interior. Ele, de coração puro e bom físico, acordava cedo e caminhava quilômetros para oferecer seus produtos e cobrar aos devedores. Uma coisa que sabia fazer era estipular preço. Ele comprava seus produtos no atacado e vendia com mais de 100% de lucro, pois sabia que às vezes, na primeira parcela, não viria mais o comprador, que se mudava, se escondia, morria. Num dia de sol intenso e poeira no caminho, bateu palmas em uma porta. A casa era pequena, tinha uma cerca preenchida de papoulas em flores vermelhas, dois vira-latas no quintal. Apareceu uma morena rebuculosa, de traços indígenas, pernas bem torneadas, estatura mediana. Seus lábios carnudos escondiam uma dentição perfeita que se mostrou após um sorriso. _ Bom dia, senhor! Em que posso ajudá-lo? Disse Inácia. _ Sou vendedor de maravilhosos produtos à prestação. A senhora tem interesse? Temos tudo que a senhora... senhorita, né? Precisar. _ Bem, querer, até queria. Mas, meu avô saiu e não tenho ordens para comprar nada sem o consentimento dele. Falou ela. _ Mas, não tem problema, não precisa ele saber, você compra e vai me pagando como puder. Disse o vendedor, ao que esta se animou, comprou uma toalha, uma blusa e uma calcinha e foi pagando como pôde. E quase nunca podia. Pois, seu avô, aposentado pelo INSS, já tinha feito vários empréstimos e o que ganhava de fato, mal dava para comer.

Os dias passaram-se e Biu prestanista, como também era chamado, criou sentimentos pela moça, ao que esta respondeu e sempre quando o avô não estava, o convidava para entrar e dar umas namoradas.

Os calotes aumentaram e o vendedor decidiu ir para cidade grande. Foi para São Paulo, carregando a jovem a tiracolo. Ela ficou encantada com as novidades, prédios, automóveis, lojas belíssimas. Foram morar na periferia. Biu logo arranjou um trabalho na construção civil. Mexendo concreto e carregando tijolos. Saía às cinco da manhã, voltava as nove em ponto. Serviço pesado, salário de fome, muitas vezes, dormia assim que chegava.

Inacinha fez amizades, procurou trabalho, descolou um bico de diarista. Quando começou a ganhar o seu próprio dinheirinho. Elevou sua auto estima. Ficou mais bonita, mais cobiçada. Matava Biu de ciúmes, mas quase não tinha tempo ou dinheiro para sair com ela que começou a passear só com as amigas. Iam a cinemas, shoppings, pagodes. Ela adorava um samba. Mesmo com raiva, ele evitava comentar, pois a mulher foi mostrando suas garras, ficava nervosa, chorava, ameaçava ir embora.

O horário dela voltar pra casa ia aumentando. Nove, dez, uma, duas, três, quatro e meia... Uma vez ela chegou pouco antes dele sair. Chegou sorridente, cantando em voz, alta, gargalhando. Biu ficou fulo da vida, pois os comentários já chegavam ao seu ouvido. Mas ele, calmo, esperava maior evidência. Fez de contas que estava dormindo, esperou ela tomar banho, quando ela dormiu, levantou para trabalhar. Olhou com ódio para a morena. Foi ao cesto de roupas sujas, procurou a que ela havia vestido. Suor, cheiros estranhos, cachaça. Para ele, tudo isto já era normal. _Desta vez ela extrapolou! Disse ele ao ver sua calcinha. Havia uma enorme mancha, não sabia o que era, seria secreção vaginal? Segurou a peça, tocou e segurou entre o polegar e o indicador, cheirou. Era esperma. Teve engulhos, vomitou, fechou os pulsos. Tomou coragem foi ao quarto, gritou, quebrou tudo, acordou ela e mandou que fosse embora. _ Desapareça daqui sua vagabunda!

O tempo passou e ele descobriu que ela havia ficado grávida. Há um ditado que diz: Filho de puta, tira a mãe da culpa. O garoto era parecidíssimo com ele. O que o fez registrar, dar pensão, presentes e visitá-lo uma vez por semana. Quando o garoto já tinha quatro anos, Biu recebeu uma proposta irrecusável de trabalho em outro estado. Inacinha ao saber disso, com a eminência da perda do contato, ficou mais dolente e enfeitada. Reconquistando-o novamente. Ele permitiu que ela e o garoto voltassem para casa dele. E foi para o estado vizinho do Rio de Janeiro fazer nova fortuna

Com uma semana Biu tentou manter contato com a sua família, não conseguiu. Lembrou do número de seu primo Malaquias que também tinha vindo do Nordeste. Mandou que ele fosse a casa para ver o que tinha acontecido. Ele foi ao local, voltou e esperou a ligação no orelhão mais próximo, de acordo com o combinado e respondeu em voz alta: _ Biu, não tem ninguém em casa, levaram tudo, até as portas...